01/11/2009
Marco Aurélio Mello - DoLaDoDeLá 31.10.09
Uma internauta chamada Natália me perguntou por que fui demitido. Acho que a resposta não é simples. Foi um processo. Cheguei de volta a São Paulo em 1998, depois de passar por outras duas emissoras da mesma rede, no interior. Até 2001 tínhamos liberdade e autonomia para trabalhar. É claro que o padrão e os formatos muitas vezes impediam certas extravagências, mas não havia a rígida doutrina que foi sendo imposta, depois de um tempo. Vale ressaltar também que, até 2001, as organizações eram aliadas do grupo que estava no poder, o que facilitava um bocado o nosso trabalho. A desvalorização do real pôs a Corte de joelhos. Parte do patrimônio das organizações teve que ser vendido para os parceiros, a enorme dívida teve que ser renegociada com os credores. Era uma situação pré-falimentar. Nesta ocasião foi como se o jornalismo tivesse recebido um 'Salve Geral'. Podíamos tudo. Até criticar o governo. Mas naquela altura não adiantava muito, porque era como chutar cachorro morto. Quando em 2001, um novo vassalo (o Guardião da Doutrina da Fé) assumiu o comando do conteúdo editorial do jornalismo, aí as coisas começaram a se complicar. Um novo modelo de gestão - com cortes de custos e centralização de decisões - começou a ser imposto e, claro, houve resistências. Quem se acostuma com liberdade tem dificuldade de ficar sem ela. Profissionalmente, sempre tentei ser ético e leal, mas nunca me omiti, principalmente diante do arbítrio e da manipulação. Quer o chefe gostasse, quer não, eu dizia o que pensava. Afinal, estava vendendo a minha força de trabalho, não os meus princípios. Mas o fato é que chefe não gosta de críticas. Salvo honrosas exceções, chefe gosta de aplauso e reverência. Desta forma, nossa convivência foi ficando cada vez mais difícil. Por outro lado, achava que tinha responsabilidades demais, para um salário de menos e fui à luta. Foram dezenas de tratativas e pedidos de aumento. Só que chefe também não gosta de funcionário que pede aumento. Galguei todos os postos importantes na hierarquia, mas meu salário foi ficando para trás. No auge da crise de convivência, tentaram me sufocar cortando a hora extra a que os editores do principal telejornal da emissora tinham, como uma espécie de bônus dos áureos tempos. Mas, ainda assim, não conseguiram. Em sinal de protesto, passei a exibir longos cabelos, ao lado de um silêncio obsequioso (sem assentimento interior). Estiquei a corda até o limite máximo, mas não tive forças e sucumbi - aqui vale uma ressalva, eu era o lado mais fraco... Ainda assim, acho que ninguém é protagonista da nossa história. Nós mesmos a escrevemos. E não me arrependo de cada linha das que escrevi, nos doze anos em que trabalhei lá. Espero ter respondido à pegunta, Natália.
Marco Aurélio Mello - DoLaDoDeLá 30.10.09
"Dá tempo de tirar meu nome deste abaixo-assinado", perguntei ao chefe de redação. - Claro, ninguém é obrigado a assiná-lo. Alguém mais lá quer tirar também? Perguntou-me, apontando para a redação. - Espera aí, respondi. E voltei à redação. - Ele está perguntando se alguém mais quer tirar o nome..., disse às minhas colegas editoras de texto (éramos seis, ao todo, no principal telejornal da emissora, mas uma delas não estava entre nós). As colegas também pediram que seus nomes fossem suprimidos. De fato, nossas assinaturas não fariam muita falta. Ele passou o dia circulando pela redação 'incentivando' os colegas a fazê-lo. Colegas nas redações do Balneário, do Planalto Central e de Belo Horizonte, também foram a campo. O plano, desmascarado depois, era salvar o Guardião, que foi lançado ao mar, depois de tantas trapalhadas na cobertura eleitoral. A estratégia funcionava assim: ele encostava ao lado da mesa do colega, soltava a folha de papel e dizia: - Vê se você concorda com isso e assina. O desconforto era geral. O clima era péssimo. Quando voltei da sala dele, certo de que nossos nomes haviam sido suprimidos, formamos uma roda quase no meio da redação. Rodrigo Vianna argumentava que quem tinha que defender a cobertura - que no texto do abaixo-assinado levianamente misturava a queda do avião e as eleições - era a emissora, não os funcionários. Rodrigo comparou: - É o mesmo que uma montadora fazer um carro com defeito e pedir para os metalúrgicos fazerem um abaixo-assinado para defender a indústria. Havia, entre nós, outras duas editoras dos dois telejornais matinais (o local e o etílico). Também havia dois produtores, que acompanhavam tudo fingindo-se estar ao telefone, marcando alguma entrevista. E tínhamos entre nós mais dois repórteres, além do Rodrigo. Estou poupando os nomes porque alguns permaneceram lá e não seria justo expô-los a constrangimento. Bom, no meio do debate sobre queda de avião, cobertura das eleições e a postura das organizações, o chefe de redação, desconfortável com aquela situação, deixou sua sala e dirigindo-se a nós, disse: - E tem mais, quem não tiver satisfeito que vá para Record. Naquele momento, 2006, a emissora concorrente já era uma ameaça. Não demorou muito para que eles dessem início à Inquisição. (volto ao tema)
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PITACO DO ContrapontoPIG
Numa série de posts, com a necessária cautela, Marco Aurélio Mello do Blog DoLaDoDeLá mostra as entranhas da "poderosa" Rede. Veja o Contrapontos 559 e o 578 do Blog ContrapontoPIG . Acompanhe o Blog DoLaDoDeLá
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