sábado, 8 de outubro de 2011

Contraponto 6447 - "Wallerstein: Americanos cansados da guerra?"

.
08/10/2011

Wallerstein: Americanos cansados da guerra?

Do Viomundo - 7 de outubro de 2011 às 21:46

Cansaço da guerra nos Estados Unidos?

As mais recentes sondagens nos Estados Unidos mostram oposição à permanência no Afeganistão. Os analistas estão a falar de “cansaço da guerra”, já que é difícil afirmar que os EUA tenham sido vitoriosos nalgum dos três conflitos em que está envolvido.

por Immanuel Wallerstein, no Esquerda.Net

Os Estados Unidos estão actualmente envolvidos em três guerras no Médio Oriente – no Afeganistão, no Iraque, e agora na Líbia. Washington tem bases por todo o mundo, em mais de 150 países. Tem actualmente relações tensas com a Coreia Norte e com o Irão, e nunca excluiu uma acção militar. A guerra no Afeganistão, quando começou, em 2002, tinha um apoio muito forte da opinião pública dos EUA e também um grande apoio noutros países. Quando começou, em 2003, a guerra do Iraque teve quase o mesmo apoio da opinião pública dos Estados Unidos, mas muito menos noutros países. Agora, na Líbia, os Estados Unidos estão a meio caminho. Menos de metade do público dos EUA apoia a intervenção, e há muito mais oposição no resto do mundo.

As mais recentes sondagens nos Estados Unidos mostram oposição não só à operação líbia mas também à permanência no Afeganistão. Os analistas estão a falar de “cansaço da guerra”, já que é difícil afirmar que os Estados Unidos tenham sido vitoriosos nalgum desses conflitos. O conflito líbio está a caminho de um longo pântano. No Afeganistão, todo o mundo está a tentar imaginar uma solução política, que teria de envolver a entrada dos Taliban no governo e, talvez mesmo a curto prazo, assumindo a totalidade do poder. No Iraque, os Estados Unidos têm prevista a retirada das suas tropas no dia 31 de Dezembro. Ofereceram-se para deixar mais tempo 20 mil soldados, desde que o governo iraquiano o solicite, e o faça muito em breve. O primeiro-ministro iraquiano Nouri al-Maliki poderia ser tentado a aceitar, mas os sadristas disseram-lhe que, se o fizer, vão retirar-lhe o apoio e o seu governo cairá.

O mais interessante, contudo, é o que provavelmente vai acontecer no próximo ano na política interna de Estados Unidos, à medida que se aproximar a eleição presidencial. Desde 1945, o Partido Republicano sempre se apresentou na campanha como o partido que apoia fortemente os militares e acusou o Partido Democrático de ser fraco. Os democratas sempre reagiam procurando provar que não foram fracos e que na prática não houve grande diferença na política real que foi posta em prática, qualquer que fosse o partido a ocupar a Presidência. De facto, as maiores guerras – a da Coreia e a do Vietname – foram ambas começadas sob presidentes democratas. O Partido Democrata sempre teve um grupo, considerado a sua ala esquerda, crítico em relação a estas guerras, e este grupo continua a existir e a protestar. Mas, entre os políticos eleitos, esses democratas sempre foram uma minoria, que era praticamente ignorada.

O Partido Republicano era mais unido em torno de um programa de constante apoio aos militares e às guerras. Raros foram os políticos republicanos que mostraram uma visão diferente. A origem destes últimos é a ala libertária do partido, e a pessoa mais importante a defender estas opiniões foi o senador Ron Paul do Texas. Ele foi também um dos poucos políticos que disseram que o apoio ilimitado dos Estados Unidos a Israel é uma má ideia.

Eis onde estamos, neste momento, no que diz respeito à corrida à presidência. Barack Obama será o candidato democrata. Ninguém o desafia dentro do partido. O cenário republicano é bem diferente. Há dez a doze candidatos à nomeação, e não há um favorito claro. A corrida está bastante aberta.

O que isto significa para a política externa? Ron Paul está a tentar conseguir a nomeação. Em 2008, ele não tinha quase nenhum apoio. Agora, a campanha está a correr melhor. Em parte por causa das suas posições fortes quanto à política fiscal, mas as suas opiniões quanto à guerra estão a atrair a atenção. Além do mais, um novo candidato entrou na arena. Trata-se de Gary Johnson, o antigo governador republicano do Novo México. Também libertário, ele é mais forte ainda nas questões da guerra do que Paul. Johnson pede a retirada total e imediata do Afeganistão, do Iraque e da Líbia.

Considerando que o apoio aos vários candidatos potenciais está muito espalhado, haverá indubitavelmente programas de televisão de debate entre os candidatos republicanos. Se Johnson fizer da questão da guerra a sua grande bandeira de campanha, vai garantir que todos os candidatos republicanos terão de se dirigir a ele.

Uma vez que isto aconteça, vamos descobrir que os chamados republicanos do Tea Party estão profundamente divididos em relação ao envolvimento na guerra. Subitamente, todos os Estados Unidos estarão a discutir esta questão. Barack Obama descobrirá que a posição centrista que procurou manter se deslocou subitamente para a esquerda. Para permanecer centrista, ele também terá de ir à esquerda.

Chegaremos a um marco decisivo da política dos Estados Unidos. A ideia de que as tropas devem voltar para casa vai aparecer como uma séria possibilidade. Alguns espumarão de raiva porque os Estados Unidos estarão assim a demonstrar fraqueza. E de certa forma é verdade. É parte do declínio dos Estados Unidos. Os políticos dos Estados Unidos terão de recordar que para travar guerras é preciso um grande apoio da opinião pública. E nesta combinação de pressões geopolíticas e económicas que todos sofrem, o cansaço da guerra é um factor muito importante de hoje em diante.

Tradução, revista pelo autor, de Luis Leiria para o Esquerda.net

.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Veja aqui o que não aparece no PIG - Partido da Imprensa Golpista