segunda-feira, 30 de março de 2015

Contraponto 16.392 - " E agora, Sérgio Moro?"



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30/03/2015

E agora, Sérgio Moro? 



Paulo Moreira Leite - 30/03/2015

sergio moro13





Segundo pesquisa, PSDB recebeu 42% das doações das grandes empreiteiras da Lava Jato aos partidos

A descoberta de que o conjunto das empreiteiras investigadas na Lava Jato responde por 40% das doações eleitorais aos principais partidos políticos do país – PT, PMDB, PSDB – entre 2007 e 2013 é uma dessas novidades imensas à espera de providências a altura.

Permite uma nova visão sobre as denúncias envolvendo a Petrobrás, confirma uma distorção absurda nas investigações e exige uma reorientação no trabalho da Justiça e do Ministério Público.

É o caso de perguntar: e agora, Sérgio Moro? O que vamos fazer, Teori Zavaski?

Explico.

Conforme o Estado de S. Paulo, entre 2007 e 2013 as 21 maiores empresas da Lava Jato repassaram R$ 571 milhões a petistas, tucanos, peemedebistas. Desse total, 77% saíram dos cofres das cinco maiores, que estão no centro das investigações: Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Grupo Odebrecht e OAS.

Segundo o levantamento, o Partido dos Trabalhadores ficou com a maior parte, o que não é surpresa.

As doações ocorreram depois da reeleição de Lula. Cobrem aquele período do calendário político no qual Dilma Rousseff conquistou o primeiro mandato e Fernando Haddad venceu as eleições municipais de São Paulo. Mas o PSDB não ficou muito atrás. Embolsou 42% do total. Repetindo para não haver dúvidas: conforme análise do Estado Dados, de cada 100 reais enviados aos partidos, 42 chegaram aos cofres tucanos.

Gozado, não?

Agora dê uma olhada na relação de beneficiários denunciados na Lava Jato e pergunte pelos tucanos.

O personagem mais ilustre, senador Sérgio Guerra, já morreu. É acusado de ter embolsado dinheiro para inviabilizar uma CPI. Infelizmente, não está aqui para defender-se – o que permite imaginar até onde pode chegar a largura de suas costas.

O outro implicado é o senador Antônio Anastasia, aliado número 1 de Aécio Neves, forte candidato a um carimbo de “falta de provas” amigo nas próximas etapas do percurso.

Como chegaremos aos 42%? Alguém vai investigar, vai explicar? Ninguém sabe. Nem uma pista.
Onde estão as delações premiadas, as prisões preventivas?

Apoiado na delação premiada de Paulo Roberto Costa, que chegou à diretoria da Petrobras com proteção do lendário Severino Cavalcanti, do PP pernambucano, a investigação concentrou-se no condomínio Dilma-Lula e legendas aliadas. Esbarrou no PSDB, de vez em quando, quase sem querer, por acaso. E só.

A descoberta da fatia de 42% do PSDB na Lava Jato pode ser mais útil do que se imagina.
Deixando de lado, por um momento, a demagogia moralista que tenta convencer o país que todo político é ladrão cabe reconhecer um aspecto real e relevante.

Estamos falando de um sistema no qual todos os partidos se envolvem na busca de recursos financeiros para tocar as campanhas. Todos. São as mesmas empresas, com os mesmos clientes, com os mesmos doadores que se ligam às mesmas fontes.

Isso quer dizer o seguinte: ou todos são tratados da mesma forma, conforme regra elementar da Justiça, ou teremos, na Lava Jato de 2015, o mesmo tratamento preferencial dispensado aos tucanos do mensalão PSDB-MG. Não dá para dizer que um recebe “propina” e o outro ” verba de campanha,” certo?

Acho errado por princípio criminalizar as campanhas financeiras dos partidos políticos. Por mais graves que sejam suas distorções – e nós sabemos que podem ser imensas – elas envolvem recursos indispensáveis ao funcionamento do regime democrático. Mesmo a Nova República, que substituiu o regime militar, nasceu com auxílio de um caixa clandestino formado pelos maiores empresários e banqueiros do país, na época. Não conheço ninguém que, mesmo informado dessa situação, sentisse nostalgia da suposta — sim, suposta e apenas suposta — moralidade do regime dos generais.

Se queremos uma democracia emancipada do poder econômico, precisamos de novas regras – como financiamento público, como proibição de contribuições de empresas – para isso. E temos de ter regras transitórias para caminhar nessa direção, que não joguem fora a criança junto com a água do banho, certo?

Mas não é isso o que tem ocorrido. Pelo contrário. A tradição é criminalizar os indesejáveis, submetidos a penas rigorosas, e poupar amigos e aliados, através de uma prática conhecida.

Comparece-se a AP 470 com o mensalão PSDB-MG.Julgados pelo mesmo crime que conduziu importantes dirigentes do Partido dos Trabalhadores a prisão, os acusados da versão tucana sequer foram julgados – até hoje. Muitos já tiveram a pena prescrita. Não faltam acusados que dormem o sono dos justos com a certeza de que jamais correrão o risco de qualquer condenação. Os acusados tucanos que forem condenados – se é que isso vai acontecer um dia — terão direito a um julgamento com segundo grau de jurisdição, que foi negado aos principais réus do PT. A última notícia do caso é que a juíza que presidiu o julgamento em primeira instancia aposentou-se antes de terminar o serviço e ninguém foi nomeado para seu lugar. Se esse filme parece velho, lembre das denúncias que envolvem as obras do metrô paulista.

Muito instrutivo, não?

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Contraponto 16.391 - "Empresária que tirou roupa em protesto é analfabeta política"


30/03/2015


Empresária que tirou roupa em protesto é analfabeta política


Diário do Centro do Mundo - Postado em 30 de março de 2015 às 9:18 am

Do ig:

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No meio de milhares de pessoas, ao menos seis carros de som e diversos gritos de protesto contra o governo da presidente Dilma Rousseff (PT), no último dia 15, na Avenida Paulista, região central de São Paulo, a empresária baiana Juliana Isen, de 36 anos, encontrou outra maneira de chamar a atenção de todos os que estavam ao seu redor.

Juliana colocou dois adesivos nos mamilos e tirou a camiseta diante de dezenas de policiais, que olharam impassíveis. Aos gritos de “Fora Dilma, Fora PT, quero um País melhor, sem corrupção”, ela caminhou seminua pela mais icônica avenida da principal cidade do País, posou para fotógrafos e curiosos e ainda hoje, duas semanas após a manifestação, fatura com a atitude incomum.

A empresária diz que ficar seminua na Avenida Paulista foi uma decisão totalmente passional, impulsiva, nada programada. Quando pequena, Juliana conta que era tímida. Mas não foi o que se viu no protesto da empresária. “Me deu aquela coisa… vi os policiais, coloquei os adesivos [nos mamilos] e tirei [a blusa]. Quando olhei ao redor, vi um monte de fotógrafos, um monte de gente e pensei: ‘é agora que vou mandar meu recado’. Gritei que queria liberdade, um país melhor, fora PT, fora Dilma, fora Lula. Chega, já deu'”.

Ela garante que não premeditou a nudez em busca de fama. “Fui movida pelo calor da emoção. Não achei que ia causar polêmica. Minha aureola estava totalmente coberta pelo adesivo. Tirei a blusa, comecei e papapá. Nem imaginei aquele monte de fotógrafos. Fui verdadeira, espontânea. E faria de novo”, conta.

Debaixo de uma leve garoa e no meio da empolgação, os adesivos de Juliana descolaram e por alguns minutos ela ficou sem a proteção nos seios. O jeito foi usar novos adesivos. Além dos novos seguidores nas redes sociais, de programa de TV e ensaio nu, Juliana teve de administrar a avó, por quem foi criada, que ficou dois dias de cama.

A empresária, que é sócia do ex-marido em uma revenda de suplementos para atletas, virou neocelebridade e conquistou o posto de musa dos atos antigoverno. E nas últimas duas semanas, diz ter visto sua vida mudar, com direito a pedidos de casamento pelo Facebook, cantadas de homens e mulheres e até convite (já aceito) para posar nua para uma revista masculina. No dia seguinte ao protesto, foi preciso contratar um assessor de imprensa e um empresário – Cacau Oliver, o mesmo da ex-vice-miss bumbum, Andressa Urach. Agora o sonho é ser apresentadora de TV.

O ensaio da revista “Sexy” ainda é tratado com certo mistério. Juliana dá a entender que parte dele pode ser feito na próxima manifestação, marcada para 12 de abril. “Vai chocar a sociedade. Vai ser bafão. Minha revista vai chocar politicamente falando”, diz. A primeirão sessão de fotos foi feita na sexta-feira (27), mas a publicação deve chegar às bancas em maio ou junho.

Em entrevista ao iG, a empresária, que rechaça o título de socialite e se define como de direita por ser “contra o PT”, diz que aquela foi a segunda manifestação da qual participou. A primeira foi em junho de 2013, quando se juntou a outras milhares de pessoas também na avenida Paulista para pedir a revogação do aumento de R$ 0,20 nas tarifas de ônibus, metrô e trem de São Paulo.
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PITACO DO ContrapontoPIG
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A moça estava só pedindo a dita dura...
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Contraponto 16.390 - "A agonia de mídias como tevê, jornal e revista nas sociedades mais avançadas"


30/03/2015


A agonia de mídias como tevê, jornal e revista nas sociedades mais avançadas

O lendário luminoso de Picadilly Circus, Londres



Paulo NogueiraOs fâmulos das grandes empresas jornalísticas – Merval e Reinaldo Azevedo à frente — continuam em sua patética campanha para levar todo o dinheiro da publicidade do governo para seus patrões.

Eles fazem à luz do dia o que os donos da mídia fazem na privacidade dos gabinetes de Brasília.

É uma luta insana pela manutenção de mamatas e privilégios de anos, décadas. E pelo atraso também. O que os fâmulos querem é que o dinheiro público seja torrado em mídias em acelerado processo de declínio.

Vejamos o caso pelo lado técnico.

O Guardian deu, neste final de semana, um levantamento esclarecedor sobre a publicidade no Reino Unido.

Metade de todo o investimento publicitário dos anunciantes britânicos, em 2015, será na internet.
Uma em cada duas libras de um total de 16 bilhões vai terminar na mídia digital, portanto.

Todas as demais mídias – tevê aberta e fechada, jornais, revistas, rádio – terão que dividir a outra metade.

Outros países seguem na mesma direção. Na Noruega, a fatia da internet no bolo publicitário já é de 45%. Vamos para mercados emergentes, como o Brasil. Na China, a internet  já responde por 43,6% de toda a publicidade em 2015.

Observe a tabela abaixo.

Digital ad spend percentage share of total advertising spend, by country, 2015.
1. UK 50%
2. Norway 45%
3. China 43.6%
4. Australia 43.3%
5. Denmark 43.1%
6. Netherlands 35.4%
7. Canada 34.3%
8. US 31.3%
9. Sweden 30.5%
10. South Korea 28.4%


E o Brasil nesta história?

Estamos consideravelmente atrasados. Não somos uma sociedade assim tão desenvolvida, é verdade.
Mas o principal fator de retardamento é a ação predadora das grandes empresas jornalísticas.
Elas sempre tiveram enorme influência junto aos anunciantes. A Globo, com sua propina legalizada, o infame BV, é um caso à parte.

Funciona assim. A Globo adianta para as agências a verba que elas planejam gastar no ano.
Muitas agências dependem desse adiantamento. E então elas se vêem compelidas a colocar dinheiro na Globo.

Isso ajuda a entender por que, com audiências em queda constante nos últimos anos, a receita publicitária da Globo, paradoxalmente, cresce a cada ano.

Até quando os anunciantes vão aceitar a parte ruim que lhes cabe num enredo em que apenas a Globo e as agências se dão bem?

Não eternamente, com certeza. Sobretudo quando a internet é uma mídia que cresce explosivamente entre os consumidores.

O pedaço da internet na publicidade nacional é ainda pequeno, embora crescente. Deve ser algo entre 12% e 15% em 2015, um terço do que acontece na esperta China.
Nas estatais, este índice é ainda pior. Algumas das maiores delas não colocam sequer 5% de seus investimentos publicitários nos meios digitais.
É, evidentemente, um problema que tem que ser resolvido. O mundo se digitalizou, e a Secom, até aqui, não.
Gerencialmente, não faz sentido.
Basta olhar para as melhores práticas no mundo. Ou mesmo observar o comportamento do público no Brasil. A internet é disruptora – vai liquidando todas as mídia, incluída aí aquela que pareceu inexpugnável: a tevê.
Até Silvio Santos disse que vê Netflix, e não tevê convencional.
As estatais — e não só elas, de resto — têm que se encontrar, em sua publicidade, com o presente e com o futuro.
Os fâmulos das grandes e decadentes empresas de mídia querem a Secom fixada num passado da qual elas foram absurdamente beneficiárias. Combatem o mau combate. Defendem a fortuna de seus patrões e seus próprios empregos.
Seus argumentos são indecentes — e por isso esses gerentes gerais do atraso não haverão de vencer.
(Acompanhe as publicações do DCM no Facebook. Curta aqui).
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Contraponto 16.389 - " Dalmo Dallari ao Blog da Cidadania: '15 de março não passou de uma ondinha' "

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30/03/2015

Dalmo Dallari ao Blog da Cidadania: “15 de março não passou de uma ondinha”


Dallari


Eduardo Guimarães

Dando sequência à série de entrevistas que o Blog da Cidadania está fazendo com pensadores de alta relevância sobre o momento político preocupante por que passa o país, brindo os leitores desta página com a visão do eminente jurista Dalmo de Abreu Dallari, de quem a caudalosa obra é obrigatoriamente estudada em qualquer curso de Direito.

O professor Dallari se encontra em Paris, neste momento, mas não se furtou a analisar para o Blog temas como o protesto anti Dilma de 15 de março, os atentados a bomba ao PT, a proposta de impeachment de Dilma Rousseff, o comportamento do STF, o comportamento da grande imprensa, o comportamento do Ministério Público e muito mais.

Quero agradecer ao professor Dallari pela gentileza de, apesar de estar em Paris, ter respondido com tanta minúcia às questões que esta página formulou. Este blogueiro e seus leitores sentem-se honrados com a deferência de tão importante pensador brasileiro.

Confira, abaixo, a entrevista

Blog da Cidadania – Desde a campanha eleitoral do ano passado a imprensa alternativa e a tradicional citaram vários casos de pessoas que foram agredidas na rua por usarem roupas da cor vermelha, mesmo quando essas roupas (em geral, camisetas) não tinham relação com partidos políticos, sindicatos ou movimentos sociais. Como o senhor enxerga esse fenômeno? Quem protege essas pessoas agredidas? Como garantir o direito de manifestação política, e que punições podem ser aplicadas a quem agride física ou verbalmente quem faz – ou parece fazer – manifestação política silenciosa como é o uso de uma cor que lembre um grupo político ou uma ideologia?

Dalmo Dallari – A agressão praticada contra uma pessoa que participava de manifestação pacífica é crime contra a pessoa, previsto no Código Penal, no artigo 129. O fato de ter sido praticada a agressão durante manifestação politica não é agravante nem atenuante. Assim, também, a alegação de que o agredido usava camisa de uma cor determinada, que o agressor interpretou como expressão de uma opção política, não tem qualquer relevância. O que cabe é identificar o agressor e apresentar queixa na Delegacia de Policia da região, ou, então, apresentar queixa dando elementos que permitam à Polícia identificá-lo. Em circunstâncias como essa o agredido deve, imediatamente, pedir providências ao policial mais próximo, o que facilita a identificação do criminoso.

Blog da Cidadania – No último dia 15 de março, uma maré humana tomou a avenida Paulista e outras capitais brasileiras pedindo impeachment da presidente Dilma Rousseff. Tanto desta vez quanto nas anteriores que essas manifestações ocorreram, parcela expressiva dos manifestantes pregou golpe militar para atingir esse fim. As esperáveis manifestações de repúdio à ruptura institucional não apareceram na grande imprensa e a pregação explícita de violação da vontade das urnas não gerou nenhuma consequência para os pregadores. Existe algum mecanismo para punir esse tipo de pregação? A existência dessa pregação ameaça a democracia?

Dalmo Dallari – Antes de tudo, é importante assinalar que, confrontada com a votação que,
recentemente, deu o segundo mandato à Presidente Dilma, votação superior a 54 milhões de votos, a « maré humana » da passeata de 15 de março não passou de uma « ondinha » muito leve, espetaculosa mas insignificante como expressão da vontade politica do povo brasileiro. Alguns cartazes e algumas faixas exibidos na ocasião deixam dúvida, apenas, quanto ao que realmente expressavam : ignorância, burrice ou vocação totalitária muito primária. Sobre os efeitos de um golpe militar a experiência recente do Brasil é muito expressiva. O que se viu e o que se sabe é que o golpe prejudicou seriamente a normalidade constitucional e foi instrumento de violências e de muitas praticas de corrupção. Quanto à pregação de golpe militar, que  configura proposta de subversão da ordem constitucional, é crime previsto na Lei de Segurança Nacional, que, embora feita durante a ditadura, não foi revogada e o próprio Supremo Tribunal Federal já a considerou recepcionada pela nova ordem jurídica, naquilo em que não contraria as normas constitucionais. O que deve ser feito é o enquadramento dos autores dessa tolice antidemocrática, para processamento pela prática do crime. Nesse caso a identificação dos autores não deve ser dificil, pois muita gente filmou e fotografou a prática criminosa.

Blog da Cidadania – No dia 15 de março, a sede do PT na cidade de Jundiaí (SP) sofreu um atentado a bomba. Na mesma cidade, dois bonecos de pano, representando a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, foram “enforcados” em um viaduto. No Dia 26 de março, novo atentado a bomba contra o partido, agora em São Paulo, na sede do diretório paulistano. Nesse cenário, como o senhor vê a saúde da democracia brasileira e que nível de ameaça ela pode estar sofrendo?

Dalmo Dallari – A prática de atentados contra instalações e símbolos políticos é crime, previsto na Lei de Segurança Nacional, que continua em vigor naquilo em que não contraria disposição da Constituição vigente. Essas práticas violentas são reveladoras de um lamentável primarismo político e de falta de preparo para a convivência civilizada, mas estão muito longe de representarem ameaça à ordem constitucional.

Blog da Cidadania – Muito tem-se falado sobre impeachment da presidente Dilma Rousseff. À luz das denúncias contra seu governo e do que se sabe sobre a conduta dela, o senhor considera que há elementos para se falar em derrubá-la? Se esse processo for levado à frente sob a argumentação de que o julgamento via Congresso é “político” e, portanto, “dispensa provas”, o senhor considera que esse caminho é constitucional? Se não for, que instrumentos existem para barrar uma iniciativa que, nessa situação, configurar-se-ia como golpista?

Dalmo Dallari – A proposta de impeachment de Dilma não passou de reação primária de derrotados, inconformados com a derrota. Como já tem sido amplamente demonstrado, nos termos expressos e claros da Constituição, em seu artigo 89, o impeachment só pode ser cogitado se o Presidente da República praticar ato que atente contra a Constituição. Deve existir um ato do Presidente enquanto Presidente. Assim, alegar corrupção na Petrobrás para justificar o impeachment é pura tolice e o que se pode afirmar, sem sombra de dúvida, que a conversa do impeachment não passou de fantasia política de inconformados, sem a mínima consistência jurídica.

Blog da Cidadania – O que o senhor considera que ocorreria com a democracia brasileira caso um governo recém-ungido pelas urnas fosse derrubado por fórmulas como a do “julgamento político que dispensa provas”? Poder-se-ia dizer que o Brasil estaria vivendo uma ruptura institucional e estaria sob um regime ilegítimo? O senhor considera que esse “julgamento político” seria um golpe de Estado? O senhor acha possível que esse “julgamento político” ocorra?

Dalmo Dallari – A experiência brasileira é muito eloquente: um golpe de Estado, destituindo um governo legitimamente eleito, por vias democráticas, seria uma agressão a todo o povo brasileiro, prejudicando direitos fundamentais de todo o povo e de cada cidadão. Mas a verdade sobre o que foi a ditadura está cada vez mais clara e por isso é pouquíssimo provável que ocorra uma tentativa de golpe. Entre outras coisas, o golpe de 1964 foi o resultado de uma aliança de militares fascistas com empresários gananciosos e primários, mas a prática demonstrou que também os mais ricos perdem com a ditadura.

Blog da Cidadania – O Supremo Tribunal Federal deu tratamentos opostos aos ditos mensalões tucano e petista. No caso envolvendo o PSDB, houve desmembramento da ação, com o STF enviando para a primeira instância o caso do ex-senador Eduardo Azeredo, apesar de ele ter renunciado com o fim de não ser julgado naquela instância; no caso do PT, José Dirceu, entre outros, foi julgado pelo STF mesmo sem foro privilegiado. Esse fato é compatível com o regime democrático?

Dalmo Dallari – Foi lamentável a decisão equivocada, claramente equivocada, do Supremo Tribunal Federal, de julgar acusados que não gozavam do foro privilegiado. Ele julgou sem ter competência jurídica para tanto. Esse equívoco, afrontando disposições constitucionais expressas, foi contrário ao regime democrático e foi um mau momento do Supremo Tribunal Federal, que tem por função precípua a guarda da Constituição. Continuo confiando no Supremo Tribunal Federal e esperando que ele dê exemplo do respeito à Constituição e acredito que hoje não se repetiria o equívoco.

Blog da Cidadania – Como o senhor avalia o comportamento da imprensa brasileira no âmbito da crise política?

Dalmo Dallari – É lamentável reconhecer isso, mas a grande imprensa brasileira, em relação a vários temas, deixa perceber que tem orientação influenciada por um direcionamento político. Assim, é mais do que evidente que existe verdadeira obsessão contra o Lula, o petismo e qualquer pessoa ou atividade que possa parecer ligada a isso, por simples coincidência de algumas posições. Mas é positivo o fato de que a imprensa, embora tendo dado mais espaço do que o razoável à fantasia do impeachment, não prega nem apoia um golpe de Estado e dá certa contribuição, podendo dar muito mais, ao aperfeiçoamento do regime democrático.

Blog da Cidadania – Como o senhor avalia o comportamento do Ministério Público no âmbito da crise política?

Dalmo Dallari – O Ministério Público foi extraordinariamente valorizado pela Constituição de 1988 e, essencialmente, tem estado à altura de suas responsabilidades, desempenhando com independência e firmeza suas atribuições, que muitas vezes envolvem o enfrentamento com personalidades que ocupam posições de prestigio na vida pública. Algumas vezes tem havido excesso de rigor e desbordamento das limitações constitucionais, havendo algumas situações excepcionais de omissão na proteção de direitos que lhe cumpre tutelar, mas o Ministério Público tem dado contribuição muito relevante para a busca de efetividade dos direitos consagrados na Constituição.

Blog da Cidadania – Como o senhor avalia o comportamento da Polícia Federal no âmbito da crise política?

Dalmo Dallari – A extrema diversidade de situações em que teve que agir ou resguardar direitos torna difícil uma avaliação genérica da Polícia Federal. Mas, numa síntese, ela tem cumprido bem seu papel constitucional e é merecedora do apoio e da confiança do povo brasileiro.

Blog da Cidadania – Como o senhor avalia o comportamento do STF no âmbito da crise política?

Dalmo Dallari – Numa avaliação do conjunto de seu desempenho, o Supremo Tribunal Federal tem atuado com independência, firmeza e competência, sendo hoje um dos verdadeiros pilares de sustentação da ordem jurídica democrática consagrada na Constituição de 1988. Ele pode e deve ser aperfeiçoado, para que, entre outras coisas, possa desempenhar com eficiência e rapidez suas importantes atribuições. Para tanto, venho sustentando a conveniência de que o Supremo Tribunal seja convertido em Tribunal Constitucional e se concentre em seu papel extremamente relevante de guarda da Constituição, deixando aos demais Tribunais superiores as decisões que hoje sobrecarregam a Corte Suprema.

Blog da Cidadania – Professor Dallari, a partir dessas respostas gostaria de aprofundar algumas delas em uma segunda entrevista, se possível presencial. Quando seria possível?

Dalmo Dallari – Eduardo, na próxima semana já estarei de volta a São Paulo e poderemos manter contato.

Blog da Cidadania – Professor Dallari, agradeço imensamente a atenção. Ligo para o senhor na semana assim que estiver no Brasil.
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Contraponto 16.388 - " Advogados criticam Plano Moro: 'inconstitucional' "

Contraponto 16.387 - "Como dar um basta no jornalismo da Globo?"

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30/03/2015


Como dar um basta no jornalismo da Globo?



A Rede Globo perdeu qualquer tipo de responsabilidade jornalística na difusão de seu conteúdo. A emissora é hoje o império da liberdade sem limites. É possível dar um basta em tanta desonestidade?


rede globo manipula jornalismo


J. Carlos de Assis*

Não me proponho contribuir para a quebra da Globo. Seria um desperdício de tecnologia em audiovisual acumulada durante décadas, a qual se tornou um patrimônio nacional de valor incalculável. Quando o senador Crivella agendou uma conversa com João Roberto Marinho na última campanha eleitoral, sugeri a ele que deveria dizer que, se eleito, se comprometeria a lutar pela consolidação do Rio como capital audiovisual da América Latina e um dos principais centros de produção de arte audiovisual do mundo. O líder seria a Globo, naturalmente, não a Record, cuja base audiovisual é São Paulo.

Acontece que os programas de boa qualidade formal da Globo, como as novelas, casos especiais, Globo Repórter, Fátima Bernardes, The Voice (não sei por que não “A Voz”) e SuperStar funcionam como uma espécie de rede física de esgoto pelo qual flui o material de má qualidade, a saber, o Jornal Nacional e, principalmente, o Jornal da Globo. Vai também junto desse lixo esse monumento à imbecilidade globalizada, o BBB Brasil, que disputa com Faustão o campeonato da idiotice, salvo apenas, no caso de Faustão, pela Dança dos Famosos, para os que tem estômago para tolerar as piadas de mau gosto do apresentador.

O lamentável é que os outros canais, como Record, Bandeirantes e SBT, não se aproveitam das falhas estruturais da Globo para lhe ocuparem o espaço jornalístico. Na Band o jornalismo é tão pobre que as notícias dos principais Estados são veiculadas por rádio, sem acompanhamento de imagem. A Record tem a sorte de ter em seus quadros um dos maiores jornalistas do Brasil, Paulo Henrique Amorim, mas também nela falta infraestrutura para o noticiário em geral. Com isso, a Globo nada de braçadas, fixando o padrão de mediocridade que move a maior parte do jornalismo de televisão.
Como colunista do Globo, privei durante quase um ano da intimidade de Roberto Marinho, o que me possibilitou conhecer bem algumas de suas facetas. Era um homem simples, sem ideologia, voltado quase exclusivamente para o jornal, não a tevê. É que, de jornal, ele acreditava entender bem – entrou na tipografia e acabou dono -, enquanto a televisão não lhe era familiar, e deixava entregue a José Bonifácio, o Boni, e Walter Clark. Boni e Clark puderam dar uma direção profissional à televisão, sem interferência do dono, enquanto o jornal era estritamente vigiado por ele.

Talvez viesse daí a mediocridade do Globo quando comparado com o Jornal do Brasil, por exemplo. Entretanto, mesmo que não fosse um luminar do jornalismo, Roberto Marinho tinha o espírito da notícia. Lamentou várias vezes não ter podido dar o furo do Plano Cruzado porque Sarney lhe pedira reserva. (O curioso nesse episódio é que Sarney não se deu conta de que estava passando informação privilegiada para o maior grupo de comunicação do país num momento crucial da vida econômica brasileira. Na verdade, Sarney temia tanto o grupo Globo que não pensou duas vezes antes de lhe entregar uma ficha valiosa que não foi usada.)

O espírito jornalístico de Roberto Marinho não foi transmitido à prole. No caso da televisão, foi totalmente desvirtuado. Como jornal perdeu espaço no mundo da comunicação, a penetração da tevê tornou-se uma arma mortal de difusão ideológica. No Jornal Nacional ela vinha sendo usada com alguma moderação porque os editores, William Bonner à frente, calculavam que os telespectadores são sobretudo de classe média baixa. A partir da última eleição, contudo, com o sistema Globo assumindo papel de militante pró-Aécio, a manipulação ideológica também do noticiário televisivo no horário nobre tornou-se aberta.

Como já escrevi anteriormente, o sistema de três feudos e várias satrapias jornalísticas do Globo não tem hoje nenhum controle político. É o campo da liberdade sem limites dos âncoras e apresentadores, no qual atua a lei da selva. Um ensaio iluminado de Norberto Bobbio ensina que os luminares do alvorecer da Idade Moderna não esclareceram bem o que entendiam por liberdade. Alguns, como Locke e Montesquieu, viam a liberdade como o não limite; outros, como Rousseau e Hobbes, como prerrogativa de estabelecer os próprios limites. Os primeiros inspiraram o liberalismo econômico. Os segundos, a democracia.

A tevê Globo é hoje o império da liberdade sem limites, do liberalismo econômico que gerou nas quatro últimas décadas o neoliberalismo. Antes, por contraditório que possa parecer, Roberto Marinho lhe dava um caráter democrático. Um dia, na minha época no Globo, entrei na sala dele e lhe expus o que sabia dos rumores de corrupção do Governo Collor. “O que acha que eu devo fazer?”, perguntou ele a mim, que tinha pouco mais de metade de sua idade. “Ponha na televisão”, sugeri. Ele ficou em silêncio alguns segundos para comentar, encerrando a conversa: “É muita responsabilidade…”

É essa responsabilidade que a Globo perdeu sob a influência nefasta do grupo Veja. Destruidora do Governo Collor, sem provas – a entrevista que publicou com o irmão de Collor foi um monumento à irresponsabilidade jornalística -, Veja começou a articular suas “revelações” de escândalos, oriundas de espionagem paga, com o noticiário do Jornal Nacional e o Jornal da Globo. Duplamente irresponsáveis, esses dois sistemas de empulhação jornalística estão destruindo o Brasil com intrigas, e contribuindo para a degradação de todas as instituições brasileiras, Executivo, Legislativo e Judiciário. Chegou o momento do basta.

Para destruir Veja, o que se justifica como profilaxia da imprensa brasileira, é muito fácil: basta parar de comprá-la e cancelar as assinaturas. Caso sinta necessidade de revista, compre a Carta Capital como alternativa, com uma linha mais imparcial.

No caso da tevê também é fácil. Como queremos preservar as novelas e punir o jornalismo-lixo, vamos fazer o seguinte: no horário do Jornal Nacional e do Jornal da Globo – depois da novela, num caso, e do BBB, do outro -, vamos desligar a televisão ou mudar de canal. Todos os anunciantes da Globo saberão pelas pesquisas que, naquele horário, os aparelhos ou estarão desligados ou ligados em outro canal. (Sugiro que alguém mais competente que eu em matéria de internet arranje um jeito de tornar essa convocação nacional através das redes sociais, começando numa data marcada com antecedência e combinando novas datas até que se torne conhecida alguma providência do sistema Globo em reestruturar profissionalmente seus jornais!)

*Jornalista, economista e professor, doutor pela Coppe/UFRJ, autor de mais de vinte livros sobre Economia Política, sendo o último “A Razão de Deus”, pela Civilização Brasileira (Carta Maior)
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Contraponto 16.386 - " 'Isso é uma piada', diz professor da USP sobre silêncio da Globo no caso HSBC"

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30/03/2015


 'Isso é uma piada', diz professor da USP sobre silêncio da Globo no caso HSBC

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Em entrevista à Rádio Brasil Atual, Vladimir Safatle afirma que ao guardar nomes de brasileiros com contas em Genebra a grande imprensa transforma o jornalismo "em uma grande brincadeira"

Por Rádio Brasil Atual

O HSBC é um exemplo privilegiado de como corporações que estão no limite da criminalidade impõem na economia internacional seus interesses. O professor de filosofia da Universidade de São Paulo (USP) Vladimir Safatle indica a instituição financeira como exemplo de promiscuidade entre mercado financeiro, política e mídia, com raízes no crime, em entrevista à Rádio Brasil Atual hoje (20). “Desde sua criação, o banco tem as piores credenciais possíveis. Essa instituição bancária foi criada em 1860, depois da última guerra do Ópio entre Inglaterra e China, quando os ingleses forçaram a abertura dos portos chineses para que o tráfico da droga continuasse”, relata.

“Os chineses resolveram impedir o comércio de ópio porque a população já estava entrando em um processo de ser dizimada pela droga. Então, o banco foi criado exatamente para financiar o tráfico de drogas, entre outras coisas. E ele cresceu, a partir dos anos 70, comprando bancos dos Estados Unidos e da Europa, muitos dos quais tinham carteiras extremamente problemáticas", diz Safatle. 

"Foi o caso do banco do finado Edmond Safra, que tinha entre seus clientes traficantes de diamantes e negócios com a máfia russa. O Safra foi assassinado em uma situação, no mínimo, bastante misteriosa. Seu banco iria ser comprado pelo American Express e o negócio foi desfeito por causa de problemas internos."

Esse foi o processo de crescimento do banco, segundo o professor. "Comprou o Bamerindus aqui, um banco que estava com problemas enormes. E não só isso, quer dizer, ele é reincidente, faz anos que o banco tem sido julgado por várias instâncias mundiais, exatamente por esses seus negócios com tráfico, negócios ilícitos. Foi declarado culpado nos Estados Unidos por um caso que envolvia tráfico com colombianos e mexicanos. Só que pagou uma mixaria de um milhão e novecentos mil dólares de multa.”

O que ocorre com o HSBC não é novo, é uma prática comum, para Safatle: “E não é para estigmatizar o banco, mas para esclarecer o que é o sistema financeiro internacional. São corporações que estão acima dos governos. Não só não se quebra como não se regulamenta um banco como o HSBC, porque ele está tão acima dos governos que o seu diretor à época desses chamados Swiss Leaks era pastor anglicano e hoje é ministro do David Cameron, no governo britânico."

O professor ressalta que se percebe uma relação incestuosa entre o sistema financeiro e a classe política. "É o diretor do banco que vira ministro de um gabinete da Inglaterra, que, com certeza, não vai desenvolver políticas que sejam estranhas ou contra os interesses do sistema financeiro que ele representa muito bem. A imprensa começou a questionar o ministro e ele não dá resposta alguma, porque ele sabe que está numa situação de ser completamente intocado, não há nada que possa acontecer com essas pessoas", lamenta.

Para o filósofo, todo mundo fica completamente exacerbado por problemas como tráfico de drogas, de armas, guerras. "Se não existissem esses bancos, que têm como uma suas finalidades lavar esse dinheiro, com certeza o problema não seria dessa magnitude em hipótese alguma. Só há crime nessa magnitude porque há um sistema financeiro que é completamente conivente, cresceu dentro desse meio.”

Ele destaca que não é só a tráfico de drogas que o HSBC está ligado, mas que há também fraudes de evasão fiscal, no momento em que a economia mundial e os estados estão em crise, tentando segurar o que restou de bem-estar social. “Os países da União Europeia socorreram bancos falidos. Então, quando os bancos cometem crimes, o que se espera é que os responsáveis sejam punidos, presos, mas não é isso o que ocorre”, observa.

Safatle lamenta que a imprensa brasileira não noticie os fatos, ao contrário da europeia. “É inaceitável o tipo de silêncio tácito que está ocorrendo, salvo raríssimas exceções muito pontuais. Na imprensa francesa ou britânica, mesmo nos Estados Unidos, foi dito que vão utilizar esses dados para tentar reaver o dinheiro." Nesses casos, a imprensa apresentou os nomes: "O Le Monde, que mobilizou um pouco tudo isso, chegou a brigar com seus acionistas porque um deles fez uma declaração dizendo que achava um absurdo que o jornal expusesse esses nomes. Ou seja, a imprensa fez o seu papel. No caso brasileiro é inacreditável".

O Brasil é, a princípio, o nono país em número de contas nessa filial genebrina do HSBC. São 8.667 contas, das quais 55% são contas de nacionais, ou seja, são mais de 4 mil pessoas. "A pergunta que eu gostaria de fazer é quem são essas pessoas. O sujeito não abre uma conta em um banco suíço com esse histórico à toa. Quem são as pessoas que fizeram evasão fiscal, fraude fiscal e coisas dessa natureza?”, questiona.

Alguns nomes de brasileiros que possuem contas no HSBC com depósitos sem origem comprovada na agência em Genebra foram conhecidos por intermédio de sites angolanos. “Aí apareceu o nome do rei do ônibus do Rio de Janeiro, o nome da família Steinbruch, que é do grupo Vicunha. Essas pessoas cometeram crimes, quais foram os crimes? É muito estranho que não só a imprensa, mas, ao que parece, a própria Receita Federal adiou a análise de coisas desse tipo."

Para Safatle, isso demonstra um dado muito evidente: "A elite rentista brasileira é completamente blindada, sabe que é e tem uma relação incestuosa entre poder político e estrutura de comunicação, que faz com que em última instância seja um grupo só, de uma forma ou de outra, que sabe que pode fazer o que quiser, porque sabe que não existe nenhuma possibilidade de a Justiça pegar, a não ser existam embates internos, em brigas internas, aí sim vão pegar um ou outro".

O professor da USP se pergunta como ampliar essa discussão oculta na imprensa tradicional. “Os nomes que vazam dessa lista de brasileiros com contas no HSBC em Genebra são de envolvidos na Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Quer dizer, os nomes são divulgados dependendo do interesse do meio de comunicação. Só são esses os nomes dos 4 mil correntistas, só são esses dez ou 15 que tiveram problemas? Isso é uma brincadeira.”

A extrema gravidade da história exige que se faça algo. “Se tem algo que destrói a moralidade é a parcialidade, é você começar a perceber que há um uso estratégico do discurso sobre a moralidade, porque é um uso que serve simplesmente para você voltar suas atividades contra seus inimigos. Nesse momento, a moralidade perde completamente seu valor. Eu diria que na política brasileira isso acontece a torto e a direito, é um traço característico da política brasileira."

Safatle lembra: "A moralidade exige a simetria completa dos julgamentos. É julgar todos da mesma forma, independente do que vá acontecer. Isso falta dentro da política brasileira. É por isso que não se consegue fazer com que essas indignações se transformem em saltos qualitativos da política. E aí vira simplesmente um jogo em que se tenta colocar um ou outro contra a parede.”

Safatle identifica que há um processo de desgaste constante do governo pela mídia e, por isso, os nomes envolvidos em negócios ilícitos no HSBC são seletivos. “Se a gente quisesse mesmo fazer uma limpeza geral no que diz respeito ao caso Petrobras, por exemplo, todos denunciantes falaram: 'Olha, desde 1997 eu recebo propina'. Ou seja, tem um dado estrutural, não existe um caso de governo ou de partido, é um caso de estrutura, em que vai todo mundo. E nessa situação o mínimo que se espera é que se mostre claramente a extensão do processo e a necessidade geral de punição.

Mas isso nunca ocorre, isso desgasta toda a força da indignação moral”, lamenta. “Todo mundo que conhece um pouco da sociedade brasileira sabe que lá você vai encontrar alguns dos nossos empresários mais conhecidos, alguns dos políticos mais conhecidos.”

Quanto ao silêncio que a Rede Globo dedica ao caso do HSBC, Safatle comenta: "Isso é uma piada, é completamente inacreditável. Eu gostaria que eles explicassem muito claramente qual é a noção deles de notícia, porque é surreal. Você pode pegar as páginas do The Guardian, jornal britânico, ou do francês Le Monde, e a televisão de maior audiência não dá nada? O que é isso? Eles transformam o jornalismo em uma grande brincadeira".

Para a secretária-geral do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, Ivone Maria da Silva, é uma "vergonha" que esse caso só apareça em alguns sites e blogs e seja ignorado pelos grandes meios de comunicação, que não têm interesse em divulgar os nomes de brasileiros que estão nessa lista com depósitos sem origem comprovada no HSBC em Genebra. “Um dos clientes que já apareceu na lista foi o Clarín, da Argentina. Não vamos ficar surpresos se os meios de comunicação aqui do Brasil também aparecerem na lista, ou se os donos desses meios estiverem guardando dinheiro lá fora para não pagar impostos. Talvez por isso essa lista não seja divulgada. Começaram a soltar os nomes seletivamente, e por isso surgem os nomes relacionados com a Lava Jato. Mas tinha que soltar o nome de todo mundo”, diz.
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domingo, 29 de março de 2015

Contraponto 16.385 - "Brasil: satélite de R$ 750 mi levará banda larga a todo o país"

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.29/03/2015


Brasil: satélite de R$ 750 mi levará banda larga a todo o país

 Foto: AFP



Raupp faz parte da comitiva da presidente Dilma, que chegou na terça-feira à Índia para o encontro do Brics
Foto: AFP
O país busca na Índia uma cooperação técnica para o satélite, cuja construção e lançamento, sob responsabilidade da Telebras e da Embraer, tem um custo avaliado de R$ 750 milhões. Apenas o lançamento custará US$ 80 milhões, cerca de US$ 150 milhões.

"Vamos fazer um concurso internacional que abre a possibilidade a uma cooperação tecnológica importante", disse o ministro. O satélite de comunicação dará opção a todos os municípios brasileiros a acessar a banda larga para os serviços de internet e telefonia móvel 3G.

Brasil, Índia e África do Sul - três integrantes do grupo dos emergentes Brics, ao lado de China e Rússia - também discutirão nos próximos dias o lançamento de outro satélite para a observação do clima no Atlântico Sul, o que permitirá fazer as medições necessárias para "entender as anomalias com o campo magnético terrestre que deixam passar as radiações ultravioletas".

Com a China, país com o qual mantém uma intensa cooperação desde os anos 80 - com o lançamento conjunto de três satélites -, o Brasil prevê o lançamento de um satélite este ano e outro em 2014, informou o ministro, que considera "estratégica" a cooperação Sul-Sul.

Durante a visita bilateral à Índia na sexta-feira, Raupp assinará com as autoridades indianas um acordo para o programa "Ciências Sem Fronteiras", que permitirá o treinamento no exterior de estudantes e especialistas brasileiros nas áreas das ciências naturais e engenharia.

Brasil e Índia devem aumentar cooperação em ciência e tecnologia 

As autoridades da Índia serão as primeiras na Ásia a formalizar parceria com o Brasil no programa Ciência sem Fronteiras, lançado em julho de 2011, e que pretende enviar para o exterior, em 4 anos, 75 mil estudantes ¿ desde alunos de graduação até cientistas com pós-doutorado. A presidente Dilma Rousseff elogiou nesta quarta-feira os avanços conquistados pelos indianos em ciência, tecnologia e inovação. "Os brasileiros admiram a capacidade da Índia de combinar valores milenares com avanços notáveis em ciência, tecnologia e inovação", disse.

*Com informações de agências de notícias.      

Contraponto 16.384 - "As ilusões da direita no Brasil"

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29/03/2015

As ilusões da direita no Brasil

Uma ilusão muito importante é a de que tudo vai muito bem pelo mundo, só no Brasil ou na América do Sul dominada pelas esquerdas é que não.


Carta Maior - 28/03/2015

Antonio Cruz/Agência Brasil



Flávio Aguiar



As ilusões da direita no Brasil se dividem em dois grupos: o daquelas que ela quer vender para a população em geral, e o daquelas que ela mantém por si mesma, e para si.

Dentre as primeiras – aquelas à venda – destaca-se a de uma frase atribuída ao senador Aécio Neves: “para resolver o problema da corrupção no Brasil basta tirar o PT do governo”, ou algo parecido. Simplória, simplista, não li desmentido: ficou o não dito pelo dito. Vai na esteira da superstição martelada pela mídia de que a corrupção foi fundada pelo PT, alimentada por comportamentos no Judiciário de juízes como Joaquim Barbosa e Sérgio Moro.

Mas há outras no mercado. Outra muito importante é a de que nas aparências tudo vai muito bem pelo  mundo, só no Brasil ou na América do Sul dominada pelas esquerdas é que não. A Europa não está em estado falimentar, os Estados Unidos não estão pressionados por uma crise sem precedentes, só há corrupção no Brasil e no Terceiro Mundo, o Japão vai muito bem, embora estagnado há décadas e por aí adiante.

Outras ilusões vendidas: caso ganhe as eleições presidenciais algum dia, a direita não vai mexer nos direitos trabalhistas. Vai sim. Vai mexer nas férias remuneradas, no salário mínimo, na Justiça do Trabalho, nas indenizações, em suma, em tudo aquilo que ela vê como elevação do “custo Brasil”, quer dizer, as obrigações sociais que o empresariado tem de cumprir. Espero que quem viver não veja, mas quem ver a vitória da direita, verá.

Mas as piores, as mais daninhas, são aquelas que a direita mantém para si mesma. Vamos começar pelas internas. Cada grupo, cada político da direita, alimenta a ilusão de que poderá livremente instrumentar os e as demais. Serra acha que poderá instrumentar Aécio e Alckmin, este que vai instrumentar os outros dois e aquele, este e aqueloutro. FHC acha que poderá instrumentar todos eles em função de seu sonho de garantir seu lugar no Panteão dos grandes chefes de estado nacionais, transformadores e consolidadores, por ora ocupado por Pedro II, Vargas e Lula, nesta ordem cronológica. Vã ilusão de todos. Haverá uma briga de foice entre eles, e FHC já está condenado a ser o ex-intelectual brilhante, ainda que conservador, que esqueceu tudo o que escreveu antes e se tornou um político medíocre, aprendiz de golpista nos últimos tempos.

Além disto, os líderes da direita pensam que poderão instrumentar os movimentos de rua, os pró-impeachment, os pró-ditadura e os pró-coisa nenhuma, e estes pensam que poderão instrumentar aqueles e os outros movimentos. Esta ilusão pode sair cara a eles, mas será mais cara a nós, democratas pró ou contra o governo, pois se aqueles prevalecerem eles começarão por comer quem a eles se opuser mas terminarão por se comer a si mesmos, num processo longo, doloroso, inseguro, e cheio de solavancos, como aconteceu com a ditadura de 21 anos que engolimos décadas atrás.

Também alimentam a ilusão de que serão recebidos como salvadores da pátria. A menos que tenham o apoio das Forças Armadas e que estas calem os movimentos sociais à bala, o que parece improvável, uma vitória do impeachment, por exemplo, mergulhará o país no caos, além de liberar de fato uma gandaia de corrupção, pois a PF perderá a autonomia, o Ministério da Justiça virará um bordel, o Procurador Geral da Republica voltará a ser o Engavetador-Mór, etc.,  o arrocho em cima dos trabalhadores, aposentados e estudantes seguirá o modelo europeu, enfim, o Brasil vai virar uma república dividida entre a banana e o abacaxi, além do pepino.

Por fim, a direita alimenta a ilusão, esta para si e também à venda, de que será recebida de braços abertos pela “comunidade internacional”, aquela que para ela conta: a Europa Ocidental, ou circuito Helena Rubinstein, os Estados Unidos, supermercados de Miami à frente, e o Japão, recessão à parte. Vã ilusão. Seremos recebidos – pois estaremos juntos nesta anti-aventura – com risotas de bastidor, finalmente reconduzidos ao curral de onde nunca deveríamos ter saído, aquele reservado aos pobres que não têm remédio nem saída, governados pelos oligarcas de plantão.

A outra ilusão é a de que tudo isto é possível. Não é mais. O Brasil não voltará ser o que era. O Brasil enveredou para o futuro. Seja lá o que seja ele.

Contraponto 16.383 - O pensamento de Renato Janine Ribeiro

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29/03/2015


Renato Janine Ribeiro fala de Olavo de Carvalho e do crescimento da nova extrema direita no país


Diário do Centro do Mundo - Postado em 29 mar 2015 por :





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Contraponto 16.382 - " Dilma retoma iniciativa e, enfim, sai das cordas"

Contraponto 16.381 - "Miguel Rosseto: Financiamento empresarial, gênese da corrupção"

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29/03/2015


Miguel Rosseto: Financiamento empresarial, gênese da corrupção


Viomundo - publicado em 27 de março de 2015 às 20:32

Agência Brasil - ABr - Empresa Brasil de Comunicação - EBC
Miguel Rossetto: Gênese da corrupção

por Miguel Rossetto, via e-mail

Não há espaço para hesitar: o tema central de uma reforma política democrática é o fim do financiamento empresarial de partidos e campanhas.

Seus efeitos negativos apontam em cinco direções. O financiamento empresarial sequestra a regra básica nas democracias – a cada cidadão ou cidadã, um voto – e amplia a exclusão do segmento popular com menos acesso ao poder econômico. Por isso, o crescente e perigoso distanciamento entre políticos e sociedade.

Em segundo lugar, afeta o pluralismo da disputa eleitoral, concentrando mais recursos nas candidaturas favoritas. Por este caminho, altera a agenda das democracias pela pressão dos grandes agentes econômicos privados.

O financiamento empresarial corrói a transparência dos partidos ao vinculá-los a objetivos que não podem ser assumidos porque ferem o interesse público. E, por fim, aumenta o risco de políticos, na corrida por dinheiro, praticarem ações ilícitas.

A operação Lava-Jato e o escândalo do metrô de São Paulo expõem as vísceras deste sistema: grandes empreiteiras financiadoras de eleições, políticos dos principais partidos e licitações viciadas em obras públicas. Situação antiga, que evidencia a gênese da corrupção eleitoral.

Ao lado disso, assistimos a explosão do “investimento” empresarial nas eleições brasileiras – mais de 90% arrecadado vêm de doações (investimentos?! empréstimos?!) de grandes grupos econômicos e bancos. Em 2014, este gasto ultrapassou R$ 5 bilhões! Uma única empresa doou R$ 360 milhões!

A sociedade civil – liderada pela CNBB, OAB, CUT e UNE – vem formando uma consciência cidadã de intolerância à corrupção. Manifestações de rua, projetos de iniciativa popular, como o Ficha Limpa, e a afirmação de uma opinião pública majoritária contra o financiamento empresarial expressam essa cidadania ativa.

Comprometida com os mesmos ideais de combate à corrupção e à impunidade, a presidente Dilma Rousseff lançou um pacote para aperfeiçoar o Estado brasileiro. Entre as iniciativas, a criminalização do caixa 2, o confisco de bens de servidores corruptos e a punição a empresas corruptoras. Além disso, apoia uma reforma política que encerre a possibilidade de empresas financiarem partidos e eleições.

É esta também claramente a posição majoritária do STF, que afirmou por seis votos contra um a Ação Direta movida pela OAB que sustenta a inconstitucionalidade do financiamento empresarial. Esta decisão, fundamental para a democracia brasileira, repousa no pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes, prorrogado desde abril de 2014.

A corrupção é intolerável. Combatê-la diretamente é também dotar o país de um sistema político mais democrático, transparente e controlado pela sociedade. É necessário e será melhor vivermos com campanhas eleitorais mais baratas e austeras, nas quais as idéias, opiniões e programas partidários sejam a base de escolha dos nossos representantes. Quem deve financiar esta democracia é o eleitor cidadão, e não interesses empresariais.


Miguel Rossetto é ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República


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Contraponto 16.380 - "Kenarik Boujikian: Se Gilmar já criticou na imprensa a ADI da OAB contra financiamento de empresa por que segurar mais o processo?"

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29/03/2015


Kenarik Boujikian: Se Gilmar já criticou na imprensa a ADI da OAB contra financiamento de empresa por que segurar mais o processo?


Viomundo - publicado em 28 de março de 2015 às 13:29

Gilmar e Kenarik


Kenarik Boujikian:  “O ministro tem o dever republicano de devolver o processo”

O STF escolhe: o cidadão ou o poder econômico?

por Kenarik Boujikian, especial para o Viomundo

Cada dia fica mais claro que o Brasil necessita de uma real reforma política, a ser feita por eleitos para este fim específico e sem que o sejam às custas de empresas. Este desafio não pode ser exercido por este Congresso e nem se está a imaginar que o Supremo Tribunal Federal (STF) possa fazê-lo. Evidente que não, mas cabe ao STF dizer se a lei, que permite que as empresas e os ricos mandem nas eleições, deve valer ou não para as próximas campanhas.

Para tanto, a decisão do STF deverá ter por norte tornar os fundamentos da República, especialmente a cidadania, reais e efetivos para o povo brasileiro, de quem emana o poder.

Um dos meios de exercício do poder se dá através dos representantes eleitos para o legislativo e executivo. Mas quem de fato está exercendo este poder? O povo brasileiro ou as empresas?

A resposta está dada: nas eleições presidenciais de 2010, 61% das doações da campanha eleitoral tiveram origem em 0,5% das empresas brasileiras. Em 2012, 95% do custo das campanhas se originaram de empresas. Só uma construtora doou, para diversos candidatos, o montante de R$ 50 milhões. Nas eleições de 2014, em todo o Brasil, os valores foram estratosféricos.

Forçoso concluir que o sistema eleitoral está alicerçado no poder econômico, o que não pode persistir. Para que se tenha uma eleição justa e democrática é necessário respeitar a máxima: “uma pessoa, um voto” e acabar de uma vez por todas com o “mais cifrões, mais votos “ e nesta medida deixar de privilegiar os mais poderosos.

Não por outro motivo, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou ação direta de inconstitucionalidade (ADI 4650), em setembro de 2011, e requereu a limitação das doações de pessoas físicas (muitas vezes do próprio candidato) e a proibição das pessoas jurídicas (empresas) de participarem do sistema eleitoral.

Dada a importância do tema, o STF realizou grande audiência pública e diversas entidades, como a CNBB, participam do processo como “amicus curiae” (instrumento democrático de participação) .
 Ficou absolutamente transparente o que todos já sabem: que as campanhas são milionárias, financiamentos maiores que orçamentos de várias cidades e estados.

Em dezembro de 2013, o processo entrou em julgamento. Seis ministros (portanto, já configurando a maioria) votaram contra o financiamento por empresas: Luiz Fux, Marco Aurelio,  Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Dias Toffoli. O ministro Teori Zavaschi deu voto contrário ao pedido da OAB. Na sequência, em 02.4.2014, o ministro Gilmar Mendes exerceu o direito de vista, mas desde então o processo está paralisado.

Durante a votação, ministros apresentaram os fatos, às claras, sem tergiversação e disseram: não se pode acreditar no patrocínio desinteressado das pessoas jurídicas; deve-se evitar que a riqueza tenha o controle do processo eleitoral em detrimento dos valores constitucionais compartilhados pela sociedade; a pretensão da ADI é indispensável para dar fim ao monopólio financeiro das empresas e grandes corporações sobre as eleições e alcançar-se a equidade do processo eleitoral exigida pela Constituição; a enorme desigualdade entre os participantes produz resultados desastrosos para a autenticidade do processo eleitoral; o financiamento, como posto, fere o equilíbrio dos pleitos, pois as pessoas comuns não têm como se contrapor ao poder econômico; a lei deve servir para proteger a normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico.

O STF, em que pese composto por diversos ministros, é uma unidade de poder e a democracia exige reverência ao exercício da jurisdição colegiada, com respeito ao voto minoritário e com subordinação à decisão da maioria.

Não se sabe o que os demais ministros pensam acerca do tema, salvo o próprio ministro Gilmar Mendes que não se manifestou no processo e pediu vista. Porém, ao que tudo indica (em entrevista publicada no portal G1 – de 17.3.2015) já tem posição formada, de modo que não há qualquer justificativa plausível para continuar a reter o processo em suas mãos. Se o ministro já disse para a imprensa o que pensa sobre a ação, se já criticou a OAB pela interposição da ADI, por certo já tem seu ponto de vista consolidado e em condições de submetê-lo aos demais ministros.

O que não é justificável é impedir o julgamento e bloquear a tomada de posição do STF, num tema tão fundamental para a democracia e porque manifestou que já tem seu pensamento definido.

A Reforma do Judiciário, de 2004, que mudou a Constituição Federal, emitiu uma ordem para todos os Tribunais ao determinar a distribuição imediata de todos os processos, em todos os graus de jurisdição ( artigo 93, inciso XV). Assim, aboliu a prática do represamento, para qualquer membro do Judiciário. Se o ministro pediu vista para uma melhor análise, vamos assim dizer, agora, assumidamente possui posição, e portanto, nada justifica que permaneça com o processo. Tem o dever republicano de devolver o mesmo.

Não é tolerável que com um pedido de vista, um ministro possa atar as mãos da estância máxima do próprio Poder Judiciário, o que soa ainda mais desarrazoado, se considerado o resultado provisório do processo e a manifestação do ministro. Com isto, quero dizer que a soberania popular (que cada magistrado exerce, em cada caso e sempre em nome do povo) não pode ficar na mão de uma pessoa, em um órgão colegiado.

O Tribunal não  pode ficar ao talante de um de seus membros. A magnitude do tema está a exigir que o próprio STF sensibilize o ministro que está  com o pedido de vista para importância da finalização do julgamento e indispensabilidade da decisão coletiva. Aliás, recentemente, o ministro Gilmar, durante sessão do STF, apelou para que um ministro viesse a integrar a segunda turma, no que foi atendido. O próprio STF deve resguardar a soberania popular, colocando em marcha um processo da maior significação para a democracia.

Questão da maior gravidade está colocada nas mãos do STF, com contornos contundentes. A proximidade das eleições reclamam que uma mudança seja feita, o quanto antes, à tempo de impedir que esta situação se perpetue. As doações empresariais já impactaram as últimas eleições. Espera-se que não interfira nas seguintes, de forma tão deletéria .

Clamando para que o STF cumpra seu papel, a sociedade já pediu, por diversas formas, que o processo volte à sessão de julgamento.

Mas encerro com uma boa nova: o presidente do STF, Ricardo Lewandowsky, noticiou, em 11.3 ( site do STF), que colocará com prioridade na pauta do plenário, neste ano, os processos que tiveram o julgamento interrompido por pedidos de vista.

Que a ADI 4650 seja julgada o mais rápido possível,de forma que o STF resguarde o sistema democrático e fortaleça os objetivos da República, dentre eles, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Assim, com certeza, poderá dar verdadeira contribuição para a democracia, colocando as empresas em seus lugares e não nos lugares dos cidadãos.

Kenarik Boujikian, magistrada no Tribunal de Justiça de São Paulo e cofundadora da Associação Juízes para a Democracia


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