No mesmo momento em que o mundo árabe se une em um amplo movimento para a democracia, em Israel as instituições democráticas estão em crise. Enquanto os árabes cobram responsabilidade de seus líderes, os líderes de Israel estão, frequentemente, enfrentando investigações e acusações de corrupção. Os manifestantes invadiram as praças das grandes cidades árabes, mas a Praça Rabin, em Tel Aviv, permanece silenciosa. Onde estão os que exigem mudanças que tragam a paz e a prosperidade para todos os israelenses? O artigo é de Reginaldo Nasser.
Reginaldo Nasser (*)
Tal como seus antecessores, Binyamin  Netanyahu sempre ponderou que Israel não poderia estabelecer acordos  diplomáticos confiáveis com os Estados Árabes a não ser que estes  passassem por um efetivo processo de democratização. No entanto, desde o  primeiro momento em que a revolução democrática no mundo árabe emitiu  seus primeiros sinais na Praça Tahrir, no Cairo, o mesmo Netanyahu usou  todos os esforços diplomáticos para manter Mubarak no poder, alegando  que sua queda ocasionaria conseqüências desastrosas para toda a região. A  democracia que os líderes israelenses sempre apregoaram aos seus  vizinhos é agora vista como uma séria ameaça.  O silêncio dos lideres  Palestinos não foi menos revelador.  A Autoridade Palestina, do  presidente Mahmoud Abbas, perdeu o seu principal apoiador, Mubarak, em  sua luta política contra o Hamas.
Apesar das nações com os quais  Israel deveria fazer a paz (Líbano, Síria e Palestina) não estarem  sendo atingidas pelas revoluções que hoje varrem a região, a situação  agora é diferente, pois o tratado de paz com o Egito é crucial para seus  cálculos de segurança. Provavelmente os novos governos formados no  Egito e em outros países, vão refletir o descontentamento interno e,  mais cedo ou mais tarde, promoverão ajustes nas questões de política  externa. Acostumados a olhar apenas para os problemas de Israel em suas  relações exteriores (Palestinos, Irã, Hezbolah ou Síria), a  opinião  pública internacional deverá observar com atenção, a partir de agora, as  movimentações que poderão acontecer na sociedade civil israelense e que  definirão, em grande medida, a orientação que o Estado deverá adotar  nos próximos anos.
Alon Ben-Meir alerta para o fato de que, no  mesmo momento em que o mundo árabe se une em um amplo movimento para a  democracia, em Israel as instituições democráticas estão em crise.  Enquanto os árabes cobram responsabilidade de seus líderes, os líderes  de Israel estão, frequentemente, enfrentando investigações e acusações  de corrupção. Os manifestantes invadiram as praças das grandes cidades  árabes, mas a Praça Rabin, em Tel Aviv, permanece silenciosa. Onde estão  os que exigem mudanças que tragam a paz e a prosperidade para todos os  israelenses? pergunta Ben-Meir (Israel, Where Are You? Jerusalem  Post, 25/02/11. ver também do mesmo autor And if Not Now, When? , The  Huffington Post.com, 7/03/2011)
O fato é que a tão alardeada  democracia israelense vaza água por todos os lados. O poderoso movimento  dos colonos está em franca expansão, ocupando terras palestinas e  construindo cidades. Segundo a organização israelense de direitos  humanos B’tselem, são 500.000 colonos (cerca de 130.000 são militantes  armados) que controlam 42% do território da Cisjordânia.
A nova  imigração russa tem sido fator fundamental nas eleições. Em 2009, a  grande maioria dos russos que imigraram para Israel, depois de 1989,  votaram no partido da ultra-direita, Yisrael Beitenu (Israel é o Nosso  Lar) liderado pelo atual ministro de relações Exteriores, Lieberman, que  sempre faz questão de dizer que nunca existirá um Estado Palestino. Os  árabes-israelenses são uma comunidade marginalizada nas estruturas  políticas, econômicas  e educacionais de Israel. Formam 20% da  população, mas contribuem com apenas 8% do PIB e 60% de seus membros  vivem abaixo da linha  da pobreza.
Oficiais israelenses e  unidades de combate estão ficando cada vez mais ideológicos e  religiosos. Em 1990, 2,5% dos oficiais de infantaria eram religiosos.  Esse número saltou, em 2007, para 31,0%. Pesquisa conduzida pelo  instituto israelense Maagar Mochot indicou que quase 50% dos estudantes  do ensino médio de Israel não acreditam que os árabes devam ter os  mesmos direitos que os judeus do Estado de Israel. 
No que se  referem à economia israelense os dados não são tão animadores, apesar do  crescimento de 5,4% em 2010. De acordo com o mais recente relatório do  Instituto Nacional do Seguro Social, 23% da população vivem abaixo da  linha da pobreza. Em 1988, a classe média representava 33% da população  de Israel. Em 2009 caiu para 26,6% e Israel já é considerado um dos  paises mais desiguais do mundo.
Em contundente artigo escrito no Haaretz (When did it become illegal to be a Leftist in Israel? 06/01/2011)  Gideon Levy denuncia que “não é mais legítimo ser de esquerda em  Israel”. O Knesset ( parlamento israelense) resolveu criar uma comissão  de inquérito sobre as atividades dos grupos de esquerda sob a acusação  de “ações de deslegitimação” contra o Estado de Israel". Fazer campanha  pelos direitos humanos, se opor à ocupação ou investigar crimes de  guerra tornou-se ilegítimo.
Mas, é justamente em momentos de  instabilidade e incertezas como esse que o governo de Israel precisará  do apoio da comunidade internacional e de seus cidadãos. Entretanto,  Netanyahu prefere virar as costas para essa nova ordem regional em  formação. E se a turbulência chegar aos territórios palestinos, qual  será a resposta de Israel? Mesmo com todas as limitações e obstáculos  que apontamos acima, Israel será obrigado a passar por mudanças  profundas sob pena de ficar ainda mais isolado devido às campanhas  internacionais. Os atuais governantes não terão mais a desenvoltura  diplomática anterior quando era possível fazer acordos diplomáticos com  os ditadores árabes corruptos.
Gideon Levy advertiu  apropriadamente que se os lideres políticos israelenses não mudarem sua  forma de agir levando em consideração a complexidade de sua sociedade  “eles vão acordar um dia, seja em 10 ou 20 anos, como os líderes da  Líbia, Egito e Tunísia, no meio de um pesadelo”. Resta acreditar e  torcer para que a rua judaica dê seu recado no devido momento.
(*)Reginaldo Nasser. Professor de Relações Internacionais da PUC (SP) e Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP)
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