11/07/2011
As desventuras e a alegria de viajar pela América Latina
Do Blog do Emir - 10/07/2011
Emir Sader*
Ir do Brasil a El Salvador, com troca de avião em  Lima. Ir à Republica Dominicana via Miami. Ir a La Paz, a capital do  país, desde qualquer lugar, tendo que trocar de avião em Santa Cruz de  la Sierra (mesmo com a companhia estatal, a Boa).
Nem pense em ir  a lugares como Quito o Montevideo, porque é necessário fazer uma enorme  quantidade de malabarismos de aeroportos, trocas de aviões, trânsito –  com as esperas, os cancelamentos e os atrasos respectivos e os  correspondentes riscos multiplicados de perda das malas, se você faz a  bobagem, da qual pode se arrepender por vários meses, de despachar as  malas. Quem viaja constantemente deve reservas vários dias ao ano das  suas vidas para esperar malas, que podem tardar vem mais de uma hora ou  não chegar nunca, para nossa decepção quando as malas vão rareando, as  pessoas pegando as suas e indo embora, até que ficamos solitários e  desolados diante da esteira vazia, que começa a parar, indicando que se  deve dirigir ao balcão de reclamações de bagagens perdidas.
Começa  ai um longo périplo – que pode demorar alguns meses – de preenchimento  de formulários, de escolha de qual das dezenas de malas de formatos  muito parecidos, se assemelha a infeliz mala perdida – qual cachorrinho  levado pela carrocinha. Incalculável numero de telefonemas, em que se  dá, cada vez, várias vezes os nosso dados pessoais, o itinerário  a data  da viagem, as vezes o lugar em que se viajou, e a senha mágica que nos  deram, frequentemente composto de intermináveis números e letras, em que  não fica claro quando é o numero zero ou a letra O, quando as letras  são maiúsculas ou minúsculas. Mas se termina tendo familiaridade com  aquela maldita senha, que suposta nos levara ao reencontra feliz com a  pobre e abandonada mala perdida. Se começa cada vez tudo de novo, como  se estivesse começando o procedimento e quando se acredita que se  individualiza alguém que já nos atendeu varias vezes, nos relatam que a  tal persona, que era o passe para relação mais personalizada, está de  férias ou já não trabalha naquele setor ou naquela companhia.
Por  alguma razão incompreensível alguns países pedem certificado de vacina  que, uma vez conseguido, nem nos pedem. Já tive que adiar uma viagem por  24 horas enquanto se conseguia uma autorização especial para eu viajar  sem o certificado – ele vale por 10 anos, mas tem que a vacina tem que  ser tomada 40 dias antes – e quando finalmente cheguei esbaforido no dia  seguinte ao previsto, correndo diretamente para fazer a conferência  para um auditório cheio de estudantes muito ansiosos, nem me pediram o  certificado. Tive vergonha e pena de dizer isso aos que tinham se  desdobrado durante aquelas 24 horas para que eu pudesse finalmente  entrar no país.
Outra vez eu só soube quando ia retornar ao  Brasil que deveria ter tirado o certificado no Brasil antes de ir. Na  véspera de retornar fui ao consulado brasileiro e um simpático  funcionário me deu a chave: um centro de saúde em que se pagava para ter  o certificado e a funcionaria dava o certificado com os devidos 40 dias  de antecipação, data evidentemente anterior à do meu ingresso no país,  data em que eu não estava naquele país. Mas funcionou tudo conforme os  requerimentos.
Mas a América Latina piorou no chamam de tráfego  aéreo – que a gente só vê na hora de subir e de descer, com aquelas  demoras anunciadas simpaticamente pelos pilotos, dizendo que somos o  numero 18 na fila para decolar ou que temos que ficar dando voltas em  torno do Galeão por um tempo indeterminado, devido ao “congestionamento  do tráfego aéreo”.
Piorou porque a Iberia – uma verdadeira  devoradora de companhias aéreas – comprou a Viasa, até ali uma boa  companhia aérea venezuelana –e a quebrou.  A  Venezuela ficou sem  companhia aérea nacional, agora o governo de Hugo Chavez, com grande  esforço está construindo, a duras penas, uma. O mesmo a Iberia fez com a  Aerolineas Argentinas, comprada pela insaciável cia. espanhola, que a  devolveu quebrara para o governo argentino, que teve que estatizá-la e a  mantem viva, com grande dificuldades, viva.
Mas tudo isso vale a  pena, pela beleza e pelas extraordinárias experiências politicas que  vários países do continente estão vivendo, tanto em processos de  democratização econômica e social interna, como de integração – na  contramão das companhias aéreas e enfrentando a resistência férrea  delas. Como cruzar a cordilheira do Andes indo do Rio para Lima, com  bolsões de neve e, de repente, despontar, majestoso, o lago Titicaca,  uma aparição milagrosa de um oásis interminável no meio daquela secura  de terras aparentemente inexpugnáveis. E passar por Lima, mesmo se por  algumas – inevitáveis 5 horas – de esperar para seguir a San Salvador –  com a consciência de que, mesmo se vai tomar posse somente no fim deste  mês, o Peru vai deixar de ser governado por Fujimori, por Toledo, por  Alan Garcia. Vai ter um governante com profundas raízes peruanas, que se  propõe a fazer com que a economia do país continue a crescer, mas  distribuindo renda, ao contrário do que aconteceu nas duas ultimas  décadas, em que o pais foi pilhado por empresas extrativistas das suas  riquezas minerais, com o beneplácito de governos que nem sequer  esboçaram fazer com que um dos povos mais pobres do continente pudessem  participar minimamente com migalhas dessa expansão.
Tudo vale a pena na América Latina, porque a nossa alma não é pequena.
*Emir Sader. Sociólogo e cientista político
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