01/06/2011
Da Carta Maior - 30/05/2011
Já se delineiam duas sérias ameaças em nível global, que podem indicar um primeiro desdobramento da crise financeira originada nos Estados Unidos em 2008. É a situação crítica da questão fiscal dos Estados Unidos e Grécia. Os holofotes agora estão na Grécia, mas não levará tempo para se dirigirem aos EUA. Face a esse quadro, o melhor para o Brasil é apostar as fichas da saúde econômica e financeira naquilo em que somos bons: alto potencial de mercado interno inexplorado. Assim, é bom repensar as políticas do pé no freio, que podem fragilizar o País aos trancos que poderão vir de fora. O artigo é de Amir Khair.
Amir Khair
Ainda não se passaram três anos e já se  delineiam duas sérias ameaças em nível global, que podem indicar um  primeiro desdobramento da crise financeira originada nos Estados Unidos  em 2008. É a situação crítica da questão fiscal dos Estados Unidos e  Grécia. Os holofotes agora estão na Grécia, mas não levará tempo para se  dirigirem aos EUA.
Vale recordar. Na primeira tentativa de sair  do buraco, a Grécia acertou com o FMI que sua economia deveria encolher  4% em 2010, 2,6% em 2011 e o desemprego, de 9,4% em 2009, subiria para  14,8% em 2012. Esse o custo da redução do déficit fiscal de 13,6% do PIB  em 2009, para 8,1% em 2010 e 6,5% em 2012. Mesmo assim, sua dívida se  estabilizaria em 150% do PIB! Mas em 2010 em vez de conseguir a meta de  déficit de 8,1%, obteve 10,5%, o que acendeu a luz vermelha.
Os  holofotes agora estão na questão fiscal da Grécia, que precisará de um  novo empréstimo em 2012. Com um crescimento mais baixo que o esperado, a  tendência é o agravamento fiscal e a necessidade de mais empréstimos  que, se vierem, trarão sérias dificuldades de satisfazer as condições  impostas pelo FMI, com impacto social crescente e sério risco político  ao governo.
A aposta dos “salvadores” (Banco Central Europeu -  BCE, países da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional - FMI)  ao concederem o primeiro socorro era de que uma profunda restrição  fiscal, com rebaixamento de salários, demissões no setor público e  freada no crescimento econômico, seria capaz de gerar os excedentes para  honrar as parcelas dos empréstimos, que tiveram prazos mais alongados.
Esse  aperto fiscal deveria ser imposto à população e as reações foram  imediatas com paralisações e manifestações de massa, que na ocasião  poderia inviabilizar as negociações em curso. Mas o governo grego  conseguiu vencer o primeiro round e aprovou as duras exigências dos  financiadores, mas com importante condição: a dívida teria que ser  integralmente paga, sem nenhum prejuízo aos credores.
Esse  socorro financeiro implica em dois problemas fiscais, de solução quase  impossível, pois crescem as despesas com o serviço da dívida pelo forte  aumento do endividamento e cai a arrecadação pela redução da atividade  econômica e pelo aumento da inadimplência dos contribuintes, ou seja,  forma-se um “sanduíche” fiscal.
Os credores, no entanto,  partiram da premissa de que a redução das despesas públicas seria  suficiente para superar esses dois problemas. Não foi o que aconteceu e  nem acontecerá. Assim, seria necessário reduzir o valor a ser pago no  serviço da dívida, ou seja, seu deságio, com perda para os credores.
Mas,  o deságio não bastaria para solucionar o problema, pois os  desequilíbrios macroeconômicos já existentes tornam necessários outros  esforços para viabilizar o equilíbrio de suas contas internas e  externas. Atualmente ocorre déficit na balança comercial de 4% do PIB,  maior déficit comercial entre os países da região do euro. Se esse  déficit persistir, terá de captar o volume total em instituições de  crédito estrangeiras, mesmo se os déficits orçamentários  pós-inadimplência puderem ser financiados com captações domésticas.
A  simples ameaça do deságio na Grécia precipitou a elevação dos riscos  das dívidas de Portugal e Espanha. Portugal foi o primeiro a pedir  socorro e já está seguindo o mesmo caminho grego. Tomou em maio recursos  do FMI e da União Europeia de US$ 110 bilhões, que representa 47% do  Produto Interno Bruto (PIB) do país. O último pacote de auxílio do FMI  ao Brasil, em 1998 foi de US$ 40 bilhões ou 4,7% do PIB. Assim, esse  socorro a Portugal foi, em termos de tamanho de sua economia, 10 vezes  maior do que o nosso.
Para situar a gravidade do problema que  ronda a Europa, o pacote da Grécia de US$ 156 bilhões foi também de 47%  do PIB e o da Irlanda de US$ 120 bilhões, 52,9% do PIB, segundo matéria  publicada no jornal Estado de São Paulo (22/maio).
Esses socorros  foram também sem deságio nas dívidas e será apenas questão de tempo  para evidenciar a falta de visão dos “salvadores” e o agravamento da  inevitável deterioração fiscal nesses países.
Não tem como  escapar do deságio das dívidas. Esse deságio, por sua vez, poderá trazer  novos desdobramentos na rede financeira europeia já fragilizada pela  crise iniciada nos Estados Unidos com as hipotecas de alto risco  (subprime) e por a nu os títulos podres em posse do BCE ao socorrer o  sistema bancário da Irlanda, Grécia, Espanha entre outros países.
A  nova tentativa de socorro à Grécia continuará tentando preservar os  credores, alongando mais a dívida, sem reestruturá-la, com nova injeção  de empréstimos, e o calote será inevitável e maior mais a frente. É uma  exigência do BCE para tentar empurrar com a barriga os títulos podres em  seu poder cujo montante é desconhecido.
O mesmo poderá ocorrer  com Portugal, mais à frente à Espanha e, em seguida a Itália, países de  maior expressão econômica na zona do euro. Poderá ser essa a sequência  dos PIIGS. É claro que isso atingirá o sistema bancário das economias  mais sólidas como França e Alemanha, agravando a crise européia com  repercussões em outros países fora da área. Como existe forte relação  entre os sistemas financeiros de Europa e Estados Unidos, esse país  certamente será afetado.
EUA - Em 16/5, os Estados Unidos  atingiram o teto de US$ 14,294 trilhões da dívida pública e o  Departamento do Tesouro planeja anunciar que vai parar de emitir e  reinvestir títulos do governo em certos fundos de pensão públicos, parte  de uma série de medidas para adiar a moratória até 2/8. Essas medidas  do Tesouro visam ganhar tempo para a Casa Branca e líderes do Congresso  chegarem a um acordo de redução do déficit, para atingir número  suficiente de congressistas a votar o aumento da dívida.
A  disputa política entre republicanos e democratas pode fornecer o  combustível necessário para começar a por em dúvida a capacidade do país  honrar o pagamento aos credores, que estão espalhados por todo o mundo,  especialmente países que acumularam fortes reservas ligadas ao dólar,  como China, Japão, Alemanha e o Brasil. Para agravar esse quadro o  déficit fiscal previsto ao final deste ano pode atingir US$ 1,7 trilhões  ou 11% do Produto Nacional Bruto (PNB).
A tentativa de ativar a  economia via elevação da liquidez é outro motivo de preocupação. De  2004 a 2008 a base monetária girava em torno de US$ 0,8 trilhão e a  disparada sem cessar a partir de 2009 a elevou para US$ 2,4 trilhões.  Apesar disso, os empréstimos bancários ficaram estabilizados desde o  final de 2008 em US$ 9 trilhões, evidenciando o deslocamento dessa  elevação da liquidez para fora dos EUA.
É possível que as  agências de classificação de risco, que dormiram no ponto na crise de  2008/2009, não tenham o mesmo comportamento agora. Alguns sinais já  apontam nessa direção. O primeiro foi dado pela Standard & Poor's  que rebaixou de ‘estável’ para ‘negativa’ a perspectiva de rating de  crédito soberano de longo prazo dos Estados Unidos. Com isso sinalizou  que poderá piorar a nota da dívida americana. As razões apontadas para a  decisão foram o persistente déficit orçamentário e o elevado  endividamento do país.
De acordo com a agência, mesmo após dois  anos após a eclosão da crise financeira que abalou o mercado de  hipotecas dos EUA, o governo do presidente Barack Obama dá sinais de que  não chegou num acordo sobre como reverter a deterioração fiscal por que  passa o país atualmente, nem aponta soluções para as pressões fiscais  de longo prazo.
O dólar já vem de longo processo de perda de  valor perante outras moedas e commodities, e isso expressa a doença que  se abate lentamente sobre a economia americana. As análises sobre as  perspectivas deste país oscilam a cada dia ao sabor de dados sobre  pedidos de desemprego, construção de novas moradias, produção  industrial, inflação, etc. Fato é que a reação aos fortes estímulos  dados desde 2008 produziram efeitos pífios e os déficits fiscais  passaram de 3% do PNB em 2008 e poderão atingir 11% neste ano, e a  dívida sobe de forma ameaçadora, indicando claros riscos em seu  pagamento.
Para agravar esse quadro a elevação dos preços do  petróleo e outras commodities subtraem o poder aquisitivo dos  americanos, com reflexos negativos sobre o consumo que representa 70% do  PIB do país. Isso afeta o crescimento econômico, a arrecadação e eleva o  déficit fiscal.
Parecem esgotados os instrumentos monetários  para tirar o país da crise. A forte injeção de dólares feita pelo Fed  (banco central americano) e os juros negativos não conseguiram estimular  o consumo. É incerto se terminará em junho a escalada da injeção de US$  600 bilhões. Essa elevação da liquidez já dá sinais de problemas com a  inflação, que começam a aparecer no front de preocupações do Fed. E nada  mais potente para retirar o poder aquisitivo do americano do que a  inflação. 
A forma que seria possível para romper com esse  agravamento é a ampliação das exportações e contenção das importações,  para gerar empregos suficientes para tirar da letargia o mercado  interno. Mas não é isso que vem ocorrendo no nível necessário, pois a  disputa no mercado internacional cresceu fortemente como consequência da  crise de 2008.
Face a esse quadro, o melhor para o Brasil é  apostar as fichas da saúde econômica e financeira naquilo em que somos  bons: alto potencial de mercado interno inexplorado. Assim, é bom  repensar as políticas do pé no freio, que podem fragilizar o País aos  trancos que poderão vir de fora.
.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Nenhum comentário :
Postar um comentário
Veja aqui o que não aparece no PIG - Partido da Imprensa Golpista