terça-feira, 2 de abril de 2019

Nº 25.339 - "As 10 táticas de manipulação de Chomsky: esquerda refém das provocações de Bolsonaro"


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02/04/2019

As 10 táticas de manipulação de Chomsky: esquerda refém das provocações de Bolsonaro


Do Cinegnose - 01/04/2019  Wilson Roberto Vieira Ferreira



por Wilson Roberto Vieira Ferreira

Principalmente a partir das manifestações de rua em 2013, a esquerda perdeu completamente o controle da sua agenda. Desde então, enquanto permaneceu no governo limitou-se a agir reativamente controlando danos. E fora do poder, limita-se a deixar o sangue subir à cabeça e reagir a cada provocação do clã Bolsonaro, aceitando entrar no jogo da guerra semiótica criptografada. Sem conseguir criar uma agenda própria. A recente foi a ordem de Bolsonaro para as casernas comemorarem o golpe militar de 1964 como uma “revolução popular” – escandalizada, esquerda vai às ruas como se quisesse salvar a própria biografia, enquanto o País marcha para “reformas”, uberização do trabalho e extermínio do futuro de uma geração inteira. O linguista Noam Chomsky diria que a oposição está caindo na primeira tática de manipulação: a Distração. Para depois, por em prática as outras nove táticas de criação de falsos consensos na opinião pública.

                  Escrito pelo linguista Noam Chomsky e o crítico de mídia Edward S. Herman, o livro “A Manipulação do Público” continua bem atual. Nessa obra, são detalhadas as dez técnicas de criação artificial de consenso na opinião pública. 




São elas: Distração (desviar a atenção daquilo que é realmente importante); Método Problema-Reação-Solução (criar uma situação de terra arrasada para impor medidas de suposta solução); Gradação (aplicar medidas impopulares de forma gradativa e imperceptível); Sacrifício Futuro (é mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que imediato); Discurso Infantilizado (tratar a opinião pública de forma afetuosa ou humorística); 

Sentimentalismo e Temor (apelar para o medo e emoção para impedir uma resposta racional ou crítica; Valorizar a ignorância (dar espaço na mídia pessoas medíocres e ignorantes para que o estúpido e o vulgar sejam um exemplo para os mais jovens); Desprestigiar a inteligência (apresentar na produção audiovisual o cientista como vilão e o intelectual como pedante); Incentivar introjeção da culpa (incutir a culpa no indivíduo para dividir a sociedade entre vencedores e perdedores); Monitoramento (pesquisas de opinião e as atual mineração de dados e análises psicométricas em redes sociais para controle de opinião pública). 

É claro que cada uma dessas técnicas é diariamente colocada em ação dos telejornais aos programas de entretenimento – por exemplo, nessa segunda-feira o telejornal da Globo “Bom Dia (?) Brasil” destacou uma matéria sobre como o fato de casais esconderem seus gastos de cartão de crédito para o parceiro prejudica o controle das finanças familiares, criando impacto na própria economia nacional. Num inacreditável exemplo de falácia lógica que, lá na Antiguidade, Aristóteles acusava os sofistas:  reductio ad absurdum, redução ao absurdo ou efeito lógico “bola de neve”, para incentivar a introjeção da culpa no incauto brasileiro pela crise econômica sistêmica.

Introjeção da culpa para criar uma sociedade de vencedores e perdedores



Esquerda hipnotizada

Porém, o atual clã familiar que ocupou o governo prima pela tática da Distraçãoao ocupar a pauta midiática com “caneladas”, provocações, bravatas, arroubos de crenças religiosas misturadas com negócios ministeriais etc. 

Até aqui, OK! É até previsível que um governo, cuja pauta político-econômica (as “reformas”, cuidadosamente escondidas da opinião pública durante a campanha eleitoral) seja impopular, utilize-se de figuras bizarras e tragicômicas para compor os anti-ministérios (ministérios que se voltam contra si mesmos como Família, Educação e Trabalho) para distrair grande mídia e opinião pública.
Mas o preocupante é quando a oposição parece hipnotizada por essa pauta e passa a responder reativamente a cada provocação, não só retro-alimentando mas também dando pertinência pública aos temas.

Nos últimos dias acompanhamos como a grande mídia e a mídia alternativa deram espaço a mais uma provocação do capitão da reserva: a ordem do presidente Bolsonaro para que fosse comemorado neste 31 de março os 55 anos do golpe militar de 1964. Deveriam ser dadas as “comemorações devidas” a uma “revolução” que supostamente teria libertado o País “do pior”, e que, na época, teria contado com “amplo apoio popular”.

E toca a judicialização do tema, aliás, como de costume para qualquer coisa no País: o MPF manifesta-se, juíza proíbe a comemoração atendendo a um pedido de liminar apresentado pela Defensoria Pública... E, enquanto isso, Bolsonaro fala que não é “comemoração”, mas “rememoração”...

Amigo de caipirinhas

Como de costume, repórteres vão atrás da espécie de “presidente-em-exercício”full-time, General Mourão (alçado à condição de reserva nacional de racionalidade), para ouvir dele que os “eventos” seriam “intramuros”... 

TV Globo deu razoável espaço aos protestos em todo o País, nos quais foram lembradas as mortes, torturas e desaparecimentos de pessoas na ditadura. Até a Rádio SulAmérica Trânsito 92.1 FM, sempre tão reticente em relatar os motivos dos protestos que ocasionalmente atrapalham o trânsito, dessa vez foi didática em explicar os motivos das manifestações em São Paulo, na Avenida Paulista e Parque do Ibirapuera.

Bolsonaro acende o rastilho e se manda para um tour em Israel, ao lado do seu amigo de caipirinhas, o Primeiro-Ministro de Israel Netanyahu. Enquanto a mídia alternativa e a esquerda gritam o slogan “Para que não se esqueça, para que não se repita!”, para relembrar, uma a uma, as atrocidades dos governos militares. Como reação a uma suposta tentativa de “reescrever a História”.

Qual a surpresa? Os militares sempre comemoraram “intramuros” a “revolução de 1964”. A questão é que as “bolsonarices” são muito provocativas e fazem subir o sangue da esquerda.



Efeito Pinball

Principalmente desde as grandes manifestações de 2013, a esquerda perdeu definitivamente o controle da própria agenda, resultando no efeito potencializador de bombas semióticas que esse humilde blogueiro chamou, na época, de “efeito Pinball”:

“Bolinhas são seguidamente disparadas: a agenda do mensalão; depois o caos aéreo; a descontrolada inflação do tomate; as manifestações de rua do “gigante que acordou”; o chamado “terceiro turno”; e atualmente o “escândalo do petrolão” e a iminência de um impeachment da presidenta eleita. 
Elas rebatem aleatoriamente nos pinos e flips criando ressonância, recursividade, loopings: numa estratégia reativa de controle de danos o Governo é obrigado a ser o interlocutor, dar respostas em notas aqui e ali. O que dá mais legitimidade ao jogo... e as bolas batem e rebatem... tlim!... tlim!... tlim!.... Pontos são somados num ciclo vicioso infernal” -  clique aqui.


Diante dessa guerra semiótica criptografada (isto é, mensagens cujo protocolo de transmissão embaralha o conteúdo, não deixando claro para o público o significado real da mensagem, que fica apenas na superfície) estamos obviamente diante da primeira tática descrita por Chomsky e Herman: a distração.

Forma de comunicação indireta: o jogo clã Bolsonaro-grande mídia não está atacando a esquerda. Está chamando-a para a sua agenda, o seu jogo, para fazer parte dessa tática diversionista de desviar a atenção da opinião pública para os problemas mais sérios nesse momento – o lento e progressivo desmonte das garantias sociais. 

Por exemplo, cotidianamente estudantes encontram entraves burocráticos e quedas de sistemas para conseguirem crédito educativo, como o Fies. Quando conseguem, dados e crédito não chegam às agências bancárias.

Ao mesmo tempo, remédios desaparecem e estabelecimentos são excluídos do Farmácia Popular.

Enquanto isso, milhões de desempregados marcham para a uberização – contratos intermitentes, flexíveis e sem proteção trabalhista, precarização, desregulamentação do trabalho, salários miseráveis e patrões invisíveis escondidos por plataformas tecnológicas.


O Uber está tão entusiasmado com o Brasil que pretende testar seu táxi voador no País (o primeiro país fora dos EUA), o projeto de táxi aéreo chamado UberAIR – imaginem o assustador quadro de trabalhadores precarizados sendo lançados aos céus e voando sobre nossas cabeças... – clique aqui.
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Tudo isso sem falar nas “reformas” que pretendem exterminar o futuro de uma geração inteira. 

Essa preocupação equivocada da esquerda em ficar reativamente paralisada à pauta alimentada todo dia pelo clã Bolsonaro é também criticada pelo colunista Joaquim Xavier: ao invés de pensar no futuro ou no presente, cai na armadilha semiótica da distração e prefere falar do passado:

Os oposicionistas de plantão, mesmo os bem-intencionados, parecem pensar diferente. Gritam histericamente contra a apologia da ditadura morta, porém é sonolenta quando se trata da ditadura de fato em curso. A olhos vistos, está em marcha um movimento de liquidação do Brasil para transformá-lo em Brazil. Mas não se vislumbra uma mobilização à altura deste risco. Mais cômodo falar do passado. – clique aqui..

Distraída, hipnotizada e com o sangue subindo à cabeça a cada provocação do capitão da reserva e seus pitbulls, os oposicionistas parecem muito mais preferir salvar suas biografias do que ocupar a esfera pública (ruas, praças e avenidas) e a opinião pública através de uma contraguerrilha semiótica capaz de criar uma agenda própria.

Distraindo a oposição, desvia a atenção da própria opinião pública. Para quê? Para calmamente colocar em prática as outras nove estratégias de manipulação apontadas por Chomsky e Herman: gradativamente criar uma situação da terra-arrasada para sacrificar o futuro através da culpa e do medo. Infantilizando a opinião pública por meio das “caneladas” e “mitagens” de Bolsonaro e seus asseclas enquanto as redes sociais são monitoradas pelos algoritmos de Steve Bannon e a psicometria de Michal Kosinski.



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Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. 
Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, organizado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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