12/08/2015
Lacerda e Aécio: o Corvo e o Abutre, Maurício Dias
Tijolaço - 9 de agosto de 2015 | 10:52


Cresci vendo o que era o “lacerdismo”: as mal-amadas do subúrbio onde cresci, os vizinhos emproados, arrotando peru pelo frango que comiam, os carolas – gente tão “boa de coração e cristã” que olhava e falava com nojo dos “filhos da desquitada” que ralava como uma condenada para criá-los e se condenava à solidão por isso.
Uma, especialmente, era mulher do importantíssimo “administrador da Vila Kennedy, uma galáxia distante na Zona Oeste para onde havia sido removida parte dos pobres que enfeavam a Zona Sul com sua “obscena” miséria.
Mas é uma, mais que todas, a marca que trago desta gente, desconcertante.
Era um domingo ou feriado e o velho José Nogueira, meu avô, me levara a passear no Méier, bem pequeno ainda, talvez com quatro ou cinco anos.
Carlos Lacerda estava inaugurando um trecho de uma via, a Radial Oeste, na verdade um alargamento da velha Rua Hermengarda, nome então ainda comum, de gente, que saía dali para o Lins e o Engenho Novo .
Homem de pouca instrução, de muito trabalho e de grande severidade, parou por um instante junto à aglomeração e viu o homem que havia “matado” Getúlio.
E da boca onde jamais ouviria de novo um palavrão, saiu entre os dentes o “Corvo filho da…” que sobrevive nos ouvidos do guri assustado, mais de 50 anos depois.
E meio século adiante, na idade em que ele tinha então, crispo os dedos e resisto a escrever como ele murmurou, naquelas lonjuras do passado, tristemente presente hoje.
Deixo que Mauricio Dias, em ótimo texto na CartaCapital, muito gentilmente, o faça por mim.
Aécio, Lacerda opaco
Maurício Dias
Caso os integrantes da base dessa pirâmide, formada por uma imensa maioria de pobres e remediados, passem nas imediações do movimento, vai ver tudo com certa perplexidade. Quem sois? Há diferenças marcantes entre o Brasil de cima e o Brasil de baixo. Ao contrário dos manifestantes, os passantes ocasionais não terão ódio nos olhos. Estarão mais preocupados com a crise econômica, para eles traduzida em inflação e desemprego, precedente à crise política forjada no oportunismo. Essa marcha será um marco. Lance importante para os objetivos presidenciais de Aécio Neves. A única chance dele é a queda de Dilma. Imediatamente.
Os movimentos sociais não se formam por combustão espontânea. Por isso ele, derrotado na eleição presidencial de 2014, tornou-se porta-voz político da marcha anunciada, parte do golpe contra Dilma camuflado pelo mecanismo do impeachment.
Nos últimos dias, na discussão desse tema teve sempre presente o senador Aécio Neves, como ocorreu no encontro realizado na casa do senador tucano Tasso Jereissati. “O clima era de conspiração”, revelou um dos presentes ao jornal O Globo, de 7 de agosto. Aécio estava lá. Quase tudo se assemelha a uma repetição farsante do movimento civil-militar de 1964 que depôs o presidente João Goulart.
Carlos Lacerda, governador do extinto estado da Guanabara, era a expressão máxima da oposição naquela época. Há uma grande distância no tempo. A distância, porém, não supera a presença da ambição pelo poder a qualquer preço, comum a Lacerda e a Aécio.
Aécio Neves acredita que um incêndio no País pode levá-lo à Presidência da República. Pós-golpe, Lacerda, candidato antecipado à eleição para presidente, marcada para 1965, pensava o mesmo e acabou cassado. Golpes e revoluções costumam engolir seus líderes. Há também diferenças entre a composição dos dois movimentos, distantes um do outro. Os militares, atuantes em 1964, estão nos quartéis. Como convém. No plano pessoal, existem também diferenças entre um e outro.
Lacerda era apelidado de “Corvo”. Alguém, se quiser, pode batizar Aécio de “Abutre”. Essa ave, como se sabe, sacia-se da carniça. Sobrevoa a vítima. Sangrar foi, até agora, o comportamento da oposição diante de um governo sufocado pela impopularidade. Assim, o Abutre prepara o ataque final. No plano pessoal, Lacerda emergiu como orador culto e brilhante. Aécio, ao contrário, é opaco e carece de maiores recursos intelectuais.
Aécio não irá à passeata. Acompanhará pela televisão. Vez por outra, olhará os passantes do alto da cobertura onde mora, nos limites do Leblon e Ipanema, bairros elegantes da zona sul carioca. Estará preocupado em medir o resultado da marcha. Ele não meditará sobre a fantasmagórica questão que assusta os golpistas no momento do golpe: “Sempre se sabe como começa, e nunca como termina”.
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