06/02/2012
Malvinas são mesmo argentinas
Do Direto da Redação - Publicado em 05/02/2012Mário Augusto Jakobskind*
Enquanto as mais diversas mídias de mercado continuam a bombardear Cuba com antigos preconceitos da época da Guerra Fria, no Atlântico Sul o velho colonialismo de um país, o Reino Unido, com nostalgia de um passado de dominação forçada segue com toda a força. É o que revelam as últimas notícias sobre o enclave das Malvinas, área onde foram descobertas riquezas petrolíferas.
David Cameron, o conservador herdeiro de um país falido e que se tornou um apêndice dos Estados Unidos na Europa, usa de retórica ao atacar a Argentina como nos velhos tempos. Teve a ousadia de atribuir ao governo de Cristina Kirchner “vocação colonialista”. É o tal fenômeno da transferência, pois é notório que apesar de hoje não ter mais terras de sol a sol, o ranço colonialista não foi abandonado, seja pelos Partidos Trabalhista ou Conservador britânico.
Seguindo a tradição, o governo britânico enviou modernos navios de guerra e de quebra está por lá nas Malvinas o príncipe Williams para treinar pilotagem de helicóptero. Os britânicos ocupam desde o século XVIII terras que pertencem aos argentinos e alegam primariamente que os habitantes das ilhas apoiam a dominação.
Há quase 30 anos houve uma guerra mal conduzida pelos militares argentinos, que se aproveitaram de uma causa justa para manterem-se no poder. Madame Margareth Thatcher, depois de enviar navios de guerra com ogivas nucleares aproveitou o embalo para se fortalecer internamente.
O tiro dos militares argentinos então saiu pela culatra, precipitando o fim da ditadura. Sabem o motivo? Os militares tinham se especializado em torturar argentinos opositores e não souberam enfrentar as forças de ocupação, haja vista, por exemplo, o então capitão Alfredo Aziz, o Anjo da Morte, que literalmente se borrou quando foi preso.
A derrota dos argentinos não significou a desistência de o país retomar as terras roubadas pelo colonialismo britânico. Hoje, o primeiro-ministro David Cameron usa argumentos que não resistem a menor análise para justificar a continuidade da dominação da área que os britânicos denominam Falklands.
A América Latina de 2012 é bem diferente daquele de abril de 1982 quando da guerra das Malvinas. Os que se colocavam mecanicamente contra a Argentina por estar o país sob o jugo de uma ditadura cruel não podem mais repetir a tese. Hoje, os governos democráticos do Mercosul - Brasil, Uruguai, Paraguai – e demais do continente latino-americano têm a obrigação de cerrar fileiras em defesa intransigente da Argentina, felizmente vivendo na plenitude democrática.
É preciso mostrar ao mundo e as potências que utilizam as mesmas táticas coloniais de sempre que a Argentina não está só em sua exigência de retomada das Malvinas.
Em 1982, ignorando solenemente a doutrina segunda a qual os países americanos sofrendo incursões militares de fora da região devem ter a solidariedade e o apoio integral de todo o continente, o então governo dos Estados Unidos (Ronald Reagan) ficou ao lado do colonialismo do Reino Unido.
Hoje, sob o governo de Barack Obama, os EUA defendem a mesma posição de antes, até porque necessitam do Reino Unido para incursões do gênero colonial como as ocorridas no Iraque, no Afeganistão e mais recentemente na Líbia, país onde os Médicos Sem Fronteira decidiram sair porque em várias cidades não adiantava nada a sua presença. É que, segundo os Médicos Sem Fronteira, depois de medicados os líbios vinculados ao regime deposto voltam às prisões para serem torturados e voltam a ficar em precárias condições de saúde.
Desta forma que os EUA, Reino Unido, França, Itália, Qatar e demais países do Golfo estão trazendo a democracia no país do Norte da África.
Em relação a Cuba, a mídia de mercado voltou suas baterias contra o regime cubano. E daqui para frente os estereótipos de sempre retornam com toda a força, sobretudo pelo fato de no próximo mês de março a ilha caribenha receberá a visita do Papa Bento XVI, que, convenhamos, nem progressista é.
No final de dezembro, em discurso proferido no encerramento do ano legislativo (Assembleia Popular), o Presidente Raúl Castro anunciou a promulgação de 2.900 indultos de presos com mais de 60 anos e que não cometeram delitos que provocaram mortes. Entre os indultados se encontravam cubanos condenados pela Justiça por conspirarem contra o Estado e que já cumpriram parte das penas ou que tinham problemas de saúde. Não houve praticamente divulgação a respeito.
Quanto à blogueira Yoani Sánchez, quem conhece minimamente Cuba sabe perfeitamente que ela fala por ela mesma e é alimentada por segmentos mais radicais de direita do exílio cubano. É absolutamente sem sentido reproduzir, sem checar, como fez O Globo, a afirmação da blogueira de que “nas ruas de Havana os cubanos comentam que Dilma veio a Cuba com a carteira aberta e os olhos fechados”.
Qualquer um que visite Cuba e perguntar nas ruas quem é Yoani Sánchez, que se intitula porta-voz dos cubanos, vai obter a resposta: mas quem é Yoani? Isso não impede de encontrar circulando por Havana e outras cidades pessoas descontentes com o regime cubano e até mesmo um taxista particular circulando tranquilamente com uma bandeirola estadunidense em seu veículo. E assim sucessivamente, embora a maioria dos que foram consultados por este jornalista apoiassem o governo, por entenderem perfeitamente que mesmo com todos os defeitos não aceitam o retorno a um tempo em que a ilha caribenha era um mero entreposto dos Estados Unidos.
Mas a blogueira prefere dizer que antes de 1 de janeiro de 1959, ou seja, antes do triunfo da revolução, havia em Cuba “liberdade de expressão”.
Por estas e muitas outras, entende-se porque Yoani Sánchez consegue tanto espaço pelo mundo afora e ganha tantos prêmios muito valorizados. E também porque o Instituto Millennium a convidou para escrever pelo menos de 15 em 15 dias em espaços da mídia de mercado do Rio e São Paulo e com direito a reprodução em jornais de outros Estados.
Independente da decisão do governo cubano de não conceder permissão da blogueira vir ao Brasil, a mídia de mercado aproveitaria da mesma forma a vinda para se voltar contra Cuba. Uma pergunta: quem financia Yoani Sánchez?
Mário Augusto Jakobskind. É correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
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