11/06/2017
“Verba volant, pecunia manent”. Uma carta ao boi traidor
Por Fernando Brito
À moda e sem o talento de Veríssimo, com suas cartas da Dorinha:
Senhor Joesley,
“Pecunia nunc mala est”
Por isso lhe escrevo, claro que anonimamente, posto que, falasse, decerto gravar-me-ia e a verba (do latim as palavras, porque a outra esvaiu-se), non volant.
Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso qualificar a sua deslealdade.
Deslealdade ao código mais antigo e respeitável que Constituição Federal, o da honra entre ladrões.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança do senhor e de seus asseclas em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu negócio.
Voei em seu avião, deixei que seus modos ousados de açougueiro afluente oferecessem as rosas da cupidez à recatada. Ruborizei-me, claro, como em meus mui talentosos versos: De vermelho/Flamejante/Labaredas de fogo assomaram-se-me às faces (abro um parênteses para esclarecer que labaredas de fogo é licença poética e não pleonasmo, como sua bovina convivência di-lo-ia).
À minha natural discrição conectei aquela derivada da cobiça que nos é comum..
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
Jamais usei consigo os métodos do Calado de Curitiba, ou o linguajar chulo de outros, imundo como o pó de Minas, mas caí na esparrela, como o dinheiro caiu no Perrela. (é incontida minha atração por rimas ricas, perdoe-me)
Cedi ao senhor o meu subterrâneo acesso, que noutros palácios d’antanho apenas aos amantes e conspiradores se franqueava.
Desta confiança, porém, valeu-se sua alma rastaquera para, sordidamente, gravar-me, o que só não foi pior por conta de meu natural recato monosilábico. Tanto que, frequentemente, há quem me tome como decorativo, de tão silencioso.
Contido, disse apenas “tem que manter isso”, não o “vai, Tigrão” do seu linguajar.
Contava, decerto, com minha ruína, planejada e desejada por aquel’outro Gato Angorá, que me ruge, enquanto o outro mia.
E não esperava que meu capanga lá do Mato Grosso pudesse me blindar.
Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o senhor amargar-se-á profundamente do que fez.
Sei que a senhor não teve confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã, quando o levarmos ao matadouro, o descarnarmos, porcionarmos, fatiando, o seu império e – perdoe-me a rudeza açougueira – usarmos suas tripas para fazer linguiça.
Vingativamente,
O Anônimo do Tietê
PS: em homengem piedosa à sua ignorância, esclareço que a epígrafe desta missiva, “Pecunia nunc mala est” , não é “nunca ponha o dinheiro na mala”, mas que “o dinheiro agora é ruim”.
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