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O Outro Lado da Notícia - Postado em 18 de fevereiro de 2010 por osvaldobertolino
Por Marcio Pochmann, no site Fiec online
O esgotamento do projeto desenvolvimentista imposto pela crise da dívida externa no início da década de 1980 não tornou o País órfão de um modelo econômico e social por muito tempo. A partir do final dos anos oitenta do século passado, o Brasil internalizou gradualmente o modelo neoliberal.
O entendimento de que o Estado faria parte apenas dos problemas existentes levou à formulação de diversas profecias que não foram realizadas com o passar dos anos. Exemplo disso foi o próprio comportamento econômico durante os anos de hegemonia neoliberal. Pelo lado internacional, constatou-se que a opção pela inserção passiva e subordinada gerou grande fragilidade externa. Cada instabilidade externa produzia internamente a interrupção da expansão produtiva e enormes consequências sociais negativas.
Com isso, a variação média anual do Produto Interno Bruto (PIB) foi de apenas 2,3%, favorecendo a financeirização da riqueza como medida de compensação crescente à tendência de baixa na taxa média de lucro do setor produtivo. Assim, coube ao Estado a submissão plena ao regime de ajustes fiscais permanentes por meio do contingenciamento ao gasto público, da privatização do setor produtivo estatal e da elevação da carga tributária.
A opressão do gasto público se revelou necessária à eficácia da macroeconomia financeira, responsável pela transferência média anual de mais de 6% do PIB na forma de pagamento de juros aos segmentos rentistas. Mas o ajuste fiscal permanente trouxe, em consequência, o desajuste social, uma vez que as regiões metropolitanas mantiveram a taxa de pobreza acima de 2/5 da população, e mais de 1/3 dos brasileiros submetidos à condição de baixa renda.
Ao disciplinar 19% do PIB para o gasto social, a experiência neoliberal comprimiu a expansão real do salário mínimo, bem como manteve menos de 14% da população receptora de medidas de garantia mensal de renda. A desigualdade na renda do trabalho manteve-se próxima de 0,6 no índice de Gini, enquanto a participação do rendimento do trabalho ficou abaixo de 40% da renda nacional.
Nos últimos anos, contudo, o Brasil passou a acusar importantes sinais de transição para o modelo social-desenvolvimentista. A identificação básica de que o Estado faz parte das soluções dos problemas existentes não implicou reproduzir os traços do velho modelo nacional desenvolvimentista vigente entre as décadas de 1930 e 1970. Pelo contrário. De um lado, pela reafirmação da soberania nacional, o que exigiu uma profunda reorientação da inserção internacional, com a passagem da condição brasileira de devedor para a de credor de organismos multilaterais (FMI), a formação de significativas reservas externas e o redirecionamento do comércio externo e cooperação técnica para o âmbito das relações Sul-Sul. Assim, as crises externas deixaram de expor a sociedade brasileira às mesmas dificuldades observadas durante a vigência passada do modelo neoliberal.
De outro lado, os compromissos firmados com o avanço do sistema produtivo permitiram a expansão econômica nacional anual na média de 4,2%, bem como a queda da despesa pública com a financeirização da riqueza para quase 2 pontos percentuais do PIB inferiores aos vigentes durante o predomínio do modelo neoliberal. Com isso, houve tanto a ampliação no gasto social para 22% do PIB (quase 3 pontos percentuais a mais do que nos anos 1990) como o atendimento de mais de 1/3 da população brasileira com mecanismos de garantia mensal de renda.
O resultado social se mostrou evidente, com a queda na taxa de pobreza para menos de 1/3 da população e a desigualdade de renda do trabalho abaixo de 0,40 do índice de Gini nas regiões metropolitanas. A recente volta da mobilidade social, que inclui no consumo de massa milhões de brasileiros e transforma a antiga figura da pirâmide social numa nova, parecida com uma pera, mostra-se fruto do avanço do ainda incompleto social-desenvolvimentismo. Os próximos anos, se este modelo for mantido e aprofundado, poderão indicar o quanto pode ser reduzida a distância que separa o país real daquele que os brasileiros acreditam realmente que possa vir a ser.
*Marcio Pochmann - Professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas. Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)
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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010
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