17/12/2017
O Brasil a caminho de uma nova ditadura, por Sergio Saraiva
Por Sergio Saraiva
Mais que uma luta de classes, temos no Brasil uma guerra entre dois povos que ocupam o mesmo território. Não sendo capazes de formar uma única nação, por irreconciliáveis, é inevitável um governo de dominação de um povo sobre o outro.
Em setembro de 2017, ficamos sabendo por um relatório da ONG britânica Oxfam que os 5% dos brasileiros mais ricos detém 50% da riqueza do Brasil. Restando para os 95% da população dividirem os outros 50% restantes.
Assim, uma fração de 10 milhões de pessoas detém tanta riqueza quanto os outros 190 milhões de brasileiros somados.
Trata-se de uma excrecência. Na prática trata-se de um país à parte - o país ”Brasil dos ricos”. O outro Brasil, por exclusão, é o “Brasil dos pobres”.
Não é ocioso questionar sobre quem são os habitantes do ”Brasil dos ricos”.
Imaginaria se ser os grandes empresários que com risco e audácia mais trabalho duro ganharam fortunas. A tão propalada meritocracia. Talvez até eles existam. Mas, no país dos ricos, existem mais pessoas do que os seis brasileiros que juntos concentram tanta riqueza quanto a soma dos 100 milhões de brasileiros mais pobres. Não haveria um país de 6 habitantes.
A maior parte do que chamamos de classe média mora na verdade no “Brasil dos pobres”. Ainda que comungue os valores do “Brasil dos ricos”. O domínio cultural de uma país hegemônico sobre outros países periféricos sempre se dá pela cooptação da “elite” desses países. Não seria diferente nos casos dos dois Brasis.
Nos 10 milhões de habitantes do “Brasil dos ricos” moram uma parte significativa dos que têm renda mensal medida com 5 dígitos ou mais. E um grupo mais específico – o dos que têm renda mensal de seis dígitos acima. E nesse estrato está a cúpula do Poder Judiciário e do Ministério Público.
É no “Brasil dos ricos” que está, por óbvio, o poder real. No outro país, o “Brasil dos pobres”, no entanto, está o poder democrático.
A partir daí ocorre a divisão do Brasil em dois países irreconciliáveis. O “Brasil dos pobres”, que detém o poder democrático, faz os poderes Executivo e Legislativo. O “Brasil dos ricos” se faz representar pelo poder Judiciário e pelas forças de repressão que possa subordinar.
E essa é a questão primordial do momento atual em que vive o Brasil. Momento que se inicia com a chegada de Lula ao poder e que deverá viver seu instante crucial no seu provável impedimento às eleições de 2018.
Mais que uma luta de classes, temos no Brasil, uma guerra entre dois países irreconciliáveis por um mesmo território. Essa guerra está em pleno desenvolvimento, neste instante.
Isso porque, irreconciliáveis do nascimento à morte, há um único momento e local onde os habitantes dos dois países se tornam iguais: nas eleições, diante da urna, cada homem vale exatamente a mesma coisa, um voto, independentemente de seu saldo bancário.
A reação ao resultado das eleições de 2014 – a quarta vitória consecutiva petista - é um ponto de ruptura. Uma declaração de guerra do “Brasil dos ricos” contra o “Brasil dos pobres”.
Logo depois dessas eleições, chegou-se a apresentar o Brasil dividido como que realmente em dois países: Brasil do Sul e Brasil do Norte. Mas a ilusão separatista não resolve a questão dos dois brasis. A divisão não é entre dois Estados, mas entre duas nações compartilhando o mesmo território.
O clima de beligerância e ódio vivido a partir de então não é episódico é próprio de uma guerra. O golpe de 2016 é o que é: uma batalha vencida pelas forças do “Brasil dos ricos”.
Ocorre que a divisão do Brasil é real, mas não é institucional. Assim, para existir como país entre outros países, o Brasil necessita realizar consultas periódicas e simultâneas aos dois povos – as eleições presidenciais. Esse é o flanco fraco do “Brasil dos ricos” do poder real. Só pode se legitimar frente ao mundo, através dessa concessão ao “Brasil dos pobres” do poder democrático.
Logo, uma nova batalha se aproxima. As eleições de 2018.
Após um período de atordoamento, a resistência do “Brasil dos pobres” passa a se reorganizar em torno do seu líder natural – Lula.
Em uma guerra real, esse líder seria eliminado. Em uma guerra simbólica, esse líder deve ser inviabilizado.
Os generais do Judiciário capturarão Lula. Lula deverá ser preso. Não pode participar das eleições nem como cabo eleitoral. Já está consolidado que Lula tem capacidade de levar um candidato apoiado por ele para o segundo turno. O “Brasil dos ricos” não tem um candidato viável, por isso, Lula deve ser preso. Livre em campanha pedindo votos fará o presidente.
O que ocorre com Lula preso? Uma revolta popular? Não creio.
Mas a guerra surda entre os dois Brasis ganhará um mártir e prosseguirá. E Lula fará a presidência. Não imagino Bolsonaro como caudatário do voto interditado do “Brasil dos pobres”. Ainda que ele tenha forte aceitação por parte do único poder que se basta por si próprio – o militar – e até por isso, não há solução.
Ao patrocinar o Golpe de 2016 o “Brasil dos ricos” cometeu um erro fatal. O governo petista teria de perder a confiança do “Brasil dos pobres” para que o “Brasil dos ricos” impusesse democraticamente um seu representante. E isso só viria se o povo pobre se sentisse traído por Lula.
Uma década de acusações não retiraram de Lula a condição de líder – ele não traiu seu povo. Sua inviabilização eleitoral e sua prisão não inverterão o resultado de 2018. Mas inviabilizarão o governo, qualquer que seja, no qual Lula não esteja de alguma forma presente. Não haverá legitimidade. Bastou dois anos de um governo ilegítimo para destruir a economia do Brasil. Como manter o país até 2022 com mais um governo sem legitimidade?
Não importará mais o resultado das eleições.
Não sendo capaz de se legitimar nas urnas, por não deter o poder democrático, logo após a prisão de Lula, ao perceber que qualquer vitória nas eleições de 2018 é inviável, só restará ao “Brasil dos ricos” a dominação do “Brasil dos pobres” instituindo um governo de ocupação.
Virá uma nova ditadura.
PS: Oficina de Concertos Gerais e Poesia: um otimista é alguém mal informado.
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