Paulo Nogueira
Há uma clara tentativa de inflar na marra os números das manifestações de protesto deste domingo.
Procuro analisar com alguma objetividade, o que não é exatamente fácil no fragor destes dias.
O maior esforço de multiplicação veio, como previsto, da PM de Alckmin, saudado ontem como Ladrão de Merendas na Paulista.
A PM falou em 1,4 milhão de pessoas. (Note-se que a mesma PM que mata negros e espanca estudantes confraterniza, em selfies sorridentes, com defensores do golpe.)
Seria um número impressionante – se fosse verdade. O Datafolha, que tem uma imagem a zelar e muito mais experiência em medições, falou em um terço daquilo: 450 mil pessoas. (Depois houve reavaliação que chegou a 500 mil.)
Tirados os apaixonados, pouca gente mesmo entre os manifestantes hesitaria em ficar com o número do Datafolha se tivesse que escolher entre este e o da PM.
Então passemos para a próxima etapa. Como entender os 450 mil ou mesmo os 500 mil?
Para quem esperava mais de 1 milhão, talvez até 2 milhões, é decididamente um fiasco.
Fui editor de revistas por muito tempo. Suponha uma capa na Playboy de uma estrela de novela. Você, como editor, projeta vender entre 1 e 2 milhões. Vende 450 mil. Nos estertores, a venda chega a 500 mil.
Foi uma tragédia. Não adianta você dizer que é maior venda em dez anos, ou o que for. Você se estrepou.
Esta é uma lógica que vale para tudo. É ubíqua.
Deve-se acrescentar o seguinte: foi monumental a propaganda feita para levar as pessoas para as ruas.
A Globo se empenhou alucinadamente. Ela e todas as suas mídias. Logo no início do domingo, a GloboNews mostrava cenas do Brasil com os apresentadores dizendo, incessantemente, que aquele era um protesto contra a “corrupção” – e não pelo impeachment. Tudo ali se destinava a convocar os espectadores.
Como parte da propaganda, o pedido de prisão de Lula feito por procuradores de SP que acham que Engels é Hegel foi freneticamente utilizado pela mídia.
O pedido foi milimetricamente calculado para coincidir com os preparativos para os protestos. Numa de suas edições mais infames da história, o JN dedicou quase 20 minutos aos “crimes” de Lula.
Muito bem.
Como se tudo isso fosse insuficiente, a recessão empurrou muita gente para os protestos. É normal: você tende a colocar a culpa no governo quando perde o emprego, ou quando seus negócios não vão tão bem.
Mesmo assim, mesmo com a publicidade sufocante da mídia e o incentivo natural da recessão, a Paulista, segundo o Datafolha, recebeu 450 mil (ou 500 mil) manifestantes.
Está longe de ser um resultado espetacular. Tanto que agora pela manhã desta segunda uma hashtag forte no Twitter reunia inconformados com o Datafolha. Porque 450 mil é, dadas as circunstâncias, um número frustrante. Até o tempo ameno, sem chuva, ajudou.
Há, na mídia, uma falsa euforia, surgida da necessidade de manter a chama do golpe.
Um magnífico exemplo disso está nas postagens no Facebook do coordenador de jornalismo da Globo em Brasília, Esdras Paiva, em sua conta no Facebook.
“Seis milhões de brasileiros nas ruas num protesto sem bandeiras de partidos. E os petistas repetem o mantra do golpe (…). Alguém tem que avisar pra eles que esse papo de golpe não colou. (…) “Somos um país de coxinhas. Coxinhas golpistas.”
De onde Esdras tirou os 6 milhões, só Deus sabe. Mas é sabido que é mais difícil confiar na multidão que ele criou do que no levantamento da PM de São Paulo.
É preciso ser um incurável analfabeto político, ou um cínico golpista, para levar a sério o que a imprensa está publicando para encobrir o fato essencial: 13 de março esteve longe, muito longe, de ser o que seus incentivadores e organizadores sonhavam.
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