20/09/2010
Parece que foi ontem
Direto da Redação - 19/09/2010
Mário Augusto Jakobskind*
Os leitores mais velhos e os estudiosos da história brasileira vão se lembrar deste trecho de um documento histórico de 56 anos atrás, ainda muito atual:
“Mais uma vez as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e se desencadeiam sobre mim! Não me acusam, me insultam; não me combatem, me caluniam. E não me dão o direito de defesa” .
Trata-se do trecho inicial (acima) da Carta Testamento de Getúlio Vargas, tornada pública a 24 de agosto de 1954, quando ocorreu o desfecho de uma crise fabricada pela direita. Como agora, a direita se valia dos grandes proprietários dos veículos de comunicação para fabricar crises. Um deles, o histórico Roberto Marinho, com O Globo, que tem a UDN em seu DNA. O jornal da família Marinho transformou-se nesta véspera de eleição de agora em um partido político de direita, da mesma forma que a Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Veja nem se fala. Perderam a compostura.
Como se tudo isso não bastasse, o Clube Militar, que reúne a maior quantidade de golpistas de 64 por quilometro quadrado no Brasil, decidiu promover um seminário com o título “A democracia ameaçada: restrições à liberdade de imprensa”. E sabem quem serão os palestrantes? Merval Pereira, de O Globo, Antonio Carlos Pereira, mais conhecido como Tonico Pereira (TV Globo), Reinaldo Azevedo (Veja), Ives Gandra Martins (Opus Dei) e Valdemar Zweiter, integrante de uma família que sempre teve vínculos profundos com a clã dos Marinhos.
O Clube Militar em vários momentos históricos esteve dividido. Em 1954, uma parte estava de mãos dadas com o conspirador mor Carlos Lacerda, Na época da criação da Petrobras, parte dos associados apoiou a campanha do Petróleo é Nosso. Em 1964 reuniu os golpistas que levaram o país para uma longa noite escura.
Na sede do Clube há placas alusivas ao fato.
E, vejam bem, apoiaram todos os tipos de restrições à liberdade de imprensa. Muitos dos associados tiveram participação ativa nos anos de terror que se seguiram a derrubada do Presidente constitucional João Goulart. E agora, a diretoria, integrada por golpistas históricos, promove o tal seminário que conta com o apoio do Instituto Millenium, uma entidade semelhante a outras do gênero que foram criadas para dar respaldo aos golpistas de 64.
Por estas e muitas outras, a Carta Testamento do estadista Getúlio Vargas precisa ser mais do que nunca divulgada e conhecida, sobretudo pelos jovens que, felizmente, não viveram os tempos hediondos de censura, torturas e assassinatos de brasileiros que se insurgiam, de armas na mão ou não, contra o ideário defendido hoje por alguns associados do Clube Militar saudosos daqueles tempos de censura e repressão ao povo.
Quanto à saída da ministra Chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, fica patente como a direita está preocupada com as pesquisas que apontam a vitória de Dilma Roussef. Na verdade, está se fazendo um jornalismo ao estilo “Escola de Base”, ou seja, condenando alguém antes de qualquer investigação.
Se ela tivesse continuado no cargo, nesta altura os mesmos que hoje aproveitaram o embalo do anúncio da demissão e reforçaram o aspecto da “gravidade da crise”, estariam pedindo a demissão.
As denúncias naturalmente precisam ser investigadas com rigor, da mesma forma que é necessário levar em conta que alguns dos denunciantes, como, por exemplo, o “consultor” Rubnei Quicoli tem ficha corrida assustadora. Quicoli é um meliante que já esteve preso por receptação de mercadorias roubadas, posse de dinheiro falso e assim sucessivamente.
Mas para a mídia conservadora isso é de menos, pois o que interessa é caluniar e ampliar a denúncia como a única verdade.
E Verônica Serra, a filha do candidato da avenida Paulista? Muito estranho o procedimento dos jornais e televisões que praticamente silenciaram em relação às denúncias da revista Carta Capital que a incriminam na questão da violação do Imposto de Renda de 60 milhões de correntistas graças a um acordo obscuro entre duas empresas na gestão FHC, sob auspícios do Banco Central. Ou seja, os jornalões só publicam o que interessa aos proprietários que apoiam o candidato da avenida Paulista, José Serra.
A denuncite que tomou conta da campanha eleitoral, que a TV Globo faz questão de diariamente repercutir entre os candidatos, é a única arma da direita para tentar evitar que a eleição se defina no primeiro turno a favor de Dilma. Querem encurralar Dilma agora e depois no governo.
A última denúncia da Veja é cômica. De repente, não mais que de repente, aparece 200 mil reais na gaveta de funcionários da Casa Civil, resultado de suposta propina de um laboratório que produz vacina contra a gripe. A revista, ao estilo qualquer coisa serve, “denunciava” que o laboratório ganhou sem concorrência, quando se sabe que o mesmo era o único a fabricar a vacina. Isso é jornalismo de esgoto praticado pela família Civita.
Os “defensores da democracia” encastelados na mídia conservadora, no Instituto Millenium e no Clube Militar continuarão com os venenos de sempre, na base de mentiras e meias verdades. Independente do resultado das eleições que se aproximam o setor continuará agindo sob a capa falsa de defesa da democracia. Ou será que ainda há quem acredite na democracia desses setores? Já imaginaram o motivo pelo qual militares golpistas estão hoje tão preocupados com a liberdade de imprensa? Seria cômico se não fosse trágico.
Por isso, todo cuidado é pouco, porque os setores conservadores seguirão fazendo ruído e tentarão de todas as formas impedir que o Brasil siga adiante e consolide o processo de democracia participativa. Foi assim em 1954 e 1964 quando os “democratas” desde criancinha fizeram e aconteceram. O Brasil não merece mais isso.
Mário Augusto Jakobskind* -É correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
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