Jornal GGN - dom, 01/06/2014 - 06:00
- Atualizado em 01/06/2014 - 06:00
O Brasil é um país com várias camadas
arqueológicas. Tem o país dos novos mercados, das novas tecnologias, de
uma sociedade civil pujante, de novos movimentos nascendo ao largo das
velhas instituições, de novos direitos sociais sendo reconhecidos pela
sociedade e pelo Supremo Tribunal Federal, novas políticas sociais
amparando de minorias raciais a pessoas com deficiência.
Ao mesmo tempo, é o país anacrônico, com
manchas de trabalho escravo mas, principalmente, com um ranço
insuperável, fruto da herança coronelística da Velha República, da visão
de compadrio do "homem cordial", que não aceita nenhuma forma de
mediação dos poderes que não passe pelo seu poder de arbítrio.
Só isso para explicar as críticas
anacrônicas da parte da mídia aos decretos da Presidente da República
instituindo a Política Nacional de Participação Social, formalizando
diversos conselhos para ampliar a participação social nas políticas
públicas.
***
O Estadão soltou um editorial em que
acusa Dilma de pretender mudar a Constituição. "A participação social
numa democracia representativa se dá através dos seus representantes no
Congresso, legitimamente eleitos".
É o mesmo jornal que deblatera
diariamente contra os arreglos políticos, contra o loteamento de
diretorias de estatais para políticos, contras os pactos nefastos do
presidencialismo de coalizão, contra os vícios de democracia, que vende o
lema de que todo político é ladrão. De repente, o Congresso ganha
legitimidade para tudo, até para opinar em políticas que são
prerrogativas do Executivo e até para co-participar de governo.
***
Por acaso cabe ao Congresso definir
formas de implementação do Plano Nacional de Educação, as estratégias
para o Bolsa Família, as políticas para micro empresas, as políticas de
defesa do consumidor? É evidente que não. Quem define isso é o
Executivo, governo eleito diretamente pelo voto popular. E se o governo
abre espaço para a participação popular em políticas que afetam
diretamente as pessoas, não está aparelhando nada: está abrindo mão do
poder absoluto e ouvindo de forma institucionalizada a voz dos clientes
dos serviços públicos representantes diretos da sociedade civil.
Confundir esse movimento de abertura para a sociedade com aparelhamento do Estado é má fé.
***
A natureza desses conselhos consultivos é a mesma que deveria vigorar nas relações com o setor econômico. A ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial) tem várias câmaras setoriais, com a presença de empresários dos diversos setores incumbidos de fornecer subsídios para as políticas setoriais. Acaso foram taxadas de aparelhamento?
As críticas a se fazer é à baixa implementação das conclusões geradas por esses conselhos, não à sua criação.
***
O problema do jornal é que, com a
criação de conselhos de toda ordem - para a área social, econômica,
educacional - o governo passará a ouvir as demandas da sociedade
diretamente, e sem a intermediação de uma mídia que há muito tempo
perdeu a capacidade de mediar as necessidades da sociedade.
É importante recordar que as pessoas que
saíram as ruas em junho do ano passado reagiram contra o anacronismo de
todas as instituições, não apenas do Executivo, Legisdlativo e
Judiciário, mas também da mídia.
Que venha a nova democracia social!
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