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22/06/2014
Neoliberalismo pode recorrer a regime autoritário no Brasil
O QUÊ ESTARÁ EM JOGO NAS ELEIÇÕES
Publicado em 16 de junho de 2014
por Flavio Lyra (*), em seu blog, sugerido pelo Paulo Metri
A análise da realidade econômica e política da sociedade brasileira na atual fase mostra que as forças políticas que disputarão o controle do aparato estatal nas próximas eleições estarão divididas em torno de duas alternativas de condução do processo de desenvolvimento do país.
Por um lado, coloca-se a alternativa de prosseguir avançando com o processo de construção de um estado de bem-estar social, inaugurado no último governo de FCH e aprofundado nos governos de Lula e de Dilma, moldado na Constituição de 1988.
Por outro, coloca-se a alternativa de retomar e aprofundar a via do estado liberal-dependente, iniciada no governo Collor e aprofundada nos governos de FHC, reforçando o papel do mercado e da empresa privada — com subordinação crescente às grandes corporações internacionais — e deixando aos resultados do crescimento econômico determinado pelo mercado a solução dos problemas sociais.
A primeira alternativa vai requerer o aumento do grau de autonomia da sociedade brasileira frente ao processo de globalização da economia mundial, comandado pelas grandes corporações internacionais e pelo mercado, sem o que dificilmente será viável alterar a estrutura da economia na direção da re-industrialização, e do prosseguimento da redução das desigualdades na distribuição da renda.
O aumento do controle do estado pelas forças sociais representativas da classe trabalhadora é indispensável para resistir às pressões competitivas da economia internacional, que se manifestam através na perda de controle dos mercados de bens e serviços, da desnacionalização da propriedade, das transferências de recursos financeiros para o exterior, dos movimentos instabilizadores do capital estrangeiro e da crescente dependência tecnológica.
Os governos do PT, conseguiram inegavelmente, aproveitando a conjuntura internacional favorável derivada do surgimento da China como grande importador de produtos primários e mediante a posta em prática de uma política social proativa, reduzir a pobreza, elevar os salários reais da classe trabalhadora e impedir que a crise internacional, que tomou forma a partir de 2008, prejudicasse o nível de atividade e do emprego no país.
Os setores agro-extrativos reagiram bem às novas condições do comércio internacional, graças às vantagens comparativas de que goza o país e aos avanços tecnológicos que vêm sendo incorporados ao longo dos anos, aumentando substancialmente seu volume exportado e os índices de produtividade.
Em sentido contrário, a indústria de transformação, que já vinha fragilizada pelo processo de abertura econômica e de desnacionalização iniciado na década de 90, não se mostrou à altura dos desafios da acirrada competição internacional, passando a sofrer um grave processo encolhimento, com a perda de terreno no comércio internacional e no mercado interno.
Chega-se ao último ano do governo Dilma com forte desequilíbrio na conta corrente do balanço de pagamentos e grande dependência da entrada de capital estrangeiro; a taxa de câmbio mantem-se apreciada, prejudicando as exportações de produtos manufaturados, representando a única maneira de manter o fluxo de entrada líquida de capital estrangeiro que financia o déficit de transações correntes requerido para o financiamento de importações que ajudam a manter a inflação sobre controle; a taxa de juros, depois de ter sido reduzida nos dois primeiros anos de governo Dilma voltou a crescer, supostamente, para impedir que a inflação saia do controle; e o crescimento econômico desacelerou em relação ao observado no governo de Lula e agora rasteja, com taxas irrisórias.
Antes de qualquer coisa é preciso reconhecer que existem incompatibilidades entre o padrão de crescimento econômico que o país tem seguido e a construção de um estado de bem-estar social.
Os desequilíbrios que aí estão são fruto dessas incompatibilidades. As instituições econômicas e políticas atuais impedem maior avanço na construção de um estado de bem-estar social e os esforços nessa direção tendem a gerar graves desequilíbrios.
Fazem-se necessárias, por tanto, mudanças estruturais em nossa economia e em suas instituições políticas que as tornem adequadas a mudanças nas prioridades da economia, que precisam ser redefinidas com a contenção da demanda de bens e serviços de menor essencialidade, como é o caso dos automóveis, o aumento da produção de produtos básicos e serviços, especialmente alimentos, transporte de massa, educação, saúde e habitação.
Os investimentos na indústria e na infraestrutura econômica precisam ser expandidos urgentemente, mas as empresas privadas não se dispõem a investir, pois as aplicações financeiras continuam sendo um porto seguro e rentável para seus recursos.
A taxa de juros básica (Selic) precisa ser reduzida para melhorar a capacidade de financiamento de investimento do governo e as taxas de juros para o financiamento de bens de menor essencialidade aumentadas, de modo a desestimular novos aumentos do consumo.
Os gastos de divisas precisam ser mais seletivos e direcionados para os de bens e serviços de maior essencialidade. Os gastos no exterior com Turismo, por exemplo, precisam ser contidos. As remessas exageradas de lucros para o exterior precisam ser limitadas.
O sistema fiscal do país precisa ser profundamente alterado, de modo a reduzir seu caráter regressivo e torná-lo mais eficiente do ponto de vista do estimulo e direcionamento das decisões econômicas.
O Estado precisa recuperar sua capacidade de planejar e orientar a atividade econômica, deixando de ser um mero repassador de recursos para alimentar as decisões do setor privado, baseadas exclusivamente no mercado e sem maiores preocupações com os interesses do conjunto da sociedade.
O papel das empresas estrangeiras precisa ser redefinido. A propriedade exclusiva do capital as tornam insensíveis aos interesses do país em matéria de contribuição para geração líquida de divisas e capacitação tecnológica.
A alternativa que os candidatos de oposição estão em condições de levar adiante, não inteiramente reveladas em seus discursos, afigura-se como a mais nefasta possível para a maioria da população, pois baseia-se em medidas de austeridade que reduzam os gastos sociais do governo e no fortalecimento do papel do mercado na condução do processo de desenvolvimento.
O receituário neoliberal em que se baseiam as propostas dos opositores nada mais são do que a reprodução das fórmulas que levaram à profunda crise que tem afetado tanto os países centrais quanto os mais frágeis da União Europeia, acarretando a deterioração das condições de vida e dos níveis de emprego.
Os candidatos da oposição, pelos compromissos que os ligam à elite empresarial e aos segmentos mais conservadores da sociedade, não se propõem a realizar mudanças de fundo nas instituições econômicas e políticas do país, mas apenas a reforçar os aspectos mais nocivos da atual política econômica, em sua visão de curto-prazo, centrada na proteção dos interesses dos mercados financeiros nacional e internacional e na suposição de que o mero crescimento do PIB contribuirá para solucionar os graves problemas sociais do país.
Os desequilíbrios na área econômica que vem se acentuando decorrem do conflito entre o estado liberal dominante em nossas instituições políticas e econômicas e a forte presença no governo de forças populares que buscam impulsionar mudanças na direção de um estado de bem-estar social.
As forças políticas que defendem retorno ao estado liberal, diante do avanço das forças que buscam consolidar um estado de bem-estar social representam potencialmente um perigo para a democracia no país, pois poderão convergir para promover o retorno a um regime autoritário, de corte fascista, aliando-se a movimentos de direita que continuam muito vivos na sociedade brasileira.
Por sua vez, as forças políticas ligadas ao estado de bem-estar social, para sua consolidação, vão requerer de grandes mudanças nas instituições econômicas e políticas do país
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Tais mudanças passam por reformas que fortaleçam a representação política, incluindo a instituição de mecanismos amplos e eficazes no campo da participação direta da população no processo político.
As opções estão dadas. Não nos iludamos imaginando que é indiferente escolher qualquer um dos candidatos que aí estão. Os votos nas próximas eleições vão ser determinantes para os rumos do Brasil nas próximas décadas.
Se as forças políticas de centro-esquerda que estão à frente do governo não têm sido capazes de liderar todas as mudanças que o povo está a demandar, pior será se o poder voltar às mãos da elite empresarial e oligárquica que vê o povo como mero instrumento de acumulação de riqueza, mesmo que às custas de uma submissão crescente ao capitalismo destrutivo das grandes corporações.
Corporações essas que lutam dia e noite para estender seus tentáculos a todos recantos da terra, condenando os povos a viver em estado de guerra permanente, a destruir seus recursos naturais para fomentar um consumo inconsequente, a manter vastos segmentos da população desempregados e submetidos à miséria. Tudo isto, em nome do proveito de minorias que concentram o poder e riqueza em suas mãos.
(*) Flavio Lira . Economista. Cursou o doutorado de economia da UNICAMP. Ex-técnico do IPEA.
Leia também:
Marcos Coimbra: PT continua partido mais conhecido, apesar de menor apoio
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Publicado em 16 de junho de 2014
por Flavio Lyra (*), em seu blog, sugerido pelo Paulo Metri
A análise da realidade econômica e política da sociedade brasileira na atual fase mostra que as forças políticas que disputarão o controle do aparato estatal nas próximas eleições estarão divididas em torno de duas alternativas de condução do processo de desenvolvimento do país.
Por um lado, coloca-se a alternativa de prosseguir avançando com o processo de construção de um estado de bem-estar social, inaugurado no último governo de FCH e aprofundado nos governos de Lula e de Dilma, moldado na Constituição de 1988.
Por outro, coloca-se a alternativa de retomar e aprofundar a via do estado liberal-dependente, iniciada no governo Collor e aprofundada nos governos de FHC, reforçando o papel do mercado e da empresa privada — com subordinação crescente às grandes corporações internacionais — e deixando aos resultados do crescimento econômico determinado pelo mercado a solução dos problemas sociais.
A primeira alternativa vai requerer o aumento do grau de autonomia da sociedade brasileira frente ao processo de globalização da economia mundial, comandado pelas grandes corporações internacionais e pelo mercado, sem o que dificilmente será viável alterar a estrutura da economia na direção da re-industrialização, e do prosseguimento da redução das desigualdades na distribuição da renda.
O aumento do controle do estado pelas forças sociais representativas da classe trabalhadora é indispensável para resistir às pressões competitivas da economia internacional, que se manifestam através na perda de controle dos mercados de bens e serviços, da desnacionalização da propriedade, das transferências de recursos financeiros para o exterior, dos movimentos instabilizadores do capital estrangeiro e da crescente dependência tecnológica.
Os governos do PT, conseguiram inegavelmente, aproveitando a conjuntura internacional favorável derivada do surgimento da China como grande importador de produtos primários e mediante a posta em prática de uma política social proativa, reduzir a pobreza, elevar os salários reais da classe trabalhadora e impedir que a crise internacional, que tomou forma a partir de 2008, prejudicasse o nível de atividade e do emprego no país.
Os setores agro-extrativos reagiram bem às novas condições do comércio internacional, graças às vantagens comparativas de que goza o país e aos avanços tecnológicos que vêm sendo incorporados ao longo dos anos, aumentando substancialmente seu volume exportado e os índices de produtividade.
Em sentido contrário, a indústria de transformação, que já vinha fragilizada pelo processo de abertura econômica e de desnacionalização iniciado na década de 90, não se mostrou à altura dos desafios da acirrada competição internacional, passando a sofrer um grave processo encolhimento, com a perda de terreno no comércio internacional e no mercado interno.
Chega-se ao último ano do governo Dilma com forte desequilíbrio na conta corrente do balanço de pagamentos e grande dependência da entrada de capital estrangeiro; a taxa de câmbio mantem-se apreciada, prejudicando as exportações de produtos manufaturados, representando a única maneira de manter o fluxo de entrada líquida de capital estrangeiro que financia o déficit de transações correntes requerido para o financiamento de importações que ajudam a manter a inflação sobre controle; a taxa de juros, depois de ter sido reduzida nos dois primeiros anos de governo Dilma voltou a crescer, supostamente, para impedir que a inflação saia do controle; e o crescimento econômico desacelerou em relação ao observado no governo de Lula e agora rasteja, com taxas irrisórias.
Antes de qualquer coisa é preciso reconhecer que existem incompatibilidades entre o padrão de crescimento econômico que o país tem seguido e a construção de um estado de bem-estar social.
Os desequilíbrios que aí estão são fruto dessas incompatibilidades. As instituições econômicas e políticas atuais impedem maior avanço na construção de um estado de bem-estar social e os esforços nessa direção tendem a gerar graves desequilíbrios.
Fazem-se necessárias, por tanto, mudanças estruturais em nossa economia e em suas instituições políticas que as tornem adequadas a mudanças nas prioridades da economia, que precisam ser redefinidas com a contenção da demanda de bens e serviços de menor essencialidade, como é o caso dos automóveis, o aumento da produção de produtos básicos e serviços, especialmente alimentos, transporte de massa, educação, saúde e habitação.
Os investimentos na indústria e na infraestrutura econômica precisam ser expandidos urgentemente, mas as empresas privadas não se dispõem a investir, pois as aplicações financeiras continuam sendo um porto seguro e rentável para seus recursos.
A taxa de juros básica (Selic) precisa ser reduzida para melhorar a capacidade de financiamento de investimento do governo e as taxas de juros para o financiamento de bens de menor essencialidade aumentadas, de modo a desestimular novos aumentos do consumo.
Os gastos de divisas precisam ser mais seletivos e direcionados para os de bens e serviços de maior essencialidade. Os gastos no exterior com Turismo, por exemplo, precisam ser contidos. As remessas exageradas de lucros para o exterior precisam ser limitadas.
O sistema fiscal do país precisa ser profundamente alterado, de modo a reduzir seu caráter regressivo e torná-lo mais eficiente do ponto de vista do estimulo e direcionamento das decisões econômicas.
O Estado precisa recuperar sua capacidade de planejar e orientar a atividade econômica, deixando de ser um mero repassador de recursos para alimentar as decisões do setor privado, baseadas exclusivamente no mercado e sem maiores preocupações com os interesses do conjunto da sociedade.
O papel das empresas estrangeiras precisa ser redefinido. A propriedade exclusiva do capital as tornam insensíveis aos interesses do país em matéria de contribuição para geração líquida de divisas e capacitação tecnológica.
A alternativa que os candidatos de oposição estão em condições de levar adiante, não inteiramente reveladas em seus discursos, afigura-se como a mais nefasta possível para a maioria da população, pois baseia-se em medidas de austeridade que reduzam os gastos sociais do governo e no fortalecimento do papel do mercado na condução do processo de desenvolvimento.
O receituário neoliberal em que se baseiam as propostas dos opositores nada mais são do que a reprodução das fórmulas que levaram à profunda crise que tem afetado tanto os países centrais quanto os mais frágeis da União Europeia, acarretando a deterioração das condições de vida e dos níveis de emprego.
Os candidatos da oposição, pelos compromissos que os ligam à elite empresarial e aos segmentos mais conservadores da sociedade, não se propõem a realizar mudanças de fundo nas instituições econômicas e políticas do país, mas apenas a reforçar os aspectos mais nocivos da atual política econômica, em sua visão de curto-prazo, centrada na proteção dos interesses dos mercados financeiros nacional e internacional e na suposição de que o mero crescimento do PIB contribuirá para solucionar os graves problemas sociais do país.
Os desequilíbrios na área econômica que vem se acentuando decorrem do conflito entre o estado liberal dominante em nossas instituições políticas e econômicas e a forte presença no governo de forças populares que buscam impulsionar mudanças na direção de um estado de bem-estar social.
As forças políticas que defendem retorno ao estado liberal, diante do avanço das forças que buscam consolidar um estado de bem-estar social representam potencialmente um perigo para a democracia no país, pois poderão convergir para promover o retorno a um regime autoritário, de corte fascista, aliando-se a movimentos de direita que continuam muito vivos na sociedade brasileira.
Por sua vez, as forças políticas ligadas ao estado de bem-estar social, para sua consolidação, vão requerer de grandes mudanças nas instituições econômicas e políticas do país
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Tais mudanças passam por reformas que fortaleçam a representação política, incluindo a instituição de mecanismos amplos e eficazes no campo da participação direta da população no processo político.
As opções estão dadas. Não nos iludamos imaginando que é indiferente escolher qualquer um dos candidatos que aí estão. Os votos nas próximas eleições vão ser determinantes para os rumos do Brasil nas próximas décadas.
Se as forças políticas de centro-esquerda que estão à frente do governo não têm sido capazes de liderar todas as mudanças que o povo está a demandar, pior será se o poder voltar às mãos da elite empresarial e oligárquica que vê o povo como mero instrumento de acumulação de riqueza, mesmo que às custas de uma submissão crescente ao capitalismo destrutivo das grandes corporações.
Corporações essas que lutam dia e noite para estender seus tentáculos a todos recantos da terra, condenando os povos a viver em estado de guerra permanente, a destruir seus recursos naturais para fomentar um consumo inconsequente, a manter vastos segmentos da população desempregados e submetidos à miséria. Tudo isto, em nome do proveito de minorias que concentram o poder e riqueza em suas mãos.
(*) Flavio Lira . Economista. Cursou o doutorado de economia da UNICAMP. Ex-técnico do IPEA.
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engraçado voces nao publicam meus comentarios
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