18/09/2011
Novo governo líbio abre o jogo
Do Direto da Redação -Publicado em 18/09/2011
*Mário Augusto Jakobskind

Um dia depois, coube ao Primeiro-Ministro turco Recep Erdogani aparecer naquelas bandas. Ele quer também colocar o seu país, que dominou a Líbia durante muito tempo, na parada.
Como já se esperava, o governo provisório líbio deu o recado: os aliados estrangeiros da guerra terão prioridade nos futuros acordos a serem firmados. Trocando em miúdos: além das concessões já obtidas durante o governo Khadafi, o capital francês, britânico, italiano, participantes ativos da empreitada guerreira estão com a vida ganha. Vão lucrar bastante com a “nova Líbia”, que está surgindo numa aliança que estranhamente abarca até gente da Al Qaeda. E até mesmo na base da legislação islâmica da sharia, o que não importa para os europeus e estadunidenses, desde que sirva aos seus interesses.
Mas se alguém imagina que os Estados Unidos não vão querer também usufruir da Líbia, engana-se. O Departamento de Estado e o Pentágono vão querer sua parte no botim. Além de maiores vantagens com o petróleo, Washington vai forçar - se é que será preciso forçar, pois o novo governo é subserviente - a instalação na Líbia do Comando Militar dos Estados Unidos para a África, o Africom, atualmente com sede em Stuttgart, Alemanha, o que tinha sido rejeitado por Khadafi e países africanos.
Com isso, os EUA pretendem obter uma área estratégica no Mediterrâneo para monitorar, controlar e tentar neutralizar a influência de Pequim no continente africano. Este foi o motivo, segundo o economista egípcio Samir Amin, do surgimento dos grupos armados em Benghazi e posteriormente os caças- bombardeiros da OTAN.
Enquanto tudo isso acontecia e as previsões começavam a se confirmar mais cedo do que se esperava, a guerra civil prosseguia nos redutos khadafistas de Sirte e Walid Bani. Ibrahim Mussa, porta-voz de Khadafi, denunciou o corte de energia elétrica e água, bem como as linhas de abastecimento de alimentos básicos e remédios, o que constitui uma violação das normas internacionais.
Ou seja, o cerco através destes métodos se fecha, embora os correligionários de Khadafi, como Mussa, garantam que a resistência será prolongada e pode demorar anos. Só o tempo dirá se as declarações são de verdade ou não um mero blefe.
A caça a Khadafi até agora não surtiu efeito e já se admite que dificilmente os opositores consigam o objetivo a que se propõem, ou seja, pegar Khadafi vivo e fazer o mesmo que fizeram com Saddam Hussein. O líder líbio tem perfil distinto de Saddam e se fosse cercado dificilmente se entregaria vivo.
Se o matarem, Khadafi se tornará um mártir e como todo mártir terá influência política. É tudo que as potências coloniais, que na prática tomarão conta da Líbia, não querem, porque um fato desse tipo influi negativamente nos negócios. Mas, vivo ele também é ameaça, pode-se prever que o governo provisório não terá sossego tão cedo.
Tem mais. Se alguém acredita que os acontecimentos na Líbia dizem respeito apenas ao país árabe do Norte da África, engana-se. Para o analista político David Garcia, em artigo publicado no site América Latina em Movimento (ALAI), os Estados Unidos começaram nova doutrina intitulada “Responsabilidade de Proteger” e ainda por cima com o aval das Nações Unidas. Trocando em miúdos, a referida doutrina nada mais é do que a legalização das intervenções militares, um aval para os EUA e nações europeias intervirem em assuntos internos de nações soberanas.
A partir de agora, qualquer país, principalmente se for estratégico ou rico em produtos de interesse econômico estadunidense e europeu, está ameaçado. Pretextos se inventam.
Na semana que entra, os dirigentes palestinos tentarão o reconhecimento nas Nações Unidas. No Conselho de Segurança, o veto dos Estados Unidos é certo. Agora vem o governo Barack Obama e do extremista de direita Benyamin Nethanyhu defender negociações para a criação do Estado Palestino.
É muita hipocrisia, porque o próprio governo de Israel é o primeiro a se opor na prática ao reconhecimento de um Estado Palestino ordenando a ampliação de assentamentos nos territórios ocupados.
Em suma, como disse o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, para continuar negociando a paz com os israelenses os palestinos precisam ser reconhecidos pela ONU com as fronteiras de 1967.
O resto é enganação de quem não quer a criação de um Estado PaIestino de forma a seu território não sofrer solução de continuidade.
*Mário Augusto Jakobskind. É correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
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Nota da redação – O jornalista Mario Augusto Jakobskind acaba de escrever o livro Líbia – Barrados na Fronteira (o que não saiu na mídia sobre a invasão na Líbia). Editado pela editora Booklink, o livro estará pronto até o fim do mês. O DR divulga em primeira mão a capa do novo livro do Jakobskind.
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Faço apenas um reparo ao excelente artigo do jornalista. Foi o exército da OTAN que conquistou Trípoli, com a ajuda de opositores de Kadaffi. Antonio.
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