11/11/2010
Mantega botou o dedo na ferida: o mundo precisa de uma nova moeda
Do Vermelho - 10/11/2010
A reunião de cúpula do G20 será aberta nesta quinta-feira (11) em Seul à sombra de uma guerra cambial que ameaça degenerar em conflitos comerciais e políticos mais sérios entre as nações. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, botou o dedo na ferida ao defender a substituição do dólar como moeda mundial. Mas é pouco provável que a proposta seja debatida ou acatada. O encontro na capital da Coreia do Sul lembra o ruidoso parto da montanha que gerou um rato.
Por Umberto Martins
Mantega defende uma reforma no sistema monetário internacional que subtraia do dólar a condição de moeda mundial, aceita universalmente como meio de pagamento, unidade de referência para contratos e preços e reserva de valor.
O dinheiro de Tio Sam, que não leva em conta o interesse alheio na definição de sua política monetária, seria substituído por um novo papel, supranacional, cujo valor seria estabelecido com base nas principais moedas da atualidade: o dólar, o iuane (chinês), o euro, o iene (japonês), a libra esterlina (britânica) e, segundo a sugestão do ministro, o real brasileiro.
Privilégio americano
Mantega citou como exemplo o Direito Especial de Saque (DES) do Fundo Monetário Internacional (FMI), também baseado numa cesta das principais moedas (excluindo, entre as citadas, o real). A proposta não chega a ser propriamente uma novidade. A China já tinha lançado ideia parecida no ano passado, mas o debate não prosperou.
O ministro tem razão. O pano de fundo da chamada guerra cambial (expressão que ele usou pela primeira vez para caracterizar a instabilidade monetária desses dias) é a posição especial ocupada pelo dólar na economia internacional, ao mesmo tempo em que cabe aos EUA o privilégio da emissão, ou seja, a atribuição de estabelecer o valor relativo das verdinhas ou pelo menos influenciar poderosamente nesta direção, através das políticas monetária e fiscal.
Não se pode negar às autoridades estadunidenses a soberania sobre a política monetária e o direito de emitir dólares, do mesmo modo que não se pode negar à China a soberania sobre a política cambial. O problema, no primeiro caso, é que o dólar é a moeda mundial. Não circula apenas nos Estados Unidos, mas em todo o mundo. É a referência dos preços das mercadorias, a começar pelo petróleo, e dos contratos.
Inflação mundial
Sendo assim, é inevitável que a emissão excessiva de dólares (como no caso dos 600 bilhões para compra de títulos do Tesouro anunciado pelo Federal Reserve) resulte em desalinhamento cambial, gerando conflitos nos preços relativos das moedas (guerra cambial), reações unilaterais das nações e inflação mundial. Boa parte da alta das commodities, por exemplo, ocorre em contrapartida ao declínio do dólar.
A instabilidade cambial, conforme notaram vários empresários, é pior do que a valorização ou desvalorização da moeda para os negócios, pois inviabiliza o planejamento, sujeita exportadores e importadores a ganhos ou prejuízos inesperados, fomenta a especulação e, como inflação, transforma o comércio exterior num jogo perigoso.
Crise da hegemonia
Vítima dos desequilíbrios colossais e do crescente parasitismo cultivados pelo imperialismo, decorrentes de quatro décadas de acumulação de déficit comercial e refletidos numa escandalosa necessidade de financiamento externo, o padrão dólar há muito não é capaz de garantir estabilidade aos mercados de câmbio. Não tem mais condições de desempenhar as funções de moeda mundial. Daí o clamor crescente por sua substituição.
O diabo é que este tipo de problema não será resolvido apenas no campo da economia. Depende de condições políticas que certamente ainda não estão maduras. Afinal, a supremacia do padrão dólar é emblemática da hegemonia americana. A crise do dólar é mais uma expressão da crise da hegemonia dos EUA e sua solução envolve mudanças mais amplas em direção a uma nova ordem mundial. Mas não creio que isto seja sequer sinalizado pela cúpula de Seul. E tampouco que virá sem luta.
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