19/10/2011
Do Viomundo - 19 de outubro de 2011 às 17:12
No dia 12 de outubro, publicamos o artigo de Juliana Medeiros, que quase todos dias fala (por Skype) com a Líbia. É o relato pessoal de uma guerra estúpida.
O leitor Alberto postou o seguinte comentário:
Hoje, Juliana Medeiros postou a resposta a esse leitor do leitor. Segue na íntegra.
por Juliana Medeiros, no Substantivo Comum
Falo quase todos os dias (pelo Skype) com a Líbia. Amigos em Trípoli, Sirte, Bani Walid, Sebha, Misrata.. também muitos refugiados em Túnis, no país vizinho.
Dentre os vários comentários que o post Líbia – Um relato pessoal gerou depois de publicado no site Viomundo, um em especial (do Alberto) me obrigou a responder, já que com ele responderia a vários questionamentos de pessoas diferentes, gente que já me fez as mesmas perguntas. Publiquei lá, mas reproduzo aqui a minha resposta.
Me sinto na obrigação de responder a alguns questionamentos:
1 – Sim, a maior parte do armamento foi oferecido pela OTAN e pelos “aliados”. Há dezenas de fotografias com as imagens das coletas dos armamentos que eram jogados por pára-quedas ou chegavam de navio. Aliás, quando estávamos na Tunísia, o porto de Túnis tinha acabado de interceptar um navio que vinha do Qatar carregado de armamentos a serem entregues em Benghazi. As autoridades portuárias que entrevistamos disseram que vários passaram antes, mas com o bombardeio das fronteiras, decidiram não mais permitir esse “apoio” à guerra contra o país vizinho.
Mas, veja, se parte disso era mesmo arsenal militar do governo, que tal se alguns de nós (do movimento “contra a corrupção” por exemplo), ao invés de nos limitar à passeatas, invadíssemos os quartéis e arsenais militares brasileiros e avançássemos contra o Congresso Nacional e órgãos públicos, além de civis, atirando em tudo e todos.. qualquer reação dos militares brasileiros seria considerada “massacre de civis”?
Aliás, o governo brasileiro deveria reagir ou admitir que esse grupo representa “legitimamente” uma “maioria” opositora, chamá-los de “Conselho de Transição” e, quem sabe, posteriormente, Dilma abriria mão de seu cargo voluntariamente em respeito aos “manifestantes”.. foi exatamente isso que aconteceu na Líbia. É que é mais fácil imaginar no quintal dos outros, não no nosso.
2 – A cova coletiva da prisão de Abuh Salim (assim como várias outras denúncias) é notícia falsa, sim. Foi desmentida em vários canais, exceto nos que já conhecemos. Era uma cova com OSSOS DE CAMELOS… procure, está disponível na internet.
3 – Até o momento, as acusações contra Gaddafi de contratação de “mercenários” não encontrou provas. Os negros imigrantes que trabalhavam nas construtoras estão sendo dizimados com essa alegação (de que seriam mercenários pagos por ele), fato já denunciado pela Anistia Internacional algumas vezes. Por outro lado, já há registros, fotografias, provas documentais, da participação de mercenários blackwaters e de várias outras origens, ao lado dos “rebeldes”. Em jornais como o Guardian e o Independent já foram publicadas até entrevistas com alguns deles, muitos incorporados às forças especiais britânicas para entrar por terra e se misturar aos “rebeldes” pela semelhança física (a cara de muçulmano).
Aliás, foi exatamente assim que ocorreu o “milagre da multiplicação” dos pouquíssimos rebeldes para os muitos que vimos depois. Eram estrangeiros, está no meu texto acima e já foi confirmado pelos porta-vozes rebeldes: “tivemos ajuda por terra de soldados aliados vestidos como civis e misturados a nós”.
4 – A Al Jazeera inventou sim inúmeras cenas. A principal delas, também já demonstrada em reportagens e ADMITIDA pelo Abdul Jalil, porta-voz rebelde, foi o cenário montado no Qatar para “simular” a invasão de Trípoli. Eu colocava no twitter, enquanto víamos aquelas cenas, que os colegas que estavam no hotel em Trípoli JAMAIS viram aquela multidão na Praça Verde e ninguém acreditava. Isso JAMAIS existiu, aquela festa, aquela multidão comemorando. Eles estão desde aquele dia, fazendo o mesmo que fazem ainda agora, entrando e “fatiando” o ambiente e atirando e conquistando bairros aos poucos. Quando várias TVs (como a RT da Russia) começaram a mostrar as falhas entre a verdadeira Praça Verde e a que usaram para simular isso, Jalil deu uma coletiva e admitiu que houve um “equívoco” e que a cena jamais existiu, apenas que estavam começando a ocupação de Trípoli. Isso mostra o apoio midiático dado pela Al Jazeera na conquista não só da capital, mas de mentes e corações dos cidadãos líbios, que estavam sendo convencidos desta invasão e mentirosa “adesão em massa”.
5 – As tribos líbias, várias, sempre viveram em conflito entre elas, independente do Gaddafi (inclusive a dele). É uma história bem mais complexa, impossível de simplificar aqui sem falar em toda a história de formação do país. Mas uma coisa é certa: ele foi o único a mantê-las por anos convivendo pacificamente. E sim, foi a tribo de Benghazi e uma das que havia em Misrata a iniciarem os conflitos (ataques que eles mesmos fizeram a órgãos públicos e residencias de partidarios de Gaddafi). Sem ajuda estrangeira, jamais teria passado disso. Teriam sido reprimidos, como seriam se fosse em qualquer país.
6 – O argumento de guerra civil é real, desde o início em função do que foi dito. As tribos iniciaram esse conflito e os cidadãos estavam se atacando. A acusação de que Gaddafi bombardeou áreas civis e que por isso era necessário a zona de exclusão aérea foi DESMENTIDA pela Anistia Internacional, infelizmente, meses depois de iniciada a guerra. Ele bombardeou os arsenais no deserto para evitar que fossem saqueados. E tentou sim, com força militar, impedir que os próprios cidadãos se matassem.
A Líbia podia estar necessitando de uma transição, mas quando os conflitos iniciaram, o governo Gaddafi propôs isso de inúmeras maneiras. Sugeriram a realização de plebiscito para perguntar à população que regime gostariam de ter, se gostariam de ter eleições, sugeriram que uma nova organização de governo fosse feita com membros do anterior e do CNT, enfim, muitas propostas.
A única coisa que ele não abriu mão e jamais fará, é que apenas pegasse o banquinho e saísse para a ocupação que acontece agora. Ele identificou a movimentação da Al Qaeda nas fronteiras, das tropas estrangeiras após a zona de exclusão aérea, dos porta-aviões parados em frente ao litoral líbio e a cada avanço desse tipo, ele também endurecia sua posição de não se entregar. Aliás, de não entregar a Líbia de bandeja para Cameron, Sarkozy, Obama e cia. E agora vemos que ele estava certo. Arrasaram a Líbia, destruíram grande parte do país, estão brigando entre eles e entre as empresas que querem explorar o petróleo líbio, estão cometendo uma série de violações com nosso silêncio. Queriam apenas se apropriar da Líbia, não era um movimento de “liberdade”, era um movimento de “traição” ao país, iniciado por poucos cidadão líbios, apoiados inicialmente por jihadistas. Gaddafi estava certo.
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