segunda-feira, 28 de maio de 2012

Contraponto 8275 - "Considerações sobre a infâmia"

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28/05/2012

Considerações sobre a infâmia

Do Cafezinho - 28/05/2012

Miguel do Rosário

Vamos direto às novidades do escândalo Gilmar-Lula. Para quem não sabe do que se trata, sugiro dar um giro por outros posts do blog depois voltar aqui.

O Globo simplesmente – e inacreditavelmente – escondeu Nelson Jobim. Logo ele, orgulho da mídia de oposição por sua orgulhosa e bem sucedida independência. Mesmo antipetista e mais ligado ao PSDB do que ao governo, Jobim conseguiu ser ministro de Lula e Dilma. Aliás, foi ministro justamente por essa característica. Ele era uma espécie de ponte entre o tucanato midiático e o governo. Durante o chamado “caos aéreo”, Lula nomeou Jobim para acalmar setores apavorados da classe média. Deu certo. Jobim deu meia dúzia de declarações em tom chauvinista e terminou a crise. Foi demitido em 2011 por Dilma Rousseff após começar a dar entrevistas dizendo que votara em José Serra.

Recentemente, Jobim voltou a ganhar destaque nos jornais por sua intervenção num evento do PMDB, no qual advogou que o partido assuma posições independentes do PT.

Ou seja, Jobim tem tudo para ser um queridinho da grande mídia.

Pois mesmo assim, O Globo impresso de hoje não dá a informação de que Jobim declarou, a um jornalista da própria empresa, Jorge Bastos Moreno, que a reportagem da Veja é inverídica, de que Lula não pressionou Gilmar Mendes a adiar o processo do mensalão, e que os dois não ficaram sozinhos.

Ao invés disso, o Globo traz matéria, estranhamente assinada pelo próprio Moreno (no site, ainda mais bizarramente, a matéria vem anônima), na qual o encontro entre Lula e Jobim é reconstruído através de um curioso método:

Convém esclarecer, também, que tudo isso e o que se segue foram reconstruídos seguindo os rastros das conversas que o ministro Gilmar Mendes passou a ter com vários interlocutores sobre o ocorrido.

Por que a versão impressa do Globo não publicou a entrevista de Jobim ao blog do Moreno, a única que de fato trazia novidades? Por que exigiu que Moreno escrevesse uma matéria contradizendo a própria fonte, e baseado em “rastros de conversas”?

Bem, a resposta é fácil. Basta ler a coluna de Noblat, publicada no mesmo dia, à página 2 (ainda não está na web). Ou conferir a incrível manipulação do jornal a partir de uma entrevista de Celso de Mello ao site Consultor Jurídico, notoriamente ligado a Gilmar Mendes.

O Conjur entrevistou Celso de Mello neste domingo, antes que Mello tomasse conhecimento de que a única testemunha da conversa entre Mendes e Lula havia negado veementemente seu conteúdo. Mello respondeu a partir de uma hipótese.

Mello deixa bem claro o condicionamente de sua frase: “a conduta do ex-presidente da República, se confirmada, constituirá lamentável expressão de grave desconhecimento das instituições republicanas.”

A postura de Mello nos lembra a lamentável influência que a Veja e órgãos da grande mídia ainda exercem sobre o espírito de magistrados. Esperemos que o ministro, vendo que sua fala foi manipulada, e constatando que a própria informação na qual se baseou estava equivocada, reflita sobre os danos que, apesar de involuntariamente, causou à estabilidade política, o que constitui uma irresponsabilidade e uma infração ética de sua missão como juiz da corte superior. Diante do histórico da revista, Mello deveria ter pedido tempo para se informar melhor. É absurdo que os ministros do Supremo ainda se deixem ser manipulados tão facilmente.

Pois é, excelentíssimo Mello: a notícia não foi confirmada. Lula e a única testemunha, Nelson Jobim, negaram o teor da conversa. São dois contra um. O Conjur, ao menos, informa, ao final do texto, que Jobim rechaçou a matéria da Veja. O Globo, ao invés disso, optou pela seguinte chamada na capa (observe o subtítulo):

Além de pedir o “impeachment” de Lula na capa, o Globo dá o seguinte título à matéria (onde não informa, repito, que Jobim negou o conteúdo da conversa, nem que Mello falava hipoteticamente):

À Folha, o ex-ministro, além de negar a conversa, acrescentou uma informação nova (para assinantes do UOL):

O ex-ministro se diz surpreso também com o relato de que Gilmar teria ficado perplexo com a conversa.

“Lula saiu antes dele e não houve indignação nenhuma do Gilmar. Isso só apareceu agora na revista”, argumenta Nelson Jobim.

Quem deu o furo sobre a negativa de Jobim foi o Estadão, em matéria destemida. Uso o adjetivo destemida para diferenciá-la daquela escrita por Jorge Bastos Moreno (a primeira, com fatos; não a segunda, com “rastros de conversa”), repleta daquela covardia travestida de ironia, na qual ele procura atenuar a negativa, firme, do ex-ministro com a ridícula insinuação de que ele estaria com “voz estranha”.

Pena que o destemor do Estadão tenha se limitado a sua editoria virtual. A negativa de Jobim não consta da versão impressa.

É realmente incrível que, num caso dessa gravidade, os editores neguem ao leitor, na maior cara dura, uma informação fundamental para se entender a história em sua plenitude. E isso em tempos de internet, quando a grande maioria do público interessado no tema perceberá a manobra. Não precisavam acreditar em Jobim, mas bloquear a informação?

Voltando ao Globo, a coluna do Noblat aborda o caso igualmente sem uma mísera menção à negação de Jobim ou Lula. Discorre sobre caso baseando-se exclusivamente no relato de Jobim à Veja. O início é de um desrespeito estarrecedor:

Repare na citação sobre Dirceu, provavelmente mais uma invencionice. Há uma só palavra citada: “desperado”, o resto são colchetes e parênteses. A palavra parece dizer mais sobre o estado de espírito do jornal do que do ex-deputado.

A baixeza de Noblat parece não ter limites. Iniciar uma análise atribuindo a postura de Lula ao efeito dos remédios contra o câncer me parece, este sim, um recurso desesperado.

Observe a afirmação: “Para chegar bem ao seu final, a CPI terá que dar em nada”. Noblat vocaliza a enésima ameaça da mídia à CPI, que por isso mesmo não pode se acovardar. E mais uma vez atribui sua criação exclusivamente ao presidente Lula, quando ela foi criada a partir da assinatura de mais de 400 deputados e senadores. Os parlamentares não devem esquecer que o juiz final de sua atitude na CPI não será a mídia, nem a blogosfera, mas a história.

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