13/09/2012
Filme coloca lenha na fogueira
Do Direto da Redação - Publicado em 13/09/2012
Mair Pena Neto*
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Ferir suscetibilidades religiosas já tinha desencadeado crises anteriores. Uma infeliz caricatura do profeta Maomé produzida em um jornal dinamarquês gerou protestos e ataque à embaixada da Dinamarca na Síria. Mais grave ainda foi a ameaça de um pastor norte-americano de queimar cópias do Alcorão, que gerou nova revolta e mortes em países islâmicos. Ora, um filme que ofende o Islã e chega a apresentar o profeta em cenas de sexo explícito só poderia ter como propósito desencadear uma onda de protestos, como a que se verifica agora, e mais uma centelha num quadro de instabilidade que se vive em boa parte dos países árabes e do mundo islâmico.
Os Estados Unidos precisam controlar seus radicais. Como um filme de conteúdo altamente explosivo é produzido na Califórnia sem que as autoridades tão ciosas das ameaças potenciais à segurança interna se deem conta? Que tipo de acompanhamento é feito ao pastor Terry Jones, o que pregou a queima do Alcorão e foi agora responsável pela promoção do filme? Tais falhas, ou talvez condescendências, façam sentido em um país que ameaça eleger à presidência um extremista como o republicano Mitt Romney, já capaz de incendiar o planeta só com suas declarações e posições como candidato, imagina se um dia ocupar a Casa Branca.
Romney, que em visita a Israel incentivou um ataque ao Irã, aproveitou o episódio em Benghazi para acusar o presidente Barack Obama de se solidarizar com os agressores em vez de condenar as agressões. Na verdade, se referia a uma medida sensata da embaixada dos EUA no Cairo, que condenara iniciativas que ferem os sentimentos religiosos dos muçulmanos, como o filme ofensivo ao profeta Maomé que desencadeara os protestos.
A falta de sensibilidade, porém, não é privilégio dos falcões republicanos. A secretária de Estado, Hillary Clinton, numa manifestação de inocência ou hipocrisia, se manifestou perplexa com o ataque à embaixada dos EUA em Benghazi e se perguntou “como isso pode acontecer num país que ajudamos a libertar?” Libertar como? Assim como libertou o Iraque de Saddam Hussein e jogou o país num conflito que vai completar uma década sem sinal de resolução?
Os Estados Unidos e o Ocidente não podem clamar para si o papel de libertadores, quando suas ações se baseiam em questionáveis interesses humanitários, invariavelmente ligados a países com importantes produções petrolíferas. Estas intervenções sempre ocorrem com a entrega de armamento aos aliados da hora, que, posteriormente, podem virar inimigos. Foi assim com o Talibã, no Afeganistão, ainda à época da guerra fria, armado pelos EUA para enfrentar a ocupação soviética no país. E o roteiro parece se repetir na Líbia, onde o ataque em Benghazi levou à morte o embaixador americano.
Depois que o Ocidente derruba ditaduras, como a de Saddam Hussein e de Muammar Kadhafi, o que se instala não é um cenário de liberdades e de organização, e, sim, uma disputa de facções, muitas vezes armadas, em disputa frenética pelo poder. A situação na Líbia pós-Kadhafi é exatamente essa. E neste cenário, os extremistas, que os EUA esperavam que fossem agradecidos, encontram território fértil para suas ações.
*Mair Pena Neto . Jornalista carioca. Trabalhou em O Globo, Jornal do Brasil, Agência Estado e Agência Reuters. No JB foi editor de política e repórter especial de economia.
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