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27/03/2015
O umbigo de Gilmar Mendes
Miúdas reflexões sobre os objetivos do ministro. E os riscos que Janot corre
Antonio Cruz/Agência Brasil
Com essa postura de reter autos ad aeternum, o ministro Gilmar mendes usa a função de magistrado para satisfação pessoal
1. O juiz dos juízes
Pegou mal entre juristas e operadores do
Direito a entrevista do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal
Federal (STF), ao jornal O Globo, publicada na terça 17. Nela, o
ministro manifestou-se a respeito da ação direta de
inconstitucionalidade (Adin) ajuizada pela OAB e sustentada na
ilegitimidade das pessoas jurídicas para realizar doações em campanhas
políticas e na tese de que as pessoas físicas devem estar sujeitas a um
teto.
O julgamento dessa Adin pelo plenário da
Suprema Corte restou suspenso e em razão do pedido de melhor exame dos
autos processuais formulado pelo ministro Mendes. Até então
verificava-se uma maioria de 6 x 1 votos, ou seja, seria acolhida a
Adin, vencido o ministro Teori Zavascki. Num plenário com todos os seus
11 ministros presentes, a suspensão da sessão impediu a coleta dos votos
dos ministros Rosa Weber, Carmem Lúcia e Celso de Mello. Mesmo na
hipótese de os votos faltantes acompanharem o de Zavascki, o resultado
do julgamento seria, de todo modo, de 6 x 5 votos pela procedência da
Adin.
Com efeito, passado um ano na posse dos
autos processuais e, em vez de devolvê-los para o julgamento prosseguir e
ser finalizado, o ministro Mendes, na entrevista, adiantou a sua
posição e, assim, prejulgou fora dos autos e do momento próprio.
Não bastasse, criticou a pertinência da
Adin e ofendeu a OAB, e, por tabela, os ministros que já votaram pelo
acolhimento da ação: “Não sei como essa gente (OAB) teve coragem
de propor isso. As pessoas têm direito de fazer o que elas quiserem,
considerando o livre arbítrio. Elas só não podem fazer a gente de bobo,
imaginar que a gente tem uma inteligência menor do que a deles. Só isso.
Um pouco de respeito à inteligência faria bem a quem formulou essa
proposta. Não nos façam de bobos!”
O desabrido ministro Mendes, que já adiantou o seu convencimento a respeito da matéria sub judice impede, no entanto, o julgamento ao não devolver os autos. E isso representa uma maneira de se denegar a Justiça.
Para o ministro, compete exclusivamente ao Congresso, não ao STF, legislar sobre reformas políticas e doações eleitorais. Com essa postura de reter autos ad aeternum, ou até o Congresso legislar, o ministro Mendes usa a função de magistrado para satisfação pessoal e esquece ser a administração da Justiça um monopólio do Estado e não dele.
Como ensinam todos os livros desde as
primeiras linhas e sabem até os rábulas de porta de cadeia, veda-se ao
juiz reter autos e emitir julgamento antecipado sobre matéria submetida à
sua apreciação.
A Lei Orgânica da Magistratura (Loman), a
respeito, estabelece, no seu artigo 35, e ao cuidar dos deveres do
magistrado, o de “não exceder injustificadamente os prazos para
sentenciar ou despachar”.
Numa apertada síntese, com tais posturas
fica claro estar o ministro Mendes a usar a função para satisfazer a sua
vontade e colocar-se como o juiz dos juízes.
2. Varões de Plutarco
Por cumprir o mandato de procurador-geral da República com zelo e probidade, Rodrigo Janot colecionou inimigos e passou, além da esperada pressão, a receber ameaça anônima, a arma da predileção dos covardes.
No momento, seus dois inimigos mais
poderosos e declarados são Renan Calheiros e Eduardo Cunha, presidentes
do Senado e da Câmara. Como os Varões de Plutarco estão sempre acima de
qualquer suspeita, Calheiros e Cunha não aceitaram ter Janot
requisitado, com base em delações premiadas, apurações sobre suas
eventuais participações parasitárias no propinoduto da Petrobras.
Calheiros sabe permitir a Constituição da
República, ao tratar da competência privativa do Senado, a exoneração
do procurador-geral Janot, no curso do mandato e pela vontade da maioria
absoluta: metade mais um dos senadores.
Por seu lado, Cunha explora o
corporativismo e açula os seus pares, incluídos os tucanos. Ao se
apresentar espontaneamente à CPI para ser ouvido, Cunha transformou a
sessão pública em palanque direcionado a desacreditar Janot. Caso a
competência privativa para a exoneração fosse da Câmara, a cabeça de
Janot já teria rolado.
A dupla Calheiros-Cunha enfrenta, porém,
um obstáculo. Nas manifestações de domingo 15, ao contrário do sucedido
em junho de 2013, quando os parlamentares figuravam entre os alvos
principais da repulsa, a indignação desta vez estava focada na
presidenta Dilma e na corrupção. Com efeito, toda tentativa de se
buscar, via Senado, a exoneração de Janot provocará manifestações por
todo o País e os políticos dividirão com Dilma o opróbrio da condenação
popular.
Por enquanto, Calheiros e Cunha terão de
engolir Janot. Em setembro, data do término do primeiro mandato do
procurador-geral, a dupla pressionará Dilma, a quem compete a escolha em
lista tríplice apresentada por procuradores votantes. Até o mais
moderno dos procuradores sabe que será Janot o cabeça da lista.
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