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13/04/2016
Dilma, a esperança e a repactuação
Jornal GGN -qua, 13/04/2016 - 15:1Atualizado em 13/04/2016 - 17:09
A entrevista coletiva começou
às 11 horas da manhã, no Palácio do Planalto. Em torno da mesa redonda,
14 pessoas, entre jornalistas de diversos órgãos, alguns assessores e a
presidente Dilma Rousseff. Foi pontilhada de respostas, causos e tiradas
de humor.
No final, uma pergunta sobre a esperança: por que acreditar que, derrubado o impeachment, tudo será diferente?
Dilma explicou com um "causo" dolorido, dos tempos da repressão.
-
Um belo dia estava eu na Operação Bandeirantes; Daqui a duas horas você
espera que vai ser interrogado. Depois, ia para o DOPS. Ficava torcendo
para Fleury ir para o carnaval, porque aí não interrogava. Passava um
tempo, ía para o Presídio Tiradentes. Você ia pensar o que? Não tem
saída, é assim para sempre? Não é assim que se encara. Encara se tiver
esperança, se souber que a vida é um pouquinho mais complicada.
Ela se lembrou de uma conversa com Franklin Martins:
-
Sabe porque não temos mágoa dos torturadores? Porque nós ganhamos e
eles não. Mas levamos 25 anos. Na pior situação, você sempre sabia que
as coisas não são estáticas, são dinâmicas, os agentes sociais agem.
Enquanto tem tudo isso, eu vejo uma manifestação democrática fantástica.
E tenho certeza de que independentemente de mim, isso continuará, o
país continuará avançando e a democracia se consolidando.
Foi o fecho para a entrevista, na qual a presidente passou por todos os temas propostos.
Sobre a crise e sua responsabilidade
Diante
de situação, não há como negar a interação entre instabilidade política
profunda que afeta o país há 15 meses, e a crise econômica,
intensificado pela crise política. Nossa capacidade de recuperação se
mostrou limitada pela crise política.
A
crise econômica é cíclica, primeiro atingiu os desenvolvidos e, depois,
os países em desenvolvimento. E não só o Brasil. Não dá para subestimar
o efeito da crise das commodities sobre a economia.
No
caso do Brasil, não acredito que nossas mazelas econômicas se devam
fundamentalmente à política anticíclica de 2009. Adiamos os efeitos de
uma crise que se aprofunda.
Ao
fazer a política cíclica derrubamos bastante a arrecadação do país.
Tivemos uma nível elevado de redução de impostos. Agora, pergunto:
teríamos segurado o emprego na proporção que seguramos se não tivéssemos
feito o financiamento através do PSI (Programa de Sustentação ao
Investimento), com juros de 2,5% real; se não tivéssemos reduzido o
imposto sobre bens de capital de 30% aporá 4%, se não tivéssemos
desonerado o tanto quanto desoneramos a folha.
No
meu período, de 2011 a 2014 criamos um pouco mais de 5,2 milhões de
empregos. Se for olhar o saldo, mesmo com um ano e quinze meses de
profunda crise, perdemos 2,6 milhões de empregos, e mantivemos saldo de
2,6 milhões.
Nossa política anticíclica segurou.
Daqui para frente
Agora
temos de enfrentar várias questões. Ninguém saiu do processo de crise
sem enfrentar. No caso do Brasil, temos agora uma situação mais
favorável, com US$ 40 bilhões de superávit na balança comercial, segundo
projeção do MDIC para este ano. Saímos em 2014 com US$ 4 BI de déficit.
Outra
característica é a queda da inflação. Subestima-se o efeito de preços
controlados. Não controlamos o clima e de 2011 a início de 2016 tivemos
uma das maiores secas da história. Em 2015, neste mesmo dia, o nível dos
reservatórios das dez maiores usinas estava em 22%. Agora, se pegar
Furnas já estamos em 76,5%.
Enfrentamos
todo o período com quase nada de água e sem racionamento, porque
despachamos todas as térmicas. Não deriva de decisão governamental, mas
de um sistema hidrotérmico.
Tivemos
um ajuste brutal de tarifas ao botar todas as térmicas funcionando. Faz
parte da estrutura do sistema. Um dos fatores que pesou na inflação,
tanto para cima como para baixo.
Quando se explica porque a inflação está caindo, explica porque subiu.
As reformas e as pautas-bombas
Na
queda no ciclo econômico, aparecem todos os defeitos. O Brasil tem
várias disfunções que precisam ser ultrapassadas. Vamos ter que olhar e
fazer reformas. Para tanto, há que se ter unidade.
Uma das disfunções são as pautas-bombas.
Pauta-bomba
é aquela que o conjunto acredita que é possível sair de uma situação
difícil botando fogo em todo o restante. No ano passado tivemos cinco
pautas-bomba, no total de R$ 140 bilhões.
O
PDL (Projeto de Decreto Legislativo) do juro simples veio da Câmara, do
deputado Espiridião Amin (projeto que muda a fórmula de cálculo das
dívidas estaduais com a União de juros compostos para simples).
São
R$ 300 bilhões de diferença. E a paralisia que provocará e a perda de
energia de termos de ir sistematicamente no Congresso para impedir.
Primeira
reforma seria o fim das pautas-bombas, o fim do uso de expedientes
políticos para paralisar o governo. Tivemos esse processo durante 15
meses e o principal personagem foi o presidente da Câmara..
Sobre o modelo político
Nós temos um sistema político com algumas características.
No passado, governava-se com 3 partidos. FHC governou assim. Lula governou com menos partidos que no meu período.
No início do meu segundo mandato, havia 28 partidos dentro do Congresso.
O
nível de unidade dos partidos é diferenciado, com várias tendências,
determinações por adoção de frentes, de interesses regionais.
Supor que é possível estruturar uma política sem reforma política profunda será muito difícil.
Vocês adoram que eu faça autocrítica, mas não posso fazer só para contentar porque não muda uma vírgula da realidade.
A
base não esfacelou. Não adianta analisar visão tradicional de partido.
Não é assim que o Brasil funciona, a não ser que se tenha visão
absolutamente idealista de partido político.
Não
estou falando de mazelas, mas de diferenças partidárias. Não são
partidos ideológicos, na qual se faz um acordo parlamentar. Um pouco
disso (desses problemas) está existindo nos Estados Unidos, uma certa
divisão pronunciado dentro do Partido Republicano.
Obama
teve que negociar com minorias no último ano., Ele largou de mão. Fez
acordo com Irã, Cuba, levou dois mandatos para aprovar Obama Care. Ou
percebemos que há um processo bem complexo na relação do
presidencialismo com o Congresso, ou vamos acreditar em contos de fada.
Impeachment, pacto e legitimidade
Acredito que é possível tecer um pacto. Mas alguns pré-requisitos são fundamentais.
Não
é possível sem a legitimidade do voto, tentando transformar o
impeachment em eleição indireta de quem não tem voto. Uma eleição
indireta perigosíssima porque não resolve os problemas do país.
Primeira coisa, voto popular. De qualquer jeito consegue transformar se tiver voto popular.
O
impeachment é previsto na Constituição. Os órgãos de imprensa
esquecem-se de que o impeachment previsto na Constituição tem que ter
base legal. Não dá para fazer salto no escuro de impeachment fraudulento
sem base legal.
Não estou dizendo que terá consequências imediatas. Mas que marcará indelevelmente a história do presidencialismo no Brasil.
Não
estou dizendo que vai haver. Estou explicitando o que os órgãos grandes
de imprensa relutam em falar: é golpe. Estou fazendo uma denúncia: tem
um estado de golpe sendo conspirado no Brasil. Tanto aqueles que agem
abertamente a favor, como os que agem ocultamente e os que se omitem:
todos serão responsáveis. Não se pode supor que determinados atos
políticos são feitos sem consequências.
Depois,
não pode ter vencidos nem vencedores. Chamaremos todos os partidos,
setores econômicos e sociais para montar o próximo plano de governo.
Sobre o jogo político da Lava Jato
Vazamentos
para si mesmo, nunca vi antes. O vazamento para si mesmo é algo
fantástico. Vocês não são ingênuos e sabem que (a fala de Temer) não foi
vazamento, mas uma manifestação deliberada, nunca vista antes, quando
processo em curso e alguém tenta, sem olhar resultado, fazer o discurso
do posse.
Chamei-o
de chefe de golpe. Só não sei quem é o chefe é o vice-chefe, Acho que
(Temer e Cunha) são associados. Um não age sem o outro. Uma parte do
golpe depende diretamente do presidente da Câmara.
Sobre o estado mínimo
Nós
não achamos que Estado tem que tratar só de educação, saúde e
segurança. Fizemos um programa, o MCMV (Minha Casa Minha Vida),e hoje,
de cada 8 brasileiros, um foi beneficiado com uma moradia. Tenho clareza
do tamanho desse programa e de sua importância. No dia de hoje temos
4,3 milhões de moradias contratadas e 2,4 milhões entregues. E lançamos
agora a segunda parte.
É
importante do ponto de vista social e econômico. Não cria bolha
imobiliária, assegura casa própria para população de baixa renda, tira
um monte de gente de moradias de alto risco, transforma famílias em
famílias mais estáveis.
Não é fundamental programa de segurança hídrica? Subestima-se a integração do São Francisco mas está quase pronta.
Na
saúde, acabou a discussão sobre o Mais Médicos. Há 18 mil médicos
atendendo 63 milhões de pessoas hoje. Tem 1,2 milhão cisternas
distribuídas no Nordeste.
Estado
mínimo é compatível com países desenvolvidos e, mesmo assim, alguns não
fazem isso, como a Dinamarca, a Escandinávia toda.
Achar
que resolve problemas do país ignorando a quantidade de atraso, de
herança maldita de ano e anos em que parte da população foi retirada dos
mecanismos da riqueza, é ter uma proposta totalmente dissonante em
relação à realidade.
Outra
coisa é achar que Estado precisa fazer coisas de que não precisa. Não
tem que gastar dinheiro com o que a iniciativa privada faz melhor, mais
rápido e mais eficiente.
E
existem experiência bem sucedida nos aeroportos, em concessões e acho
que as empresas brasileiras construtoras têm que ser encaradas como
agentes de desenvolvimento e não como agentes de corrupção. Tem que
impedir que se demonizem empresas, porque precisamos de empresas que
constroem.
Investigue quem tiver que investigar, mas não destrua as empresas.
A
grande competência dos EUA é a convicção da importância de suas
empresas. Por esse método não sobraria um banco norte-americano depois
da crise. Multaram, penalizaram, alguns fecharam.
Sobre a tensão pré-impeachment
Fico
curiosa quando leio nos jornais Preocupações de ministros do meu
governo com a votação do impeachment. É o Jornalismo mediúnico, vocês
falam o que eu penso. Aí eu olho no espelho e digo: não falei.
Nessa
reta final vamos sofrer uma guerra psicológica: eu tenho os votos,
aquele não tem. O processo que tem um objetivo, de construir situação de
efeito dominó.
É
muito difícil neste momento chegar e dizer: um partido desembarcou do
governo. Tem situações das mais variadas, de partidos que saem e as
pessoas ficam. Tem variações, não tem relação linear entre líderes e
liderados, característica do sistema político no Brasil, que torna
extremamente complexa a análise da realidade e complexo o jogo político.
Relação com os poderes
Apesar
de jovem democracia, há razoável independência dos poderes. Em relação
ao STF, bastante clara. Em relação à estrutura do Judiciário federal,
idem. A autonomia dos ministros, a independência dos poderes e a
soberania do STF é inconteste.
Não
acredito que tenhamos no Brasil uma fragilidade no que se refere às
demais instituições, porque ganharam ao longo do tempo sua própria
autonomia. No caso do MPF, a base é a Constituição de 1988, garantindo a
cada procurador a Autonoma para investigar. A Polícia Federal também
tem atribuição de autonomia.
O
interessante é avaliar não os poderes mas a imprensa, diante da
continuidade do meu governo. A espetacularização da investigação vai
continuar?
Uma coisa é investigar, outra é a espetacularização da investigação.
Vaza
prova nos EUA, o que acontece? Se a prova não está em condições de ser
vazada, anula. Aqui se grava o presidente da República sem autorização
do STF, depois se vaza.
Nos
últimos dias ficou claro que o que vazamento (dos diálogos com Lula)
diz respeito a mim, eu fui investigada, virada dos avessos, é evidência
que não acharam outro motivo para tentar forçar meu impedimento. Então o
jogo é muito difícil, a espetacularização significa vazamento dirigido,
sem base legal e a gente sabe disso.
Sobre a repactuação
Temos
que olhar todos os lados, mas respeitando todas as conquistas. Pacto
não é só com oposição, mas com forças econômicas e movimentos sociais.
Coisa
que Luis Nassif falou e tem razão: nos últimos dias há uma
reorganização das forças políticas de forma intensa, e se dando em torno
de uma questão fundamental, que é a questão democrática.
É processo crescente.
Temos
tido demonstrações de pessoas que não estão apoiando o governo. O que
estão defendendo é um processo democrático. A última manifestação dos
artistas é mito significativa.
Também
tenho recebido relatos de manifestações extremas de ódio. A mais grave é
da médica que abriu mão de cuidar de uma criança recém nascida.
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