03/10/2017
Entre moralismo e violência moral, o limite da dor
Brasil 247 - 3 de Outubro de 2017
por Tereza Cruvinel
Cada qual tem seu limite para a dor. Na onda de punitivismo que tomou conta do Brasil, em que o castigo vem antes da apuração da culpa, dona Marisa Letícia não suportou a perseguição que se abateu sobre Lula e toda a família e sofreu um AVC fatal. Mas ela era a mulher de Lula, apontá-la como vítima da Lava Jato foi logo carimbado como “estratégia de vitimização”. Agora foi o ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier de Olivo que, no seu limite da dor, preferiu deixar a vida. Cada qual tem seu limite para qualquer tipo de dor. A dele era moral. Teve a reputação, construída ao longo da vida, destruída num único lance, com a prisão seguida de humilhações. Ele e seus companheiros investigados foram despidos, jogados numa cela com outros criminosos e, depois de liberado, foi impedido de frequentar a universidade que dirigia. Tudo sob as luzes da mídia, sem que os argumentos de defesa fossem da mesma forma iluminados ou levados em conta pelos investigadores da Polícia Federal. Que dor maior pode haver para quem dedicou a vida a construir e gerir o conhecimento?
A investigação que levou o ex-reitor ao suicídio depois da humilhação não foi parte da Operação Lava Jato. Mas foi da Lava Jato que saíram a cultura punitivista e os agentes que conduziram a investigação sobre desvios na UFSC a partir de 2006, culminando com a prisão do reitor que assumiu apenas em 2016. Da Lava Jato saiu a delegada da Polícia Federal Erika Marena, que conduziu o inquérito. Da Lava Jato saiu o costume de apontar obstrução da Justiça em qualquer medida defensiva, inclusive no pedido de acesso aos autos, como fez o ex-reitor.
Coincidência ou conveniência, o juiz Sergio Moro declarou ontem que a Lava Jato está perto de chegar ao fim. Não é a Lava Jato em si que precisa acabar, se ainda houver ilícitos a investigar. O que precisa acabar é a cultura que ela semeou, da presunção da culpa, da expiação antes do julgamento, da inobservância do devido processo legal em nome do combate à corrupção. Não há moralidade na violência moral.
TEREZA CRUVINEL. Colunista do 247, Tereza Cruvinel é uma das mais respeitadas jornalistas políticas do País.
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