05/04/2010
Ratzinger quer trancar a Igreja num mosteiro beneditino: vai levar com ele os padres pedófilos?
Escrivinhador 04/04/2010
Rodrigo Vianna
O papa Ratzinger e o teólogo brasileiro Leonardo Boff são velhos conhecidos. Foi Ratzinger - como chefe da moderna (!) Inquisição - quem impôs a Boff o "silêncio obsequioso", em 1984.
Na época, o cardeal alemão mandou o brasileiro se calar e, durante o julgamento em Roma, teria afirmado: "Eu conheço o Brasil, aquilo que vocês fazem nas Comunidades Eclesiais de Base não é verdade, o Brasil não tem a pobreza que vocês imaginam, isso é a construção da leitura sociológica, ideológica, que a vertente marxista faz. Vocês estão transformando as Comunidades Eclesiais de Base em células marxistas”.
Mais detalhes podem ser lidos aqui - http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/entrevistas/leonardo-boff-e-ratzinger-velhos-conhecidos
Agora - quando de todos os lados surgem novas denúncias (segredo de polichinelo!) de abusos sexuais cometidos por padres - Boff dá o troco. E defende que é chegada a hora de a Igreja abolir o celibato. Vale a pena ler o artigo de Boff - http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,licao-por-linhas-tortas,533470,0.htm.
Antes, convem lembrar que Ratzinger não calou só Leonardo Boff. Ele foi o homem que - sob o manto protetor de João Paulo II - conduziu a virada conservadora na Igreja Católica.
No Brasil e na América Latina, isso foi sentido com muita força: o ataque sistemático à Teologia da Libertação, o desmonte do poder de Dom Paulo Evaristo Arns... Tudo isso foi obra de Ratzinger.
O velho cardeal alemão comanda uma corrente católica que fez uma escolha clara: com o expurgo de sua ala mais "progressista", a Igreja pode até ficar menor - desde que fique mais coesa!
Não é à toa (dizem alguns teólogos) que Ratzinger adotou o nome de Bento XVI quando foi escolhido para ocupar o trono de São Pedro, em Roma.
São Bento foi o fundador de uma ordem que teve papel fundamental na Europa, quando a "cristandade" foi invadida pelos chamados "bárbaros". Nos mosteiros beneditinos, preservou-se a tradição cristã.
Bento XVI não se importa de ser um papa - eventualmente - menos popular. Se os tempos são de tormenta (espiritual), que os católicos recolham-se (simbolicamente) aos mosteiros e preservem suas tradições.
Ok, posso compreender bem esssa estratégia. Mas faltou combinar com os adversários e com o tempo presente...
Será que entre as tradições a presevar estão os abusos sexuais e os escândalos de pedofilia? Contra isso, não adianta buscar o refúgio dos mosteiros. No século XXI, isso não vai resolver.
Sei que há - entre os católicos - milhões de fiéis que levam a sério os ensinamentos de Jesus. Acredito e respeito essa gente.
A princípio, todo o debate gerado pelas denúncias de abuso sexual é um problema interno dos católicos, certo?
Não. Errado.
Isso seria verdade se a Igreja fosse um clube fechado, a impor suas verdades somente a seus fiéis. Aconntece que a Igreja Católica tem a prentensão de ditar normas e de interferir em assuntos que afetam diretamente também os não-católicos.
Ainda hoje entro num Tribunal em São Paulo, e vejo um crucifixo pendurado. Pergunto-me: por que eu, que pago impostos e não sou católico, preciso conviver com um símbolo que não me diz respeito?
É a força da tradição...
Má tradição.
A boa tradição (do pluralismo laico) diz que qualquer um que cometer crimes deve ser submetido à lei. Tenha ou não a proteção de instituições poderosas.
Hoje, posso escrever isso com alguma traquilidade. Há 500 anos, corria o risco de ir para a fogueira.
Se a Igreja - ainda hoje - tem a pretensão de influir em todas as esferas, dá-me o direito de igualmente palpitar sobre essa tradição em que - afinal - foram criados meus avós, meus pais e tantos bons amigos...
Então, faço minhas as palavras de Boff: esqueçam essa história de celibato, isso é fonte de perversões tremendas!
Boff diz isso de maneira muito mais elaborada, claro: "o celibato não pode nascer de uma carência de amor, ao contrário: deve resultar de uma superabundância de amor a Deus que transborda para os que estão a sua volta. Por que a Igreja romano-católica não dá um passo e abole a lei do celibato? Porque é contraditório com a sua estrutura. Ela é uma instituição total, autoritária, patriarcal e altamente hierarquizada. Ela abarca a pessoa do nascimento à morte. O poder conferido ao papa, para uma consciência cidadã mínima, é simplesmente tirânico."
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