12/04/2010
Quo Vadis, Brasil?Durante décadas o Brasil flertou com o futuro e se afundou no passado. O último naufrágio se deu durante o governo Fernando Henrique, que terminou em clima de catástrofe. Deve-se perguntar por quê.
Flávio Aguiar*
Fernando Henrique tinha tudo para capitalizar, por exemplo, o fim da inflação macro-pluviométrica que pulverizava a vida dos mais pobres, por exemplo. Mas não conseguiu. Ele (e não se deve esquecer o ex-ministro do Planejamento, José Serra) saiu do atoleiro para morrer no pântano. Que pântano? O das suas idéias.
Que idéias eram essas? Apesar de alguns pontos positivos (é bom não esquecer que FHC foi dos primeiros governantes a condenar o golpe contra Hugo Chavez em 2002), em geral a “era FHC” é marcada por uma acentuada visão (ao invés de teoria...) de dependência em relação à orquestra de câmera das “principais” economias do mundo – o ocidental, é claro. De lá para cá, do lado dos políticos, arautos midiáticos, diplomatas (em geral aposentados) e outros aliados do campo da direita brasileira, acentuou-se esse viés, vezo, mania, monomania, sei lá, se querer trazer o Brasil “de volta” ao aprisco dos “grandes”, como ovelha temerosa diante de alcatéias de lobos vorazes. Esse movimento pode ter-se acentuado por mero oportunismo crítico diante das medidas ousadas, algumas inovadoras, da política externa do governo Lula.
Mas fica claro também que o sustentáculo desse “senso de oportunidade” é mesmo uma visão anacrônica do mundo em que vivemos, dominado hoje por uma rápida mudança de padrões e paradigmas em termos de política internacional.
É claro que o mundo continua governado pelos Estados Unidos, tanto por seu peso militar como econômico. Mas os pesos hoje e as medidas são muito diversas das de 20 ou 30 anos atrás. Nenhuma medida de peso será tomada, em escala planetária, sem, para dizer o mínimo, a complacência de Washington. Mas essa complacência teve de se ampliar muito, e não só pelo peso da China nos negócios internos e externos dos EUA.
O G-8 sucumbiu perante o contraste da grandeza de suas intenções e a pequenez política a que se viu reduzido, com a crise que lhe corroeu as principais economias. Teve de sair de sua bacia e mergulhar na sanga meio descontrolada, mas inevitável, do G-20, pois sem o concurso dos outros países desse grupo ampliado, permaneceria impotente.
Para ficarmos com foco no Brasil: ao contrário do que apregoam os críticos ferozes da nossa política externa de hoje, os Estados Unidos tiveram de projetar uma nova paisagem comercial em relação a nós ( no que toca ao algodão, por exemplo) e também tiveram de projetar um novo acordo de cooperação no campos da defesa e no militar. Além disso, é manifesto que Washington se preocupa com a questão nuclear no Irã, e por isso mesmo está positivamente atento às conversações entre Brasília e Teerã. De todo modo, deve-se perguntar: por que raios o Brasil não ia conversar com Teerã, quando este está a fazer negócios e acordo com Caracas, ao lado da Rússia? E o Brasil teria por acaso de mandar seu cardeal primaz abençoar as bases norte-americanas na Colômbia? Ou abrir caminho para a instalação de uma base norte-americana na tríplice fronteira?
Dentro dessa perspectiva, uma vitória das oposições na eleição de 2010 significaria um tremendo recuo no tempo e no espaço para o Brasil. O povo terá que decidir também sobre o rumo que o país tomará na nova paisagem internacional.
*Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.
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