domingo, 13 de abril de 2014

Contraponto 13.755 - "O PRÉ-JULGAMENTO DE ANDRÉ VARGAS"

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13/04/2014

O PRÉ-JULGAMENTO DE ANDRÉ VARGAS

Apesar da imprensa, juiz define acusações criminais contra parlamentar como "prematuras" e "absolutamente estranhas"

 IstoEIndependente - 12/04/2014

Paulo Moreira Leite

 Acabo de fazer uma descoberta impressionante sobre as acusações contra o deputado federal André Vargas. Depois de renunciar a vice-presidência da Câmara, ele irá enfrentar uma ameaça de cassação de seu mandato.
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O mais preocupante é a vontade desenfreada de culpar e punir sem o cuidado de sustentar  cada denúncia em provas robustas, e sem dar ao acusado o direito de provar sua inocência.  Não sei se André Vargas é culpado ou inocente das denúncias que tem sido veiculadas nos últimos dias.
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Mas ele tem sido denunciado  com tanta veemência que, mais tarde, seus acusadores terão imensa dificuldade para admitir seus erros – se eles forem demonstrados. Isso também explica, na minha opinião, a dificuldade de tantos veículos para fazer uma revisão sobre aquilo que se escreveu em 2005 – e não se conseguiu demonstrar depois.
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André Vargas parece ingressar naquela categória de cidadão acusado com tamanha brutalidade que jamais conseguirá mostra que é inocente.
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Veja só: no dia 7 de abril o  juiz Sergio Fernando Moro, responsável pelo inquérito da Operação Lava Jato, que investiga o império de 10 bilhões de reais do doleiro Alberto Youssef, produziu duas afirmações essenciais sobre o papel de André Vargas no caso.
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Falando sobre as relações entre os dois, que os meios de comunicação tem descrito naquela linguagem de Gil Gomes nos bons tempos do rádio policial, o juiz escreveu que é “prematura a afirmação de que tal relação teria natureza criminosa.” Olha só. É prematuro..
 No mesmo despacho, o juiz fala mais.
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Afirma que crimes como “evasão de divisas, corrupção  de empregado público da Petrobrás e  lavagem de dinheiro” como sendo absolutamente estranhos à qualquer relação Alberto Youssef e André Vargas.” Está lá: “absolutamente estranho. “ Palavra de juiz. Para ele, uma coisa nada tem a ver com a outra.
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André Vargas tem algo a ver com corrupção na Petrobrás? Nada. Com lavagem de dinheiro? Nada.

Tem a ver com o que mesmo? Com um passeio – condenável – de jatinho até João Pessoa com a família.
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Vamos combinar.
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É uma prática tão generalizada entre cidadãos que se aproximam do dinheiro e do poder que muitos jornalistas que o acusam de aceitar favores indevidos certamente aceitaram viajar nessas condições, sem culpa nem dores na consciência.

Ah...Ele também tem um prestação de contas incoerente da campanha de 2006. Crime eleitoral, caixa 2..
Sabe: aquilo que Delúbio Soares admitiu em 2005 mas ninguém considerou porque é grave, é errado, mas é um delito menor.

Embora a medicina admita bebês prematuros, que precisam de cuidados especiais para levar uma vida normal, no vocabulário jurídico a palavra tem outro sentido.
É aquilo que não pode ser dito.
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Absolutamente estranho é aquilo que não é.

Você entendeu. Duas semanas depois que os telejornais e revistas do país já haviam dedicado longas reportagens sobre o caso, competindo pelos adjetivos mais escandalosos, pode-se conhecer a palavra da lei. O juiz Sérgio Moro, que chegou a auxiliar a ministra Rosa Weber, do STF, no julgamento da AP 470, afirma que não se encontrou, até o momento prova de que que André Vargas e o doleiro Alberto Youssef cometessem crimes..
Eu acho impressionante. Sabe por que?

Porque a história política-jurídica-eleitoral da AP 470 parece repetir-se – e só não vê quem não quer.
Acusa-se primeiro para se provar depois. Acusa-se muito, com repetição e veemência.
Li hoje, num jornal, que André Vargas é “suposto” sócio de Youssef. Quer apostar que, em 24 horas, não se falará mais em “suposto”?
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Por que não investigar melhor e reconhecer que é uma acusação “prematura”? Aliás: por que você precisou aguardar por este modesto blogue para saber o despacho do juiz de um caso que está em todas as manchetes há dias? Eu, este humilde blogueiro...

Porque isso não dá leitura nem audiência. Dúvida não vende jornais,  dirá o editor. Suposto livra a cara de quem não pode sustentar o que diz mas dá a impressão de que a pessoa sabe o que está falando.  Esconde o teria, o seria, o poderia – truques que o leitor já conhece.
Mas não é só isso. O  Mercado de Notícias não é só o Mercado de Notícias, como explica o filme de Jorge Furtado.
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É eleição presidencial, também.

O professor Lincoln Secco mostrou que, depois das denúncias de Roberto Jefferson, as revistas semanais deram 17 capas consecutivas sobre o caso em 2005.
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O saldo é que, pela única vez em seus oito anos de governo, Luiz Inácio Lula da Silva ficou com aprovação negativa. Ele se recuperou e venceu a eleição – em outubro de 2006.

Quem já olhou no calendário de 2014 sabe o que o tempo é muito mais curto dessa vez. Não é preciso ser um marqueteiro para ver quem pode ganhar com a alta velocidade, certo?

Dirceu perdeu o mandato em 1 de dezembro. Dois dias antes, a CPMI já estava de posse de um documento essencial para colocar em questão o pilar da denúncia contra ele – a tese de que o PT usava dinheiro público para comprar o voto de parlamentares.
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A compra de votos jamais seria demonstrada, nós sabemos.
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A tese de que ela era feita através de recursos públicos já estava desmentida em 29 de novembro de 2005, em documento confidencial que a Visanet enviou a CPMI. Ali a empresa  esclarecia que era a única proprietária dos recursos empregados nas campanhas do cartão Visa com a bandeira do Banco do Brasil.
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Também se definia como “empresa de capital privado” . Definia sua relação com o tesoureiro Delúbio Soares como “nenhuma”. Você leu? Soube disso? E olhe: a CPMI sabia disso dois antes de cassar Dirceu, numa noite triste para a política brasileira,  quando  um “suposto” cronista observou, como se fosse um crítico do Zorra Total, que a resistência do parlamentar ficara monótona, burocrática. 

Mesmo assim, em março de 2006 Dirceu foi acusado de fazer todas essas coisas na condição de “chefe da quadrilha.” Em dezembro de 2012, ele foi condenado. E em março de 2014 o STF reconheceu que o crime de quadrilha não fora demonstrado, absolvendo Dirceu.
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Advogados insuspeitos de qualquer simpatia petista, militantes ativos do conservadorismo puro e duro, dizem que não se garantiu o amplo direito de defesa.

Revisando o desmembramento, o STF mandou o tucano Eduardo Azeredo para a primeira instância, onde terá direito a um segundo grau de jurisdição e possivelmente terá a pena prescrita, quando a receber, prescrita. Em agosto de 2012, quando negou o STF negou-se a fazer o mesmo com acusados do PT, foi aplaudido pela decisão, a caminho do “maior julgamento da história.”

Viu como é bom não falar o que não deve ser dito?


Paulo Moreira Leite. Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa". 

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