18/08/2014
As eleições e a mídia
A influência dos meios de comunicação vai além da produção de noticiário. Eles contratam as pesquisas e organizam os debates
Carta Capital —
publicado
18/08/2014 11:18
.
Está mais que na hora de discutir a
interferência da mídia no processo eleitoral. Na imagem, a entrevista de
Aécio Neves no Jornal Nacional
Na próxima
terça 19, com o início da propaganda eleitoral na televisão e no rádio,
entraremos na etapa final da mais longa eleição de nossa história.
Começou em 2011 e nossa vida política gira em torno dela desde então.
A batalha da sucessão de Dilma Rousseff
foi iniciada quando cessou o curto período de lua de mel com as
oposições, no primeiro ano de governo. Talvez em razão do vexame
protagonizado por José Serra na campanha, o antipetismo andava em baixa.
Durou pouco. Na entrada de 2012, o clima
político deteriorou-se. As oposições perceberam que, se não fizessem
nada, marchariam para nova derrota na eleição deste ano. Ao analisar as
pesquisas de avaliação do governo e notar que Dilma batia recordes de
popularidade a cada mês, notaram ser elevadas as possibilidades de o PT
chegar aos 16 anos no poder. E particularmente odiosa. Serem derrotadas
outra vez por Dilma doía mais do que perder para Lula.
Ela era “apenas”
uma gestora petista, sem a aura mitológica do ex-presidente. Sua
primeira eleição podia ser creditada, quase integralmente, à força do
mito. Mas a segunda, se viesse, seria a vitória de uma candidatura
“normal”. Quantas outras poderiam se seguir?
A perspectiva era inaceitável para os
adversários do PT. Na sociedade, no sistema político e no empresariado,
seus expoentes arregaçaram as mangas para evitá-la. A ponta de lança da
reação foi a mídia hegemônica, em especial a Rede Globo.
Recordar é viver. Muitos se esqueceram,
outros nem souberam, mas a realidade é que a “grande imprensa” formulou
com clareza um projeto de intervenção na vida política nacional.
Não é teoria conspiratória. Quem disse
que os “meios de comunicação estão fazendo de fato a posição
oposicionista deste País, já que a oposição está profundamente
fragilizada”, foi a Associação Nacional de Jornais, por meio de sua
presidenta, uma das principais executivas do Grupo Folha.
Enunciada em
2010, a frase nunca foi tão verdadeira quanto de 2012 para cá.
Como resultado da atuação da vanguarda
midiática oposicionista, estamos há três anos imersos na eleição de
2014. A derrota de Dilma é buscada de todas as formas. O “mensalão”?
Joaquim Barbosa? A “festa cívica” do “povo nas ruas”? O “vexame” da Copa
do Mundo? A “compra da refinaria”? O “fim do Plano Real”? A “volta da
inflação”? O “apagão” na energia? A “crise na economia”? A
“desindustrialização”? O “desemprego”?
Nada disso nunca teve verdadeira
importância. Tudo foi e continua a ser parte do esforço para diminuir a
chance de reeleição da presidenta.
Ou alguém acha que os analistas e
comentaristas dessa mídia acreditam, de fato, na cantilena que apregoam
quando se vestem de verde-amarelo e se dizem preocupados com a moral
pública, os empregos dos trabalhadores ou a renda dos pobres? Ou que
queiram fazer “bom jornalismo”?
Temos agora uma ferramenta para elucidar o
papel da mídia na eleição. Por iniciativa do Instituto de Estudos
Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, está no
ar o manchetômetro (http://www.manchetometro.com.br), um site que
acompanha a cobertura diária da eleição na “grande imprensa”: os jornais
Folha de S.Paulo, O Globo e O Estado de S. Paulo, além do Jornal Nacional da Globo (como se percebe, os organizadores do projeto julgaram desnecessário analisar o “jornalismo” do Grupo Abril).
Lá, vê-se que os três principais
candidatos a presidente foram objeto, nesses veículos, de 275
reportagens de capa desde o início de 2014. Aécio Neves, de 38, com 19
favoráveis e 19 desfavoráveis. Tamanha neutralidade equidistante cessa
com Dilma: ela foi tratada em 210 textos de capa. Do total, 15 são
favoráveis e 195 desfavoráveis. Em outras palavras: 93% de abordagens
negativas.
É assim que a população brasileira tem
sido servida de informações desde quando começou o ano eleitoral. É isso
que faz a mídia para exercer o papel autoassumido de ser a “oposição de
fato”.
O pior é que a influência dessas empresas
ultrapassa o noticiário. Elas contratam as pesquisas eleitorais que
desejam e as divulgam quando e como querem. E organizam os debates entre
candidatos.
Está mais que na hora de discutir a interferência dessa mídia no processo eleitoral e, por extensão, na democracia brasileira.
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