15/01/2015
Mudança na política da China para o mundo
Redecastorfoto - quinta-feira, 15 de janeiro de 2015
10/1/2015, [*] William Engdahl, NEO − New Eastern Outlook
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Já estive na China, ao longo dos anos, mais de uma dúzia de vezes.
Falei
com gente de todos os níveis da estrutura política, e uma coisa acabei
por compreender com total clareza: quando Pequim faz mudança política
profunda e de longo alcance, os chineses realmente mudam, com cuidado,
com firme decisão, e depois de a mudança ter sido muito profundamente
deliberada.
E quando fixam um novo consenso, eles o põem em execução para que produza efeitos notáveis em todos os níveis.
Esse é o segredo dos 30 anos do milagre econômico dos chineses.
Agora, a alta liderança da China acaba de tomar a decisão política correspondente à nova mudança.
Daqui em diante, e ao longo dos próximos dez anos, os chineses transformarão o mundo que conhecemos.
Xi Jinping, Presidente da China |
Dia
29/11/2014, aconteceu em Pequim uma reunião pouco comentada, mas
altamente significativa, que aconteceu enquanto quando Washington estava
absorvida em suas tentativas para ‘'incapacitar'’ e, afinal,
desestabilizar a Rússia de Putin. Os chineses realizaram o que chamaram
de Conferência Central sobre Trabalho Relacionado a Assuntos Exteriores. Ali Xi Jinping, presidente da China e presidente da Comissão Militar Central pronunciou o que foi chamado de “Importante Discurso”.
Leitura
cuidadosa do documento oficial do Ministério de Relações Exteriores da
China sobre aquela Conferência confirma que, sim, foi discurso
“importante”.
A
liderança política chinesa já completou e agora divulgou oficialmente
uma mudança estratégica global nas prioridades geopolíticas da política
exterior da China.
A
China já não vê como a mais alta prioridade o seu relacionamento com os
EUA nem, sequer, com a União Europeia. Em vez disso, definiram agora um
novo grupo de países prioritários, no novo mapa geopolítico que os
chineses discutiram demoradamente e agora acabaram de definir.
Esse
novo mapa inclui a Rússia e todos os países BRICS com suas economias em
rápido desenvolvimento; inclui os vizinhos asiáticos da China, países
africanos e outros países em desenvolvimento.
Timothy Heath |
Prova
de que é discurso importante, muitos já começaram a falar sobre
“maiores riscos de confronto com o mundo desenvolvido” (por exemplo,
Timothy Heath, em The Diplomat). [Aqui há um parágrafo truncado, ininteligível (NTs)].
No discurso que fez aos participantes daquela Conferência, o presidente Xi destacou um subgrupo de países em desenvolvimento: “grandes países em desenvolvimento” (kuoda fazhanzhong de guojia). Com esses, a China vai “fortalecer
a unidade e a cooperação e integrar firmemente [o desenvolvimento
chinês] com o desenvolvimento comum de todos os grandes países em
desenvolvimento”, disse Xi.
Segundo
intelectuais chineses, esses países aparecem agora como parceiros
especialmente importantes “para apoiar a reforma da ordem
internacional”. Nesse grupo estão Rússia, Brasil, África do Sul, Índia,
Indonésia e México, quer dizer, os parceiros BRICS da China, mais
Indonésia e México. A China também deixou de se autodefinir como “país
em desenvolvimento”, sinalizando que há uma nova autoimagem [vide Sobe a periferia e rebaixam-se as ‘grandes potências’ (ing.) (NTs)].
O
Vice-Ministro de Relações Exteriores, Liu Zhenmin, indicou outro
aspecto significativo da nova política quando, na Conferência em Pequim,
declarou que “o desequilíbrio entre a segurança política da Ásia e o
desenvolvimento econômico tornou-se questão cada dia mais importante”. A
proposta da China, de criar uma “comunidade de destino partilhado”,
visa a resolver esse desequilíbrio. Implica que a China terá laços
diplomáticos e econômicos mais próximos com Coreia do Sul, Japão, Índia,
Indonésia, até o Vietnã e as Filipinas.
Mandatários dos BRICS - Fortaleza/2014 |
Em
outras palavras, embora o relacionamento com os EUA vá continuar como
mais alta prioridade, por causa do poderio militar e financeiro dos EUA,
deve-se esperar ver uma China cada dia mais ativa contra o que vê como
interferência dos EUA. É novidade que já se viu claramente em outubro,
quando o jornal People Daily do Partido Comunista Chinês publicou editorial, durante a ‘revolução dos guarda-chuvas’ em Hong Kong, que interrogava “Por que Washington tanto se interessa por revoluções coloridas?” O artigo citava nominalmente, como envolvida naquela “operação”, a ONG National Endowment for Democracy,
dedicada a “mudanças de regime” pelo mundo e mantida pelo
vice-presidente dos EUA. Esse tipo de denúncia direta era impensável há
seis anos, quanto Washington tentou criar problemas para Pequim
insuflando protestos violentos do movimento do Dalai Lama no Tibete,
pouco tempo antes dos Jogos Olímpicos de Pequim de 2008.
A
China está agora rejeitando abertamente a crítica usual do ocidente
sobre “direitos humanos” e recentemente declarou um esfriamento nas
relações diplomáticas entre China e Reino Unido, depois que o governo de
Cameron ter recebido o Dalai Lama; e entre China e Noruega, depois que o
país reconheceu o dissidente Liu Xiaobo. Ao longo do ano passado, passo
a passo, Pequim cuidou de esvaziar as críticas de Washington contra os
direitos históricos que a China declara ter no Mar do Sul da China.
Mas
talvez mais significativo de tudo, em meses recentes a China promoveu
firmemente uma agenda para construir instituições alternativas aos FMI e
Banco Mundial controlados pelos EUA – o que, se o movimento for
bem-sucedido, pode ser golpe devastador contra o poder econômico dos EUA.
Para resistir em oposição à tentativa, pelos EUA, de isolar
economicamente a China na Ásia, com a criação de uma Parceria EUA
Trans-Pacífico [US Trans-Pacific Partnership (TPP)], Pequim anunciou sua própria visão chinesa de uma Área de Livre Comércio do Pacífico Asiático [Free Trade Area of the Asia-Pacific (FTAAP)], acordo comercial “plenamente inclusivo, padrão ganha-ganha”, que realmente promove a cooperação no Pacífico Asiático.
Elevar as relações russas
Nesse
momento, o que emerge claramente é a decisão da China de pôr sua
relação com a Rússia de Putin no centro da nova prioridade estratégica
chinesa. Apesar das décadas de desconfiança depois da ruptura
sino-soviética de 1960, os dois países iniciaram cooperação em
profundidade que é completamente sem precedentes. As duas maiores
potências territoriais da Eurásia estão costurando laços econômicos que
criam o único “desafiante” potencial imaginável, capaz de ameaçar a
supremacia global norte-americana, como a descrevia o estrategista da
política externa dos EUA, Zbigniew Brzezinski, em 1997, em seu O Grande Tabuleiro de Xadrez.
Xi Jinping e Vladimir Putin brindam acordos Rússia- China |
No momento em que Putin combate uma guerra sem tréguas de sanções econômicas impostas pela OTAN para derrubar seu governo, a China assinou não um, mas vários negócios-gigantes
com empresas estatais russas, Gazprom e Rozneft, que permitem à Rússia
enfrentar em melhores condições a crescente ameaça às suas exportações
de energia para a Europa ocidental, que é questão de vida ou morte para a
economia russa.
Durante
a reunião da Associação dos Países Exportadores de Petróleo em Pequim,
Obama foi oficialmente rebaixado no panteão diplomático, ao ser mandado
postar-se ao lado da esposa de um presidente asiático, enquanto Putin
permanecia ao lado de Xi. Os símbolos têm grande peso político,
especialmente na China – e são parte essencial da comunicação.
Na mesma reunião, Xi e Putin assinaram o acordo
para construir um gasoduto da Sibéria à China, chamado Rota Oeste, que
se conectará ao histórico gasoduto Rota Leste já acordado com a Rússia,
em maio. Quando os dois estiverem completados, a Rússia estará
fornecendo 40% do gás natural de que a China necessita.
Na
mesma ocasião, em Pequim, o Ministro do Exército da Rússia, anunciou
importantes novas áreas de cooperação entre as Forças Armadas da Rússia e
o Exército da Libertação do Povo, da China.
Agora,
em plena guerra total que Washington faz contra o rublo russo, a China
anunciou que está pronta para, se solicitada, ajudar seu parceiro russo.
Dia 20/12/2014, em meio a uma queda histórica na cotação do rublo em
relação ao dólar, o Ministro de Relações Exteriores, Wang Yi, disse que a
China proverá ajuda à Rússia, se necessária, e tem confiança de que a
Rússia conseguirá superar suas atuais dificuldades. Ao mesmo tempo, o
Ministro do Comércio, Gao Hucheng, disse que expandir uma operação de swap de
moedas entre as duas nações e fazer uso mais amplo do yuan no comércio
bilateral são operações que, com certeza, darão grande alívio à Rússia.
Sistemas de exploração e transmissão de gás na Rússia Oriental (clique na imagem para aumentar) |
Há
outras sinergias entre Rússia e China, nas quais os dois países se
autocoordenam em relação mais próxima, inclusive a decisão de Putin de
encontrar-se na primavera com o presidente da Coreia do Norte, e com a
Índia, aliado de longa data dos russos, e com quem a China tem relações
sensíveis desde os anos 1950s. Assim também a Rússia tem posição forte
com o Vietnã desde a Guerra Fria e a ajuda que os russos deram para a
pesquisa e extração de petróleo em águas do Vietnã.
Em
resumo, tão logo haja estratégia geopolítica harmônica entre Rússia e
China, o pior pesadelo geopolítico de Brzezinski ganhará vida própria,
graças, em grande parte, às próprias políticas estúpidas dos
neoconservadores maníacos por guerras que governam Washington, do
próprio presidente Obama e das famílias milionárias sem amor nem pudor,
que pagam todas as contas desse pessoal.
Todos
esses movimentos, embora todos carregados de inúmeros perigos,
sinalizam que a China compreendeu em profundidade o jogo geopolítico de
Washington e as estratégias dos neoconservadores norte-americanos
obcecados por guerras; e que, como a Rússia de Putin, a China também não
tem nenhuma intenção de ajoelhar-se ante o que interpretam como uma
Washington-tirana-global. O ano de 2015 surge como um dos mais decisivos
e interessantes da história moderna.
[*] Frederick William Engdahl é jornalista, conferencista e consultor para riscos estratégicos. É graduado em política pela Princeton University; autor consagrado e especialista em questões energéticas e geopolítica da revista online New Eastern Outlook.
Nascido
em Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos, é filho de F. William
Engdahl e Ruth Aalund (nascida Rishoff). F.W. Engdahl cresceu no Texas, e
depois de se formar em engenharia e jurisprudência na Princeton University em 1966 (bacharelado), e pós-graduação em economia comparativa da University of Stockholm 1969-1970.
Trabalhou como economista e jornalista free-lance em Nova York e na
Europa. Começou a escrever sobre política do petróleo, com o primeiro
choque do petróleo na década de 1970. Tem sido colaborador de longa data
do movimento LaRouche.
Seu primeiro livro foi A Century of War: Anglo-American Oil Politics and the New World Order,
onde discute os papéis de Zbigniew Brzezinski, de George Ball e dos EUA
na derrubada do xá do Irã em 1979, que se destinava a manipular os
preços do petróleo e impedir a expansão soviética. Engdahl afirma que
Brzezinski e Ball usaram o modelo de balcanização do mundo islâmico
proposto por Bernard Lewis.Em 2007, completou seu livro Seeds of Destruction: The Hidden Agenda of Genetic Manipulation. Seu último livro foi: Gods of Money: Wall Street and the Death of the American Century (2010).
Engdahl é autor frequente do sítio do Centre for Research on Globalization. É casado desde 1987 e vive há mais de duas décadas perto de Frankfurt am Main, na Alemanha.
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