domingo, 19 de março de 2017

Nº 21.027 - "Aécio, Odebrecht e Furnas: é impossível dissociar o tucano das denúncias na estatal mineira. Por Joaquim de Carvalho"


19/03/2017


Aécio, Odebrecht e Furnas: é impossível dissociar o tucano das denúncias na estatal mineira. Por Joaquim de Carvalho


Diário do Centro do Mundo - Postado em 19 Mar 2017por : Joaquim de Carvalho


Em obras


por  Joaquim de Carvalho

A gigante de energia do Brasil Furnas aparece de novo no centro de um escândalo de corrupção relacionada ao senador Aécio Neves, presidente do PSDB.

E, de novo, o senador tenta se desvincular da empresa e diz que são mentirosas as delações de que a Odebrecht acertou com ele um pagamento de 50 milhões de reais pelo contrato de construção de uma usina em Rondônia.

Ignorar a presença de Aécio nas denúncias de corrupção de Furnas é como negar que a sede da empresa fica na rua Real Grandeza, em Botafogo.

Simplesmente impossível.

O nome de Aécio aparece na estrutura de engenharia de desvio de dinheiro de Furnas desde 2005, quando o então deputado federal Roberto Jefferson denunciou o escândalo do mensalão.

Aliás, um dos motivos da eclosão do escândalo do mensalão é justamente a queda de braço pelo controle do cofre de Furnas, que opôs de um lado Aécio Neves e, de outro, Jefferson.

Sabe-se dessa história lendo os depoimentos de Jefferson da época e o seu livro “Nervos de Aço”.

O diretor de Engenharia de Furnas, responsável pelas obras, era Dimas Toledo, que o governo Lula herdou do governo de Fernando Henrique Cardoso.

Segundo Jefferson, Lula ofereceu o cargo ao seu partido, o PTB de Jefferson e o pressionou para que nomeasse logo alguém “com currículo”, ou seja, qualificado.

Mas, dois anos depois da posse de Lula, a nomeação não saiu, segundo Jefferson por resistência do então chefe da Casa Civil, José Dirceu.

“Tem pressão do Aécio”, teria dito Dirceu a Jefferson.

Ceder a Aécio teria sido uma estratégia de Dirceu: fortalecer o governador de Minas para enfraquecer Serra, no território minado do PSDB.

Divergências como esta, entre Jefferson e Dirceu, se acumularam até que o deputado denunciou o esquema do mensalão – que, registre-se, era também uma herança do PSDB de Minas Gerais que o governo do PT aceitou.

Nas disputas de bastidores pelo controle da CPI do mensalão, apareceu a lista de Furnas, com o nome de 156 deputados financiado pelo caixa 2 da empresa nas eleições de 2002.

Aécio era a estrela da lista, e para desqualificá-la entrou em operação o aparato juidiciário-ministerial-policial sob a sua influência em Minas, que prendeu o denunciante da lista.

Ao contrário do que sustentava o aparato judiciário-ministerial-policial de Minas, a lista não é falsa, mas a confusão em torno do denunciante anestesiou a repercussão do caso durante alguns anos.

Até que o crime prescrevesse para alguns, entre eles o apadrinhado de Aécio, Dimas Toledo, que tem mais de 70 anos de idade.

Pode-se ligar Aécio a Dimas de diferentes maneiras – por cima, ouvindo de novo o deputado Roberto Jefferson, por exemplo, ou por baixo, aprofundando a investigação sobre empresas que prestaram serviços no esquema de Furnas e admitem o pagamento de propina.

Em 20 de dezembro de 2015, quando eu finalizava uma das últimas reportagens da série sobre a Lista de Furnas, recebi um e-mail de Renato Freire, que mais tarde vim a descobrir que se trava de um empresário que fez negócios com Dimas Toledo.

“Joaquim, se você realmente quer chegar a fundo sobre a lista de Furnas, você tem que investigar o Sr. Dimas Toledo”, começava ele.

Renato sugeria ir a Bocaina, cidade de Dimas, e descobrir como duas propriedades de lá passaram para o domínio da família do diretor de Furnas: um galpão na entrada da cidade e a fazenda Jacuí, num município vizinho, Liberdade.

Também dava uma relação de nomes que operam para ele e sugeria pesquisar a propriedade de imóveis em Resende, no Estado do Rio de Janeiro, 50 quilômetros de distância de Bocaina.

Em Resende, a mulher de Dimas é sócia de um escritório de advocacia e dona de uma imobiliária, tantos são os imóveis que a família tem para administrar.



Em Bocaina de Minas, o galpão na entrada da cidade está em nome de Gabriel Toledo, sócio também de um laticínio. A fazenda Jacuí é do filho, que também se chama Dimas, e é deputado federal pelo PP.

Renato disse que tanto o galpão quanto a fazenda eram dele e passaram para o nome de Dimas em razão de um contrato que ele obteve como terceirizado da empreiteira Odebrecht, contratada por Furnas, para a construção de usina no rio Madeira, em Rondônia – usina que está no centro das novas delações contra Aécio.

Renato Freire também teve máquinas pesadas, como tratores, que eram alugadas para a construtora Delta, titular do contrato de pavimentação da estrada que liga Bocaina de Minas a Liberdade, numa distância de aproximadamente 20 quilômetros.

O mais importante da história é que a pavimentação da rodovia foi contratada pelo governo de Minas Gerais, quando Aécio era o governador, mas quem colocou Renato no negócio teria sido Dimas Toledo.

Renato diz que se recusou a pagar propinas e começou a ter prejuízo. Foi obrigado a abandonar Rondônia e teve que vender suas máquinas em Bocaina.

Dimas é quem teria intermediado a venda, com a participação de dois parentes de Aécio, então governador: Tancredo Tolentino, o Kedo — aquele que foi preso por negociar com um desembargador, nomeado por Aécio Neves, um habeas corpus para tirar da cadeia dois homens presos em flagrante por tráfico.

O outro parente de Aécio que negociou com Renato é Frederico Pacheco de Medeiros, conhecido como Fred, que foi secretário de Aécio.

Segundo Renato, os três se reuniram na fazenda de Fred em Cláudio, a cidade de Aécio, e Kedo negociou em nome da construtora Engetostes, que é de parentes de Kedo e tem sede em Cláudio.

A Engetostes ficou com as máquinas de Renato por R$ 1 milhão, mas não teria quitado todas as parcelas.

Localizei o então prefeito de Bocaina de Minas, Wilson Moreira Maciel, que hoje mora em Cachoeira Paulista, e ele confirmou que Renato tinha mesmo uma empresa que fazia a locação de máquinas e era dono de um galpão.

Segundo o ex-prefeito, Renato também foi secretário de administração, “durante um período muito pequeno”: 45 dias, segundo o próprio Renato, tempo suficiente para ele descobrir irregularidades na gestão anterior e ser pressionado a deixar o cargo. Quem o pressionou? Dimas.

Depois do primeiro e-mail, no dia 20 de dezembro, troquei mais 47 mensagens com Renato, mas ele cessou o contato, por temer pela segurança da sua família.

“Tenho informações pra você derrubar o Dimas, que é um cara de R$ 100 milhões e pode chegar no Aécio, que é um cara de R$ 10 bilhões, e eles podem me destruir… Já te passei mais informações do que devia”, disse ele.

O empreiteiro Renato Freire é nome a ser procurado agora pelo Ministério Público ou a Polícia Federal. Mas será que existe mesmo disposição para investigar Aécio?

Quem conhece o esquema judiciário-ministerial-policial para lavar mais branco personagens a quem não se quer ou não se pode incomodar é dizer que decidiu ou solicitou abertura de inquérito – caso de Furnas.

Inquérito tem, em tese, prato de 30 dias para conclusão, mas ele permanece aberto por anos, às vezes mais de uma década. É o que aconteceu com a denúncia sobre a Lista de Furnas.

O nome de Aécio está lá, desde 2005, com a denúncia formalizada na Procuradoria Geral da República, e só agora se tem notícia de que o procurador Rodrigo Janot solicitou inquérito para investigar o caso.

No ritmo da Procuradoria Geral da República quando se trata de Aécio, pode-se apostar que, em 2029, algum procurador surgirá, solene, pedindo a abertura de outro inquérito, para investigar Aécio por graves denúncias em Furnas.

Pode-se apostar que, mantido o padrão, não dará em nada.


Sobre o Autor

Joaquim de Carvalho. Jornalista, com passagem pela Veja, Jornal Nacional, entre outros. joaquimgilfilho@gmail.com

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