domingo, 18 de outubro de 2009

Contraponto 504 - "Limites desnecessários"


18/10/2009
Limites desnecessários

Carta Capital - Delfim Netto - 16/10/2009 14:08:17

Não vejo seriedade, mais uma vez, nas projeções dos mercados financeiros, segundo as quais nossa economia deve crescer 5% em 2010 e não mais do que isso nos anos seguintes. A ideia de que se pode estabelecer um teto ao desenvolvimento brasileiro é risível.

A mesma avaliação foi feita nos primeiros anos do atual- governo, quando o “mercado” decretava que o “produto potencial” brasileiro não permitiria uma expansão anual do PIB maior que 3,4% (com tal precisão!) sem provocar a perda do controle da inflação. O Brasil ignorou o aviso e cresceu acima de 5% em 2005-2008, enquanto a taxa de inflação foi mantida comportadamente nos limites da meta.

Não se deve esperar que os “analistas financeiros” lancem um olhar mais cuidadoso para as coisas da economia real. Há uma nova agenda, ignorada em suas planilhas. O que vai determinar o ritmo de desenvolvimento econômico (e não apenas o brasileiro) será a capacidade de os países entenderem a mudança da agenda industrial, uma nova revolução em andamento que passa pelo campo da energia.

O avanço das tecnologias para substituir a origem fóssil pelas fontes de energia renovável é cada vez mais rápido nos Estados Unidos e na Europa. Países como Alemanha, Noruega e Dinamarca, em particular, desenvolveram avançada tecnologia e utilizam de forma crescente energia eólica e solar no abastecimento urbano e nas regiões de produção agrícola.

A Alemanha projeta substituir praticamente a metade da oferta de energia “suja”, nos próximos dez anos, pelas fontes limpas citadas e pela participação do combustível extraído da biomassa misturado ao diesel.

A política energética do governo Obama envolve maciços investimentos em tecnologia para produzir etanol a partir das florestas, para transformar carvão em combustível líquido sem a emissão de CO2 e para viabilizar a produção de combustíveis alternativos a partir do sorgo e de dezenas de outras espécies que sua agricultura pode ofertar. O crescimento vai depender da inovação, da utilização das tecnologias que vão produzir cada vez mais energia limpa e renovável.

Algumas vantagens brasileiras são evidentes, desde que garantida a autonomia nos dois campos vitais da energia e da alimentação. Na energia, com a tecnologia de ponta que desenvolvemos (e estamos aperfeiçoando) na produção do etanol e no aproveitamento da biomassa de inúmeros outros produtos de nossa agricultura.

Mais ainda pelo fato de que já temos um porcentual elevado de oferta de energia limpa das hidrelétricas que estará sendo ampliado, graças à construção das novas usinas, inclusive nos rios amazônicos.

Esses fatores nos permitirão organizar a exploração das reservas de petróleo do pré-sal de modo a garantir a autonomia energética pelos próximos 25 ou 30 anos. Seguramente, poderemos utilizá-las na indústria química, que nos ajudará a substituir materiais importados e na oferta de insumos para o aumento da produtividade no setor agropecuário, em lugar de simplesmente queimá-las como combustível no transporte.

O Brasil precisará aumentar substancialmente os investimentos nestas novas tecnologias, que lhe permitirão participar das mudanças profundas no processo da produção industrial que vai dominar o primeiro quarto deste século XXI.

E não pode abandonar a urgência dos projetos do PAC nos campos do transporte: o crescimento da produtividade do nosso setor agrícola depende da reconstrução da malha viá-ria, de sua expansão para atender às novas fronteiras e de investimentos nos portos, especialmente.

A manutenção da prioridade na expansão da infraestrutura dos transportes, na hidreletricidade e nos investimentos em tecnologia para a produção da energia alternativa (biomassa, eólica e solar) é fundamental para atingir rapidamente os objetivos de um crescimento anual do PIB brasileiro de 6%, 7% ou mais, perfeitamente sustentável a partir das condições atuais de nos--sa economia.

O Brasil é parte da nova agenda e tem vantagens inegáveis do ponto de vista institu-cional, pela capacidade de adaptação de nossa sociedade, pelo espírito de desenvolvimento dos empresários e dos trabalhadores, pela própria capacidade de aprendizado dos governos, que perceberam a necessidade de utilizar o investimento público como indutor do desenvolvimento pela ação do setor privado.
Delfim Netto
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