Nassif - 29/11/2009
Da Folha
Elio Gaspari
Serra é o mudo que reclame do surdo
José Serra é um tucano de vitrine. É candidato à Presidência da República, mas não sabe se será. Decidirá no ano que vem. Até lá, silêncio.
Felizmente acaba de sair o livro “Retrato de Grupo”, comemorativo do 40º aniversário do Cebrap, o centro de pesquisas criado em torno de Fernando Henrique Cardoso. Nele há uma boa entrevista de Serra, dada em julho do ano passado. Ele reclama dos juros caros, do dólar barato, dos gastos do governo e resume uma vaga plataforma econômica:
“Temos de pensar o seguinte: o Brasil deve ter hoje 190 milhões de habitantes, perto disso; daqui a dez anos, teremos dezenas de milhões de pessoas a mais no mercado de trabalho. O modelo primário exportador, para onde o país está caminhando, não é capaz de gerar empregos com o dinamismo que a oferta de trabalho exige. Ele não vai gerar desenvolvimento sustentado (e sustentável), e o país está caminhando para isso. Então é um grande desafio reinventar o desenvolvimento, como se dizia na linguagem da Cepal, hacia dentro [para dentro], junto com hacia fuera [para fora], porque voltar o desenvolvimento só hacia fuera, que é o que está acontecendo, não vai dar conta dos problemas principais do país”.
Ao final da entrevista, Serra reclama da falta de “um bom debate” e diz que essa prática é “algo interditado no Brasil de hoje”: “Infelizmente esse debate não existe, está obscurecido e até reprimido, não pela força, mas reprimido ideologicamente”.
O debate não está reprimido. Ele poderá começar quando Serra sair do silêncio.
Comentário (Do Nassif)
A não ser por comentários esporádicos sobre câmbio e juros, Serra não tem uma idéia clara para nada.
No período FHC, como era o único que não endossava o malanismo, passou a impressão para muitas pessoas – eu, inclusive – que poderia ser o receptador das boas idéias que se perdiam pela inércia absoluta de FHC. Mostrava-se receptivo a novas idéias, tornou-se uma espécie de ponto de confluência dos que pensavam o novo. E o máximo que precisava fazer era emitir opiniões esporádicas, frases soltas sobre cada tema. No Ministério da Saúde, as idéias já estavam consolidadas, a doutrina estabelecida. A bandeira SUS se manteve à tona passando por diversos ministros. No caso de Serra, com mais destaque por decisões que foram tomadas. Mas jamais Serra incorporou conceitos que ouvia.
Quando assumiu o protagonismo político – com a eleição para prefeito e depois governador de São Paulo – percebeu-se que aquele Serra era uma miragem construída por um conjunto diversificado de pensadores, mas que não tinha vôo próprio. As idéias eram repetidas como bordões, não como conceitos assimilados, desenvolvidos, elaborados e que, com o tempo, passassem a se constituir em parte integrante do pensamento de Serra. Ou, se tinha, perdeu-as, pelo medo de colocar qualquer idéia que criasse polêmica e dividisse o apoio que recebia da mídia.
Despido dos véus dos bastidores, não há ator político, não há roteiro, não há idéias – a não ser as recorrentes sobre câmbio e juros, que ajudam a fazer um Ministro da Fazenda, não um condutor de país.
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