31/03/2010
“SUS” da Educação muda papel do MEC
Viomundo 31/03/2010
por Luciano Máximo, de Brasília, do Valor
A criação de um sistema nacional articulado de educação baseado no regime de colaboração entre União, Estados e municípios do Sistema Único de Saúde (SUS) vai depender de aprovação de lei complementar e mudanças na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) para se tornar realidade no país. O esboço dos primeiros artigos da futura legislação foi apresentado ontem durante o segundo dia de atividades da 1ª Conferência Nacional de Educação (Conae) e está sendo discutido pelos cerca de 3 mil delegados presentes ao encontro, que acontece em Brasília até quinta-feira.
Considerado um conjunto de “propostas embrionárias” que será acrescido de contribuições dos participantes do evento, o texto indica os primeiros passos do “SUS” da educação, com destaque para a redução das burocracias e o aumento do poder de decisão das escolas e ações de cooperação técnica e financeira entre União, Estados e municípios baseadas em planos articulados. Um exemplo bastante citado pelos conferencistas é a dificuldade no entrosamento entre os governos na oferta de transporte escolar país afora. “Pela Constituição, todos os entes federados são responsáveis por levar e trazer os alunos, mas o estudante do município não pode pegar o ônibus da rede estadual. Hoje o transporte escolar público atende a 7 milhões de crianças e jovens em todo o Brasil, ele é fundamental para combater a evasão, mas funciona num formato de concorrência. Um sistema articulado organizaria esse modelo”, ilustra Francisco das Chagas Fernandes, secretário-executivo adjunto do Ministério da Educação (MEC) e coordenador da Conae.
José Maria Arlindo, professor da rede estadual do Maranhão, acredita que um sistema educacional mais harmonioso pode trazer benefícios para a carreira do docente, um dos temas mais debatidos e polêmicos da Conae. “O professor do Sul é muito mais valorizado que o do Nordeste e isso reflete na qualidade. O aluno do Sul, do Sudeste, acaba sendo bem mais preparado que o estudante nordestino”, opina. Para ele, “a bagunça” nas regras federativas é uma das razões para o não cumprimento integral da Lei do Piso, que estabelece salário mínimo de R$ 1.024,67 para professores com carga horária de 40 horas semanais.
Segundo Chagas, o sistema articulado também prevê que Estados e municípios formulem suas políticas públicas orientados pelo Plano Nacional da Educação (PNE), documento que será aprovado na conferência com as metas educacionais para o Brasil perseguir no período 2011-2020. “O atual PNE, que acaba este ano, teve baixo índice de cumprimento dos objetivos traçados porque planos estaduais e municipais não foram feitos”, acrescenta.
Chagas sustenta ainda que a construção do SUS da educação vai ajudar a elevar os recursos federais para o setor, uma vez que o MEC terá papel de órgão executivo e coordenador do sistema proposto. “A União terá muito mais peso na regulação da educação, vai fortalecer seu papel de indutora, com o MEC mantendo a política de elevação de recursos para a educação, como vem fazendo desde 2003.”
Apesar de ter os seus primeiros contornos legislativos revelados ontem, o SUS da educação pode demorar a se concretizar pelo fato de precisar ser regulamentado por meio de lei complementar (LC), que depende de aprovação de maioria qualificada pelos plenários do Senado e da Câmara dos Deputados antes de ser enviado à sanção presidencial. “Somente uma lei complementar pode definir competências e responsabilidades explícitas de cada um dos entes federados”, explica o deputado federal Carlos Augusto Abicalil (PT-MT), que apresentou o esboço da LC ontem na Conae.
Além da necessidade de aprovação de uma legislação complementar, a criação do sistema nacional articulado de educação depende de alterações na LDB, explica o parlamentar. “A organização curricular hoje é muito diversa de Estado para Estado, de cidade para cidade. Essa diferença, como passar de ano ou abordar uma matéria, por exemplo, em vez de somar representa perda de qualidade”, diz. Abicalil se diz satisfeito se o SUS educacional for criado até o fim do novo PNE, ou seja, em 2020. “É uma demanda de 80 anos, desde o Movimento dos Pioneiros, não se constrói isso da noite para o dia. O principal é que a Conae está legitimada para propor um texto a ser debatido no Congresso.”
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