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24/02/2013
Esquerda: caminho do coração
Do Direto da Redação - Publicado em 24/02/2013
Rodolpho Motta Lima*
Pode parecer redundante (e, cá para nós, é mesmo) a insistência com
que esta coluna se refere aos temperos e destemperos da mídia global ao
tratar da matéria política em nosso país. Além das inúmeras razões já
exaustivamente expostas para essa insistência, a verdade é que ela
também tem motivos históricos. A vantagem dos cabelos grisalhos (se é
que existe) é que aquele que os detém pode falar daquilo que vivenciou,
que testemunhou. Nos tempos da ditadura, presenciei a sustentação que
essa mídia deu ao regime militar da repressão, dos assassinatos e das
torturas. De lá para cá, lembro-me de muitos episódios antidemocráticos
em que ela se envolveu e não é por acaso que , no ambiente da internet,
já esteja carimbada como um dos componentes da sigla PIG (Partido da
Imprensa Golpista). Quer alguns deles? Pesquise o caso da Proconsult, a
edição do debate Lula x Collor, o episódio da “bolinha de papel” do
Serra...
Essa apregoada hegemonia de audiência deveria trazer consigo
responsabilidades com o povo que a sustenta. Não é assim, porém, que a
banda toca e, lamentavelmente, em nome dos interesses neoliberais, valem
todos os recursos para iludir, desinformar, alienar, suprimindo-se a
importância daquilo que não interessa destacar e conferindo-se um
relevo desproporcional a tudo que ajuda a construir uma não disfarçada
plataforma político-ideológica. Um verdadeiro partido, mas que dispõe
de meios inacessíveis a qualquer organização partidária, com a vantagem
de que não se submete a eleições e praticamente fala sozinho...
Mas esse quadro monopolista nefasto, se bem analisado, deixa nu algo
que se tenta enfaticamente negar ou esconder: não morreram as
ideologias e, queiramos ou não, todos somos tendentes, em nossa visão do
mundo, a trilhar caminhos em que o coração nos leva para a esquerda ou
para a direita.
Se a queda do muro e a própria globalização constituíram “vitórias”
da direita – chegando-se a apregoar, então, um mundo ideologicamente
unificado - , não demorou muito para que essa fosse uma vitória de
Pirro, a julgar pelas crises que o nada civilizado capitalismo vem
impondo ao mundo. Voltam a ser discutidas alternativas a esse sistema
que, no fundo, busca perpetuar elites dominantes e fortíssimas
corporações financeiras. As massas estão indo às ruas com movimentos de
ocupação para defender valores sociais e exigir a representação de
seus autênticos interesses. Não é por acaso que, na América Latina,
proliferam, hoje, governos nitidamente de esquerda, eleitos pelo
povo, na Venezuela, na Bolívia, no Equador, no Uruguai etc . E mesmo
aqui, apesar de uma certa despersonalização ideológica, fruto da funesta
“governabilidade” que impõe a participação dos Sarneys, dos Calheiros e
outros do gênero .
Voltando a mídia e seus desígnios, saúdo o texto de Mário Augusto
Jakobskind sobre a vinda da blogueira cubana Yoáni Sánchez ao Brasil , e
endosso por inteiro o que ali se contém. Na tentativa de dar à
discutida personagem um destaque que ela não tem, fazem isso com tal
estardalhaço que, é claro, acabam por provocar reações cujo acerto nem
quero discutir, fruto do inconformismo dos que enxergam nessa farta
cobertura o mesmo jeito unilateral e manipulador de sempre, onde o
contraditório não se manifesta. Afinal, há muitos cubanos que poderiam
vir ao Brasil para falar bem do seu país. E se alguém quiser argumentar
que estariam “a serviço do regime castrista”, é claro que podem também
valer os argumentos dos que acham que Yoáni está a serviço de outras
entidades... Se ‘O Globo” pode intitular os manifestantes contrários à
cubana de componentes de uma “minoria histérica” – usando o recurso de
sempre, de se valer de “especialistas” colhidos a dedo - é evidente que a
direita pode esperar retaliações e qualificações pouco nobres para os
seus representantes e é óbvio que nem todas serão controladas pelos
gritos do Senador Suplicy. É o confronto entre direita e esquerda em
plena atividade...
Um detalhe significativo, que , embora pareça insignificante, torna
óbvia a luta ideológica que se trava em nosso país: na edição de
quarta-feira, dia 20.02, o Jornal “O Globo” – repetindo o que fizera o
Jornal Nacional no dia anterior – dedica espaço bem maior às escaramuças
que envolveram a cubana do que ao pronunciamento da mais importante de
nossas mulheres, a Presidenta Dilma, sobre as últimas medidas que
buscam a extinção da miséria no país (Grifo do ContrapontoPIG).
Nada mais emblemático: Cuba é,
historicamente, muito mais um problema para os americanos do que para
nós. Afinal, é uma ilhazinha que ousou enfrentar o império do Norte e
que, ao longo de mais de 50 anos, jamais permitiu ao poderoso vizinho –
mesmo com a vergonhosa Guantánamo em suas entranhas – promover a volta
do antigo sistema de quintal.
O nosso problema, imensamente maior, é mesmo a desigualdade, que
cerca de indignidade a existência de milhões de brasileiros miseráveis.
Ao privilegiar Yoáni em relação a Dilma, os globais deixam bem claras
suas posições, seus interesses, seus compromissos, suas posturas de
direita que transcendem o ambiente nacional. E robustecem as teses de
quem considera que é preciso mudar esse panorama midiático, o mais
urgentemente possível. Quanto à dicotomia esquerda x direita, está mais
evidente do que nunca. No fundo, além dos racionais aspectos
econômicos, ela reflete a forma como cada um se sente, a direção para a
qual cada coração aponta. O meu, por exemplo, volta-se assumidamente
para a esquerda e, a esta altura, nem penso em mudar-lhe o rumo.
Ele vai
muito bem assim, obrigado...
*Rodolpho Motta Lima. Advogado
formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil)
e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado
pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de
Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente
no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.
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