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28/02/2013
FHC só lançou programas sociais a 4 meses da eleição de 2002
Eduardo Guimarães
Na última quarta-feira (27.2), a presidente Dilma Rousseff rebateu afirmação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no sentido de que ela e seu antecessor e padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva, teriam “herdado” e “usurpado” seus projetos e que, por isso, ela seria “ingrata” consigo.
Dilma afirmou que o cadastro único dos programas sociais do governo tucano “não existia” quando Lula chegou ao poder, em 2003. Prontamente, grandes jornais de São Paulo e do Rio de Janeiro (Folha de São Paulo, Estadão e O Globo) e algumas redes de televisão e sites tomaram partido de FHC corroborando sua afirmação de que o tal cadastro teria sido feito no governo do tucano.
Por falha de sua estratégia de comunicação social, a presidente não explicou bem a questão. E a mídia, muito menos. Assim sendo, este Blog apresenta, a seguir, mais um capítulo da verdadeira história daquele período triste da história do Brasil (1995-2002).
De fato, FHC deixou simulacros de cadastro da pobreza e do programa social Bolsa Família. Contudo, os programas começaram a ganhar alguma materialidade a 4 meses da eleição presidencial de 2002, conforme matéria da Folha de São Paulo naquele ano eleitoral. Abaixo, a matéria.
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FOLHA DE SÃO PAULO
26 de maio de 2002
MARKETING TUCANO
Governo lança na próxima semana o “Cartão Cidadão”, que unifica os programas de transferência de renda
FHC amplia ação social a 4 meses da eleição
RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A pouco mais de quatro meses da eleição, o presidente Fernando Henrique Cardoso entrega na próxima semana o primeiro “Cartão Cidadão”, por meio do qual serão efetuados os pagamentos dos programas de transferência de renda direta para a população mais pobre.
A longo prazo, a intenção do governo é que todos os usuários de programas de renda mínima carreguem um “Cartão Cidadão” no bolso, algo em torno de 31,7 milhões de pessoas, porque o Planalto quer dar o cartão também para os 6,7 milhões de beneficiários de aposentadorias e pensões rurais.
O “Cartão Cidadão” representa uma espécie de roupa nova para programas em curso.
Trata-se de um cartão magnético, com a logomarca do governo federal, do tipo fornecido pelos bancos. A longo prazo, vão substituir cartões já distribuídos à população, junto com o cadastramento das famílias beneficiadas.
Em período pré-eleitoral, seu lançamento tem um beneficiário: o presidenciável tucano José Serra. Será uma cerimônia deliberadamente simples para não ser confundida com uma ação de campanha.
“Potência social”
Coincidentemente, na última semana Serra disse que o país é uma “potência econômica” e precisa se transformar agora numa “potência social”. Ou seja, o novo mote de campanha do tucano faz eco ao lançamento do novo programa de FHC.
De imediato, o “Cartão Cidadão” será entregue aos usuários de cinco dos 12 programas de transferência direta de renda do governo federal.
São eles o Bolsa-Alimentação, o PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), o Bolsa-Escola, o Brasil Jovem e o Vale-Gás, por meio dos quais pretende atender 12,6 milhões de pessoas carentes em 2002. Ano passado – excluído o Vale-Gás, criado neste ano-, o governo gastou R$ 1,8 bilhão com esses programas. Para o atual exercício prevê R$ 3,7 bilhões – ou seja, duas vezes mais.
Sem considerar o Vale-Gás, cujos primeiros depósitos começaram a ser feitos em fevereiro, o aumento da verba programada foi de 50% -de R$ 1,8 bilhão em 2001 para R$ 2,7 bilhões em 2002. “Isso parece mais uma rede de proteção eleitoral do que de proteção social”, ironizou o deputado Agnelo Queiroz (PC do B -DF).
A meta estabelecida ainda está longe de ser atingida. Do total programado para a Bolsa-Alimentação, por exemplo, até agora só 2,23% foram efetivamente pagos. Dos R$ 411,3 milhões previstos para a erradicação do trabalho infantil, apenas R$ 108,4 milhões (26,35%) foram para o bolso das pessoas carentes. O Bolsa-Escola, de longe o programa mais difundido, só liberou 25,84% dos gastos previstos.
Os atuais cartões serão substituídos progressivamente. Na largada, cerca de 4.000.
Além do “Cartão Cidadão”, o governo prepara um Cadastro Único dos Programas Sociais. Já foram cadastradas 1,3 milhão de famílias. A meta é cadastrar 9,3 milhões até o final de agosto.
Em meados de julho, a menos de três meses da eleição, será feito um mutirão para dar nome e sobrenome legal a brasileiros que não têm acesso aos programas sociais por falta de documentos.
Essa é uma situação comum em regiões muito pobres, como o Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, e no Norte e no Nordeste do país. “O Pobre do pobre, o que mais necessita. A documentação vai propiciar a inclusão dos excluídos”, diz a secretária de Assistência Social, Wanda Engel.
Além da estabilização da economia, o que dá mais prazer a FHC é falar sobre a transferência de renda aos mais pobres feita em seu governo. Ele e o pré-candidato Serra dizem que o governo gastará, este ano, o equivalente à parcela da União na arrecadação do Imposto de Renda de pessoas físicas e jurídicas, estimada em algo em torno de R$ 28,7 bilhões.
Ambos – FHC e Serra – incluem nessa conta os R$ 15,5 bilhões programados para o pagamento de aposentadorias e pensões rurais. Alegam que houve ganho dos aposentados em razão do aumento real do mínimo. Sem os benefícios rurais, mas somando-se o recente Vale-Gás, os R$ 29,4 bilhões caem para R$ 15,1 bilhões.
Além dos cinco programas a serem inicialmente atendidos pelo “Cartão Cidadão” e das aposentadorias, esses R$ 15,1 bi incluem o abono salarial pago a desempregados, bolsas de qualificação, o Seguro-Safra pagos a famílias em situação de risco em áreas de seca e benefícios a idosos e deficientes.
No fundo, o que FHC faz é substituir políticas sociais de caráter temporário por outras de caráter permanente. E as associou diretamente ao governo federal, presente nas agências da Caixa Econômica, que paga os benefícios, e no próprio “Cartão Cidadão” no bolso do eleitor. Fórmula esta que Serra já incorporou à campanha.
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O fato é que 2002 terminou sem sequer arranhar as metas estabelecidas. Enquanto hoje (final de 2012) o Bolsa Família paga benefícios no valor de R$ 20 bilhões, em 2002 o governo nem chegou a atingir a meta estimada em R$ 3,7 bilhões. Além disso, o cadastro único tampouco foi feito por FHC após 8 anos no poder. Havia apenas intenção, que igualmente não se materializou.
Os programas sociais de transferência de renda do governo Fernando Henrique Cardoso só começaram a funcionar precariamente e com orçamento irrisório no fim de 2001, penúltimo ano de seu mandato. De janeiro de 1995 até agosto de 2001, o “grande” programa social do governo do PSDB era distribuir algumas cestas básicas a um pequeno contingente de famílias.
Àquela época, este blogueiro acompanhava de perto o que era, então, um problema gigantesco e crônico no país: fome e miséria. Compareci a inúmeros seminários sobre o tema, inclusive no auditório da Folha de São Paulo. A demanda pelos programas de transferência de renda era feita reiteradamente pelo Ipea.
Um dos pesquisadores do Ipea que mais se notabilizou àquela época foi Ricardo Paes de Barros, o PB, que durante o governo FHC deu declaração que causou polêmica quando, reclamando do programa de cestas básicas que vigeu até o final de 2001, afirmou que um programa social de verdade no Brasil seria jogar dinheiro de helicóptero em áreas carentes.
Durante quase sete de seus oito anos no poder, FHC ignorou solenemente as cobranças dos pesquisadores do Ipea para que adotasse o programa do ex-governador petista de Brasília Cristovam Buarque, o Bolsa Escola. O tucano só foi ceder praticamente no último ano de seu governo de 8 anos e, ainda assim, de forma precária.
Abaixo, matéria da Folha de São Paulo de dezembro de 2001 que comprova as afirmações acima.
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FOLHA DE SÃO PAULO
9 de dezembro de 2001
GOVERNO
O Bolsa-Renda Alimentação substitui cestas básicas que eram distribuídas a 1,7 milhão de famílias de cidades pobres
Programa social exclui 960 mil famílias
RANIER BRAGON
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE
O governo federal deixou 960 mil famílias carentes de fora do programa criado, em caráter provisório, para substituir a distribuição de cestas básicas, que era feita a 1,7 milhão de famílias de municípios pobres do país e que acabou em agosto.
O programa provisório que substituiu as cestas básicas foi denominado Bolsa-Renda Alimentação, com previsão de funcionamento somente em novembro e dezembro deste ano. Em vez da cesta básica, o novo programa dá à família R$ 15, que podem ser sacados por meio de um cartão magnético. Para esse programa, apenas 740 mil famílias das 1,7 milhão que estavam cadastradas no extinto Prodea (Programa de Distribuição de Alimentos) foram inscritas.
Os excluídos do novo programa e a situação precária pela qual o Prodea passou nos últimos meses de existência contrariam declarações feitas no final de 2000 pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e por membros do governo, segundo as quais nenhuma das famílias deixaria de receber as cestas até que um programa substituto fosse implantado.
O próprio governo federal admite que 960 mil famílias carentes não foram inscritas no Bolsa Renda-Alimentação. Para o governo, parte destas famílias pode estar recebendo algum outro benefício.
“Se os municípios forem ágeis, até o final de dezembro todas as famílias vão ser enquadradas em algum tipo de programa e, assim, poderemos consertar os desvios”, disse Wanda Engel, coordenadora do Projeto Alvorada, que envolve ações de nove ministérios.
A distribuição de alimentos parou em agosto e, durante o período de três meses entre a extinção do Prodea e o início da Bolsa-Renda Alimentação, o 1,7 milhão de famílias também ficou sem receber nem um nem outro benefício. O fim da distribuição das cestas foi definido pelo governo no ano passado por ele considerá-la assistencial. Neste ano, porém, resolveu-se pela criação do Bolsa-Renda Alimentação até que todo o 1,7 milhão de famílias fosse incluído, de acordo com o perfil de cada uma, nos outros programas sociais do Projeto Alvorada.
O problema é que as 960 mil famílias excluídas do programa substituto à distribuição de cestas básicas não têm garantia alguma de que vão se inserir em algum novo programa federal, já que a idéia do governo é promover um recadastramento geral das famílias carentes. As exigências para fazer parte de outro programa também são diferentes das exigências do Prodea.
Outro problema: existem famílias que, mesmo inseridas no Bolsa-Renda Alimentação, até hoje não receberam os R$ 15.
“A gente come o que tem. Dá primeiro para as crianças e o que sobrar divide para os grandes”, disse Noêmia Maria da Silva Santos, 39, de Bezerros, no agreste de Pernambuco, que no dia 15 de agosto recebeu sua última cesta básica do governo.
Ela está inscrita para receber as duas parcelas de R$ 15 referentes a novembro e dezembro. Mas o dinheiro de novembro, que já deveria ter vindo, ainda não foi entregue (leia texto nesta página).
Na prática, a transição do Prodea para outro benefício vem se mostrando confusa: em Minas Gerais, por exemplo, dos 225 municípios que recebiam as cestas básicas, apenas 165 foram cadastrados no Bolsa-Renda Alimentação (queda de 26,7%). Das 224.974 famílias cadastradas no Prodea, sobraram 149.400 (queda de 36,6%). “Tem prefeito que nem sabe que esse projeto [Prodea” foi extinto”, disse o major Itamar Pacheco, coordenador em Minas do programa.
Segundo ele, a orientação do Ministério da Integração Nacional, que é responsável pelo projeto, foi de corte linear de 25% no número de famílias beneficiadas, durante a transição Prodea-Bolsa, sob o argumento de “falta de recursos orçamentários”.
A Agência Folha ligou aleatoriamente para prefeituras de dez municípios de Minas Gerais que tinham famílias cadastradas no Prodea, mas que foram excluídas do programa substituto: Cantagalo, Paulistas, Coluna, Água Boa, Peçanha, Ervália, Descoberto, Pedra do Anta, Pedra Dourada e Serra Azul de Minas.
Quando o Prodea existia, famílias carentes dessas cidades recebiam do governo federal um total de 11.107 benefícios mensais, entre cestas básicas e Renda Mínima (antecessor do Bolsa-Escola) -8.108 famílias estavam cadastradas no Prodea e 2.998 no Renda Mínima. Hoje, apenas 4.112 famílias recebem benefícios, todos da Bolsa-Escola.
Cinco dos dez municípios ouvidos afirmaram que receberam nos últimos dias -mais de três meses depois do fim total da distribuição de cestas- ofícios do governo informando que o Prodea foi extinto e que as prefeituras deveriam fazer recadastramentos.
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Essa parcela da imprensa ligada ao PSDB que adotou a versão de FHC sobre os fatos, tal como o ex-presidente parece ter esquecido o que escreveu. A mesma Folha de São Paulo concordava com a afirmação da presidente Dilma de que o cadastro único e o programa de transferência de renda do governo tucano simplesmente não existiam.
Em matéria de junho de 2002, a três meses da eleição presidencial em que Lula derrotou José Serra, a Folha disse que “Até o final do mandato de FHC, o cartão representará pouco mais do que uma promessa de política social”. Confira, abaixo, a íntegra da matéria em que o jornal reconheceu o que hoje renega.
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FOLHA DE SÃO PAULO
8 de junho de 2002
Cartão embalará projeto de tucano em campanha
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Cartão-Cidadão lançado ontem pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, com a logomarca do governo, embalará um dos principais projetos de campanha do presidenciável tucano José Serra. Até o final do mandato de FHC, o cartão representará pouco mais do que uma promessa de política social.
Eis a idéia: o cartão magnético será entregue a todos os 9,3 milhões de famílias carentes que o governo pretende cadastrar até o fim do ano. Até agora, foram cadastrados 2,5 milhões de famílias. Assim que o cadastro único ficar pronto, o governo terá reunidas num banco de dados informações sobre renda, saúde, educação, trabalho e condição de moradia dos 54 milhões de pobres brasileiros. É ponto de partida dar foco e avaliar as políticas sociais.
Pobres
Serão considerados pobres aqueles com renda familiar per capita abaixo de meio salário mínimo por mês. Por ora, o número de pobres é só uma estimativa a ser confirmada. A renda é um critério maleável, pois boa parte dos pobres não tem renda para ser comprovada.
Para que boa parte dos pobres ainda à margem dessas políticas sociais não fique de mão abanando, o governo criou recentemente o Vale-Gás, benefício de R$ 15 a ser concedido a cada dois meses a todas as famílias cadastradas. Os primeiros pagamentos foram feitos em fevereiro.
Essa será a única política generalizada no combate à pobreza. Os demais programas de transferência direta de renda à população variam de acordo com o perfil da família.
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Fica provado, portanto, que esses setores da imprensa que hoje endossam a versão mentirosa de FHC sabem muito bem que seu governo só foi lançar um programa mambembe e eleitoreiro a poucos meses de uma eleição que perderia, entre outros fatores, por ter ignorado o problema social durante os oito anos de seu governo.
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