.
03/05/2013
Depois dos juros, o arrocho
Isto É Independente - 3/05/2013
Aparentemente, o debate é surrealista. Num país onde 86% dos salários foram reajustados acima da inflação em 2012, um número crescente de observadores e políticos resolveu iniciar uma campanha preventiva contra a indexação salarial.
Paulo Moreira Leite
Não há nada de estranho nesse comportamento, contudo.
Todo mundo sabe que não é preciso levar a sério a proposta de indexação de salários, lançada por Paulinho, da Força Sindical.
Ela ajuda Paulinho a procurar uma imagem mais combativa do que a
CUT, coisa que tenta fazer desde o início do governo Dilma. Mas é
politicamente inviável e seria economicamente desastrosa.
Cumpre, no entanto, uma utilidade política. Ajuda a construir um
fantasma, criando uma ameaça teatral que pode ajudar no avanço sobre os
salários.
Depois de questionar o governo Dilma Rousseff num ponto essencial
da política econômica, que é o juro baixo, o que se quer é preparar o
terreno para outro ataque – desta vez, no crescimento do mercado
interno.
O fantasma da indexação ajuda a preparar corações e mentes para a
realidade de um sonhado arrocho salarial que, como sempre, não ousa
dizer seu nome.
Até quando os sindicatos serão capazes de impor ganhos – em pouco
mais de 1,5% ao ano – capazes de compensar perdas inflacionarias?
Ninguém sabe.
Mesmo sem crescimento alto, o país vive um círculo que, com todas a dificuldades, é essencialmente benéfico à população.
O crescimento do mercado interno alimenta a distribuição de renda,
que, por sua vez, realimenta o mercado interno. A alta dos juros e sua
contrapartida, uma possível queda no emprego, representam um esforço na
direção inversa – do desemprego e do arrocho. Este é o debate por trás
da filigrana.
O arrocho salarial, no passado, foi imposto pela ditadura militar e pelo esmagamento dos sindicatos.
Só tornou-se possível depois do golpe que derrubou um presidente,
João Goulart, que havia liderado a organização do PTB nos anos 50 – tão
diferente do partido de hoje --, que possuía ligações profundas com o
sindicalismo mais autêntico da época.
Não é preciso ter muita imaginação para entender as semelhanças e diferenças em relação ao país de hoje.
Tudo se encaixa com tudo, mais uma vez, e tudo volta ao começo. Mais uma vez, o que está em debate é o valor do trabalho.
Tudo se encaixa com tudo, mais uma vez, e tudo volta ao começo. Mais uma vez, o que está em debate é o valor do trabalho.
Paulo Moreira Leite. Desde janeiro de 2013, é diretor da
ISTOÉ em Brasília. Dirigiu a Época e foi redator chefe da VEJA,
correspondente em Paris e em Washington. É autor dos livros A Mulher que
era o General da Casa e O Outro Lado do Mensalão.
.
Nenhum comentário :
Postar um comentário
Veja aqui o que não aparece no PIG - Partido da Imprensa Golpista