segunda-feira, 16 de julho de 2018

Nº 24.611 - "Corrupção e privilégios mantêm Lula preso"

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16/08/2018

Corrupção e privilégios mantêm Lula preso


Do Brasil 247 - 16 de Julho de 2018


Ricardo Stuckert


por ALDO FORNAZIERI

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Dilma Rousseff foi derrubada por um esquema corrupto entranhado nas profundezas mais tenebrosas da história do Brasil, que se constituiu na descoberta e na colonização e que se prolonga até os nossos dias. O Brasil foi colonizado por criminosos, governado por corruptos, por promotores de extermínio de índios, por estupradores, por escravocratas, por espoliadores que nunca tiveram misericórdia nem piedade pelo sofrimento alheio e dos escravos e trabalhadores espezinhados que construam as suas riquezas. Esta bestialidade desumanizada foi constituindo a mentalidade de uma elite perversa, sanguinária e predatória. Mesmo que a elite se renovasse e trocasse de setores, a mentalidade pervertida continuou e mesma. Os principais postos do Estado sempre foram ocupados, ao longo dos tempos, por gente portadora de mentalidade assassina, predatória, corrupta.



Raros foram os momentos da nossa história em que pessoas de índole honesta, com propósitos universalizantes, orientados para o bem comum, ocuparam altos cargos na hierarquia estatal ou nas instâncias políticas. Essa mentalidade criminosa e delinquencial incrustou-se na farsa da Independência, na farsa da Proclamação da República e em tantos outros episódios retrógradas que marcaram o século XX e deste pouco de século XXI da nossa história.

Se em determinados momentos a mentalidade criminosa das elites governou com certo pudor, usando a técnica do disfarce, ou justificando a violência aberta como foi o período da ditadura militar, com o golpe que derrubou Dilma, o despudor, a desfaçatez, a imoralidade, a indecência, a impudência se mostraram à luz do dia, sem rubor nas faces. Os artífices deste tormento não tiveram nem o cuidado de se justificar junto àqueles que enganaram: derrubar a Dilma em nome do combate à corrupção para instalar o governo mais abertamente corrupto da história do país. Aqueles que foram enganados passaram à condição de humilhados. Surgiu daí a conjugação da impotência e do imobilismo: de um lado os enganados humilhados e, o outro, o dos derrotados atordoados.

O esquema corrupto e criminoso não visava apenas derrubar Dilma, mas impedir a vitória de um candidato que representasse os setores populares nas eleições de 2018 - particularmente a vitória do presidente Lula. Por que? Porque Lula, acima de todos, e outros possíveis vitoriosos representam aquele sentido dos direitos universalizantes, orientados para o bem comum, que as elites querem impedir nesse país. Quanto mais igualdade e justiça, menos corrupção e privilégios. Então, neste país, as elites precisam impedir o avanço da igualdade e da justiça, dos direitos, porque isto bloqueia a corrupção e os privilégios.

Mas não são apenas os representantes políticos das elites corruptoras e corruptas que querem impedir que os valores da igualdade e da justiça se tornem minimamente efetivos neste país. Os altos funcionários do Judiciário, do Ministério Público, da Receita e dos organismos de segurança são a outra face do esquema corrupto e criminoso que governa o país. Os governos petistas deram autonomia, aparelhamento e leis para que esses setores pudessem combater a corrupção. Eles voltaram essa autonomia, esses instrumentos e essas leis justamente contra o PT. Por que? Porque esses setores estão corrompidos pelos altos salários e pelo estouro dos limites constitucionais desses altos salários e pela série de privilégios inescrupulosos, escandalosos e corruptos, a exemplo do auxilio moradia, que favorecem esses setores.

Mesmo que um salário de R$ 30.000 seja um salário dentro da lei é um salário que expressa uma forma de corrupção num país em que mais de 100 milhões de pessoas ganham até um salário mínimo e em que a renda média do brasileiro é de R$ 1.268. Para manter um salário de mais de R$ 20.000 no setor público é preciso que falte educação, falte saúde, falte remédios, falte cultura falte direito para o povo pobre das periferias.

Os juízes, os procuradores, os delegados, os altos funcionários da Receita etc., excluindo-se as exceções, são inimigos do povo porque as necessidades do povo são inimigas dos seus altos salários e de seus privilégios. E, em sendo inimigos do povo, são inimigos dos políticos que lutam para fazer valer os direitos do povo. São os maiores inimigos de Lula porque Lula é a principal potência e possibilidade para introduzir mecanismos de igualdade e de justiça no Brasil. Mesmo que Lula favoreça e instrumentalize esses setores, eles serão inimigos de Lula ou de qualquer outro que represente as lutas por igualdade, justiça e direitos.


Se no setor político os políticos que representam esses esquemas criminosos e corruptos perderam o pudor em mostrar sua face vil, anti-social, antinacional e antipopular, no Judiciário também o despudor, a desfaçatez, a imoralidade, a indecência, a impudência se instalaram como modus operandi de juízes, de desembargadores e de ministros das Cortes superiores. Foi o que se viu com Moro, um juiz fora da lei, com Gebran Neto, com Thompson Flores, com Raquel Dodge com Laurita Vaz que, na última semana, não teceram o manto da misericórdia, mas forjaram a espada da injustiça, do ódio e da impiedade para manter Lula injustamente preso. Esta ordem templária do mal não teme em violar as leis e a Constituição, em destruir a hierarquia e os procedimentos, em rasgar a jurisprudência, em condenar sem provas, em se elevar na condição acusador e de juiz a exemplo dos tribunais da Inquisição, em condenar inocentes, seja porque são alvos dos seus ódios, seja porque os vêem como ameaças aos seus interesses.


Nada detém essa horda que pisoteia a Constituição. Negam aos outros juízes e desembargadores o direito de praticar aquilo que a função prescreve e que eles mesmos praticam. Instalaram o reino da exceção, no qual, a vontade arbitrária deles substitui as leis e a Constituição. Perseguem colegas, como estão perseguindo o desembargador Rogério Favreto, porque não aceitam quem contrarie os seus desmandos. O Congresso não os detém até porque já não há mais Congresso. O Executivo não os detêm até porque o governo está desmoralizado. Nem o STF os detêm porque o STF está tomado pela desordem anárquica e abre espaços para o motim e para a indisciplina. Parecem não temer mais nenhum poder humano e nem mesmo o castigo de um Deus irado, tal certeza da impunidade que amealharam.

Se no Brasil nunca houve democracia efetiva, só sobram destroços de República porque já não há divisão de poderes. O Brasil vai sendo arrastado para uma destruição sem fim, para o descontrole da violência, vai se afastando da estrada da civilização e vai se embrenhando para dentro da sua própria dor e desesperança. Esta impotência da vida cívica, da coragem e da virtude abre as portas para que os demônios do mal se sintam confortáveis e bem quistos. O que dizer de um país que aceita que Bolsonaro, um candidato à presidência da República, pregue o massacre de camponeses pela política, como ocorreu no Pará? Bolsonaro não é um acaso. Ele é filho do golpe, camarada de Moro e de muitos outros juízes, um rebento do PSDB, conviva de empresários, visitante da grande mídia e até tolerado por progressistas.


Vivemos num país em que tudo é normal: Lula preso é normal, Bolsonaro pregando o crime é normal, uma quadrilha no governo é normal, juízes rasgando a Constituição é normal, o crime e a violência são normais, a falta de saúde e de outros direitos é normal. O escandaloso perdeu todo o sentido e todo o status. Anormal é querer tratar o escandaloso como inaceitável. Junto com a corrupção e os privilégios, essa trágica normalidade, esta impávida passividade, são outras causas que mantêm Lula preso. Como não temos uma história de lutas gloriosos e nem heróis míticos donde possamos nos socorrer, precisamos olhar como outros povos se libertaram para seguir-lhe o exemplo. É preciso que a coragem e a bravura enfrentem a impiedade e a injustiça e que o nosso valor faça arder as lutas, pois só nelas reside a esperança.


ALDO FORNAZIERI. Cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política (FESPSP)

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