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26/01/2013
Todos são Chávez, mesmo sem Chávez
Do Esquerdopata - 26/01/2013
Fernando Morais
Dias atrás, centenas de milhares de
venezuelanos ocuparam o centro de Caracas para "tomar posse" no lugar do
presidente Hugo Chávez, ausente do país para tratamento médico.
Colorida e ruidosa, a multidão que cercou o Palácio Miraflores não
carregava fuzis AK47 nem coquetéis molotov, mas uma arma com poder de
fogo muito maior: a Constituição nacional.
Portando no peito faixas presidenciais de pano ou de papel, feitas a
mão, em vez de slogans sangrentos, repetiam um único bordão: "Todos
somos Chávez! Todos somos Chávez!".
Ironizado pela imprensa de direita como cena do realismo fantástico, o
episódio estava carregado de simbolismo e significado. Se Chávez é mesmo
um ditador e se a economia da Venezuela está pela hora da morte, como
martelam diariamente nove entre dez veículos de comunicação no Brasil,
por que, diabos, ele é tão popular?
Os esfarrapados rótulos de "populismo" e "caudilhismo" são cada dia mais
ineficazes para explicar por que Chávez e seu governo já se submeteram a
16 processos de avaliação, entre eleições e referendos, e em apenas um
saíram derrotados. A última vitória, ocorrida em dezembro, aconteceu
quando Chávez já se encontrava em Cuba: os chavistas elegeram 20 dos 23
governadores de Estados venezuelanos.
Quem quer que visite o país interessado em ver as coisas como as coisas
são, sem preconceitos nem estereótipos, terá a oportunidade de constatar
o que os jornais não mostram. Qualquer brasileiro médio, jejuno em
informação independente sobre a Venezuela, se surpreenderá.
Em 14 anos de chavismo, os índices de analfabetismo foram reduzidos a
zero. Nos últimos dois anos, o projeto Gran Misión Vivienda construiu
350 mil casas populares, metade das quais edificada em parceria com
mutirões de comunidades organizadas.
O número de médicos por 10 mil habitantes subiu de 18 para 58. Só o
sistema público de saúde dispõe de 100 mil médicos, dos quais cerca de
30 mil são cubanos que vivem há cinco anos nas favelas que cercam
Caracas, oferecendo atendimento gratuito e permanente a milhares de
pessoas. A taxa de mortalidade infantil desabou de 25 para 13 óbitos por
mil nascidos vivos e 96% da população tem acesso a água potável.
O coroamento dessas políticas sociais implantadas sob o comando de
Chávez não poderia ser outro: em levantamento recente, realizado pela
Cepal (Comissão Econômica para América Latina e Caribe) em 18 nações da
América Latina e do Caribe, a Venezuela aparece em primeiro lugar como o
país com a mais baixa taxa de desigualdade social.
O que deixa a oposição sem fala e sem munição é que essa marcha pacífica
rumo ao socialismo é liderada há 14 anos por um católico praticante sob
um processo sui generis, onde não houve fuzilamentos, as instituições
funcionam, não há presos políticos e a imprensa desfruta de absoluta
liberdade de expressão.
Exagero? Quem tiver dúvidas que entre nos sites www.eluniversal.com e
www.el-nacional.com para ver como os dois maiores jornais de oposição do
país tratam Chávez e seu governo, todos os dias, sem exceção.
A ideia de que a Revolução Bolivariana não sobreviverá a Hugo Chávez é
apenas uma manifestação de desejo dos golpistas de 2002, da elite
saudosa da velha Venezuela. Aquela em que a fortuna decorrente do
petróleo ia parar em contas bancárias em Miami e na Suíça e não em
projetos sociais, como acontece hoje.
Como milhões de outros admiradores do processo venezuelano, torço para
que Hugo Chávez vença a batalha contra o câncer e volte logo ao batente.
Mas sei que, como todos os demais seres humanos, o presidente é mortal.
Sei também, no entanto, que a Revolução Bolivariana que ele concebeu e
lidera é para sempre. Quem viver verá.
Fernando Morais, 66, é jornalista e escritor. É autor, entre outros, de "Olga", "Chatô" e "Os Últimos Soldados da Guerra Fria"
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