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08/12/2013
A dosimetria do ódio
Jornal O Povo (CE)- 08/12/2013
Valton de Miranda Leitão
"Essa ira insensata alcançou setores do senso comum e da classe média, incapazes de fazer crítica"
O ex-ministro de Ciência e Tecnologia Roberto Amaral, escreveu para a CartaCapital sobre a chacina moral levada a efeito por esta infeliz combinação entre o STF e a mídia brasileira na ação penal 470, no espetáculo que se tornou conhecido pelo bordão de mensalão.
Não discutirei aqui os aspectos jurídicos deste julgamento que vem se desenvolvendo há oito anos sob intenso bombardeio midiático, com o objetivo de criminalizar e julgar por antecipação os réus que agora sofrem todo tipo de escárnio (confira Raimundo Pereira - Revista Retratos do Brasil - Um julgamento medieval e no Youtube).
No artigo “Geni”, Amaral faz um anagrama com Genoino e a digna prostituta cantada por Chico Buarque. Diz Amaral: “Filho de camponês no interior do interior do Ceará, em pleno semiárido nordestino, conheceu na carne, cedo, as forças telúricas que o sertanejo pobre precisa arregimentar para sobreviver. Menino ainda, trabalharia com o pai como “cassaco” nas frentes de trabalho do Dnocs, carregando pedra e abrindo à força da enxada estradas de terra, pretexto para dar sobrevida aos flagelados da seca de 1958”.
Conforme aprendi em textos políticos e sociológicos, o Poder Judiciário deve ser imparcial e neutro ao julgar qualquer questão que se apresente diante da Corte. Os outros dois poderes pela natureza da sua constituição política não são imparciais ou neutros.
Durante oitos anos assistimos à passionalidade irada vinda da imagética carnavalesca que fluía de dentro do próprio STF. O bombardeio começou com a denominação pela mídia, Globo principalmente, dos réus como Ali Babá e os Quarenta Ladrões. Isso evidencia no domínio factual, um julgamento antecipado que consciente e/ou inconscientemente entrou em conluio com a Suprema Corte. Além disso, o ministro presidente que sucedeu a Ayres Britto parece ter se tornado especialmente suscetível aos holofotes, pois, não poucas vezes, apresentou-se arrogante e autoritário como Narciso justiceiro.
No artigo citado, a figura de Genoino é usada emblematicamente para mostrar todo ódio, rancor e vingança que se abateu sobre essas pessoas, visando, naturalmente, a um alvo mais amplo, ou seja, o projeto político do PT. O fato é que essa ira insensata alcançou setores do senso comum e da classe média, incapazes de fazer a crítica dessa absurdez. Genoino, preso e torturado algumas vezes, agora é chacinado no seu espírito por aqueles que desejam tirar-lhe a dignidade e a alma, como fazem todos os torturadores de todas as épocas, desde que o comando garanta.
Diz Amaral: [...] “a ignomínia da tortura a mais insidiosa, implacável, fria, bestial e científica, na qual o pau-de-arara, a “cadeira do dragão” (choques elétricos), o sufocamento, os “telefones” (pancadas nos ouvidos) e os pontapés eram o vestibular do inimaginável em termos de perversão e perversidade”.
O combate necessário à corrupção não deve ser feito com dosímetro de radioatividade passional e raivosa que levam a confundir quantidade com qualidade, moralismo com ética e conduta inquisitorial com justiça.
Valton de Miranda Leitão
valtonmiranda@gmail.com
Psicanalista
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