terça-feira, 21 de abril de 2015

Contraponto 16.529 - "Numa democracia, quem manda é o povo — e não os juízes. Por Mauro Santayana"

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21/04/2015


Numa democracia, quem manda é o povo — e não os juízes. Por Mauro Santayana



Moro

Publicado na RBA.

Mauro Santayana

Quando suas decisões afetam não apenas o réu e sua vítima, mas centenas, milhares de cidadãos, o in consequentia. promotor deve acusar e o juiz, julgar, com a mente e o coração voltados para o que ocorrerá.

Nos últimos anos, a nação tem tido, na área de obras públicas, bilhões de reais em prejuízo. E isso não apenas devido a falhas de gestão – que, com a exceção dos Tribunais de Contas, não devem ser analisadas pelo Judiciário – ou de casos de corrupção, alguns com mais de 20 anos.

Houve também a paralisação – a caneta – de grandes obras de infraestrutura. Belo Monte, a terceira maior hidrelétrica do mundo, em construção na Amazônia em um momento que o país precisa desesperadamente de energia, teve suas obras judicialmente suspensas por dezenas de vezes, o que também contribuiu para que se somassem meses, anos de atraso ao seu prazo de entrega; e também para a multiplicação de seus custos.

O mesmo ocorreu com Teles Pires e Santo Antônio, com a refinaria Abreu e Lima e com a transposição do São Francisco. Em todos esses empreendimentos foram encontrados problemas de algum tipo, mas justamente por isso, é preciso que o Ministério Público e o Judiciário busquem outro meio de sanar eventuais falhas e punir irregularidades, que não seja, a priori, a imediata paralisação das obras. Afinal, ainda é melhor obras com problemas, que podem ser eventualmente corrigidos, do que nenhum projeto ou iniciativa desse porte, em setores em que o país esteve praticamente abandonado durante tantos anos.

Uma das soluções, para se evitar esse tipo de atitude drástica, poderia ser a de que se nomeasse interventores que pudessem investigar irregularidades e fiscalizar, in loco, em cada obra, o cumprimento das determinações judiciais.

Declarações bombásticas e precipitadas também não ajudam, quando se trata de projetos essenciais para o desenvolvimento do país nos próximos anos.

No contexto da Operação Lava Jato, centenas de milhares de trabalhadores e milhares de empresas já estão perdendo seus empregos e arriscando-se a ir à falência, porque o Ministério Público, no lugar de separar o joio do trigo, com foco na punição dos corruptos e na recuperação do dinheiro – e de estancar a extensão das consequências negativas do assalto à Petrobras para o restante da população – age como se preferisse maximizá-las, anunciando, ainda antes do término das investigações em curso, a intenção de impor multas punitivas bilionárias às companhias envolvidas, da ordem de dez vezes o prejuízo efetivamente comprovado.

Outro aspecto a considerar é a interferência indevida, em esferas da administração pública que não são da competência do MP, como foi o pedido de paralisação, no mês passado, das obras de ciclovias que estão em execução pela prefeitura de São Paulo.

Não cabe ao Ministério Público, em princípio, julgar, tecnicamente, questões viárias. E menos ainda, limitar o debate e a busca de consenso, em âmbito que envolve a qualidade de vida de metrópoles como a capital paulista, uma das maiores do mundo.

A não ser que haja uma mudança constitucional que faça com que venham a ser escolhidos por meio das urnas – e mesmo que viesse a ocorrer isso – é preciso que o Ministério Público e o Judiciário tenham especial cuidado para que alguns de seus membros não passem a acreditar – e a agir – como se tivessem, com base na meritocracia, sido ungidos por Deus para tutelar os outros poderes, e, principalmente, o povo.

Aos juízes e ao Ministério Público não cabe interferir, de moto próprio, nem tentar substituir o Legislativo ou o Executivo, na administração da União, dos Estados e municípios, que devem recorrer ao Supremo Tribunal Federal sempre que isso ocorra, assim como cabe ao STF coibir, com base na Constituição, esses eventuais excessos.

Em uma democracia, todo o poder emana do povo.

É ele que comanda. É ele que, em última instância, executa. É ele que, indiretamente, legisla. É ele que, a cada dois anos, julga, por meio do processo eleitoral, segundo o rito político. A sua sentença é o voto.

O eleitor é o Estado. E o juiz supremo.


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