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20/04/2015
A comunidade jurídica versus a truculência da dupla mídia e Sergio Moro
Tijolaço - 19 de abril de 2015 | 13:48 Autor: Miguel do Rosário
Miguel do Rosário
A comunidade jurídica brasileira anda completamente atônita diante do festival de arbitrariedades e ataques contra os capítulos mais humanistas do nosso processo penal, que vem caracterizando a luta política desde os incendiários debates que acompanharam a Ação Penal 470.
Atônita e apreensiva, porque mesmo o advogado mais conservador, mais antipetista, ganha dinheiro mediante a defesa de um processo penal justo. Se o processo penal é atropelado, ou mesmo ridicularizado, em nome da “luta contra a corrupção”, então para que gastar dinheiro com bons advogados?
Diante dessa constatação, a comunidade jurídica parece ter acordado para a necessidade de fazer a luta política para defender a democracia e a liberdade, contra os ataques dos setores autoritários do Estado e da mídia. É como se tivéssemos voltado ao auge da ditadura, em que os advogados mais conservadores passaram a fazer oposição ao regime militar porque entenderam que não era possível trabalhar num ambiente onde o processo penal é massacrado pelo interesse político.
Em artigo para a Folha, publicado no último dia 16, dois importantes advogados, ambos professores universitário na FGV, Alberto Toron e Celso Vilardi, criticam duramente o autoritarismo e a leviandade do juiz Sergio Moro.
Eles notam, em primeiro lugar, que Moro faz uma condenação “taxativa” de processos da Lava Jato que ainda não foram julgados!
Nunca se viu isso. O juiz de um caso fazer campanha, pela mídia (e junto com a mídia), por um dos lados de um processo penal que ele mesmo ainda vai julgar.
Os dois juristas criticam, em seguida, a defesa que Sergio Moro faz da prisão antes da sentença, uma coisa que ele mesmo já pratica, visto que usa a prisão preventiva como prisão de fato, e por tempo indeterminado.
E aí eles observam que ainda não há “estudo empírico” sobre a proporção em que as sentença de primeiro grau são reformadas.
Sugiro aos advogados que leiam um post recente do blog O Cafezinho, em que tratamos do tema, usando uma pesquisa inédita, encomendada pelo Ministério da Justiça, junto aos presídios brasileiros.
A grande maioria dos presos que são absolvidos (e ainda em primeira instância!) permaneceram encarcerados por uma média de 129 dias em Santa Catarina e 394 dias na Bahia!
Ou seja, foram considerados inocentes pelo Estado brasileiro e mesmo assim, por causa dessa tara por prisão que caracteriza nossa sociedade, permaneceram presos por meses, às vezes mais de um ano! E olha que falamos de média, o que significa que alguns inocentes ficam presos por anos e anos! Possivelmente muitos inocentes morrem na prisão.
Não há outro termo: tara por prisão. Só isso explica a quantidade excessiva de prisão preventiva, feitas sem critério, mantidas por tempo indeterminado. Os juízes chancelam a preguiça e a corrupção das nossas policiais estaduais e do Ministério Público, que ao invés de procurar evidências físicas dos crimes, reunir testemunhos múltiplos, em geral se atém apenas à testemunha única do policial que realizou o flagrante. No caso de promotores, chegam ao desplante de “pedir à mídia” que os ajudem a pressionar o judiciário a votar desta ou daquela maneira, isso quando não posam como herois par a capa de jornal.
A nossa sociedade, em virtude de uma mídia cevada na ditadura, nunca se acostumou a debater a inocência e os erros judiciais. Isso deveria fazer parte da nossa cultura: livros, filmes, reportagens, sobre erros do Judiciário. Nos EUA, onde o Judiciário é muito forte, quantos milhares de filmes sobre terríveis erros judiciais! Quantas organizações civis não se dedicam exclusivamente a cuidar de erros da Justiça!
A história da inocência, assim como a história da culpa, també vendem. Ambas são populares. Mas a mídia brasileira está sempre e exclusivamente ao lado da acusação.
O endeusamento do Judiciário não ajuda a instituição. Ao contrário, o Judiciário não se moderniza, não se democratiza, perde contato com os interesses do povo – ou pior, confunde interesse do povo com concessões odiosamente demagógicas aos vícios mais negativos do populacho, quase sempre estimulados por campanhas midiáticas. E nada mais fácil, para a mídia, do que explorar o vício mais antigo da massa, que é esse espírito de vingança, linchatório, que se volta para o primeiro para quem se aponta o dedo.
A diferença é que a massa também sabe perdoar, com a mesma força com que condena, mas a mídia brasileira só explora o seu vício, nunca a sua virtude.
Aconselho juristas e advogados a prestarem mais atenção ao debate conduzido nos blogs. Aqui você encontrará muito mais bom senso, humanismo e preocupação com valores democráticos do que o clima de linchamento, autoritarismo e truculência política que caracteriza o debate feito pela grande mídia.
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