05/09/2015
A república precisa saber das relações Daniel Dantas x Gilmar Mendes
Revista Forum -
Rubens Valente, autor do livro Operação Banqueiro,
fala sobre o papel do ministro do STF, tido por ele como fundamental no
desmanche da Satiagraha e na desqualificação das denúncias
Por Carlos Mercuri
Em julho de 2008, uma operação da Polícia Federal, denominada
Satiagraha, levou à prisão, após quatro anos de investigação, o
banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity; o ex-prefeito de São Paulo
Celso Pitta e o doleiro Naji Nahas, entre outros, indiciados por crimes
financeiros. Pouco depois, o então presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF), Gilmar Mendes – que fora advogado-geral da União no
governo de Fernando Henrique Cardoso – manda libertar o banqueiro. O
delegado federal responsável pela operação, Protógenes Queiroz, é
afastado da operação, bem como o juiz que expediu o mandado de prisão,
Fausto de Sanctis, da 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo. O que se
viu em seguida foi uma reviravolta no caso, com Dantas passando de
acusado a acusador, conseguindo sustar o processo e anular as provas do
caso.
O assunto é tema do livro Operação Banqueiro, do jornalista Rubens
Valente, lançado este mês pela Geração Editorial e cuja primeira
tiragem, de 20 mil exemplares, esgotou rapidamente nas livrarias. Nesta
terça-feira (21), Valente participou de uma mesa-redonda com blogueiros
independentes na sede do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de
Itararé, transmitida ao vivo pela TVT – TV dos Trabalhadores, na qual
abordou seu trabalho de apuração que resultou no livro e suas impressões
sobre o caso.
Para
Valente, o que mais chama atenção no caso é a relação entre Dantas e
Gilmar Mendes, considerado pelo autor peça fundamental no desmanche da
Operação Satiagraha e na desqualificação das denúncias. “Mendes nunca
escondeu seu papel político na presidência do STF, não era segredo. Por
que ele agiu assim?”, questiona o jornalista. “É uma relação que a
República precisa saber”, vaticina.
O autor teve acesso a mais de 1,5 mil e-mails apreendidos na casa do
lobista Roberto Amaral e em três deles aparece o nome de Mendes, razão
pela qual o processo subiu ao STF. Esses e-mails também demonstram o
grau de intimidade que Amaral – figura já levada a público durante as
investigações que levaram ao impeachment do presidente Fernando Collor
de Mello, quando o lobista era diretor da empreiteira Andrade Gutierrez –
com autoridades do governo federal. Um desses e-mails chama a atenção
pelos termos pouco formais com que se dirige ao então candidato a
presidente José Serra (PSDB), em 2002.
O jornalista aponta que esse e-mail, enviado por Amaral a um assessor
de Serra, “mostra que há segredos subterrâneos que a República precisa
saber. Fala em dívida de Dantas, a qual Amaral diz que, na verdade, o
banqueiro é credor. Não se trata de doação à campanha eleitoral. Serra
deve não ter gostado de algo e Amaral dá esta resposta”, diz Valente.
Ele deduz que Dantas não queria que houvesse investigação sobre
correntistas nas Ilhas Cayman, um paraíso fiscal no Caribe. Essas contas
teriam sido criadas, de acordo com Valente, para empresas participarem
do processo de privatização das telefônicas, e a legislação à época
proibia brasileiros de criar fundos em paraísos fiscais para participar
dos leilões.
Valente questiona a posição da Procuradoria-Geral da República e diz
que o atual procurador-geral, Rodrigo Janot, deve tomar a iniciativa do
pedido de reabertura do caso. “Não sei o destino desses 1,5 mil e-mails,
se ainda existem ou foram destruídos. Mas há a hipótese de o STF julgar
que há elementos para investigar o ministro Gilmar Mendes”, acredita o
repórter.
O jornalista diz que o que o motivou a escrever o livro-reportagem
foi o fato de Daniel Dantas acumular muito poder. “É um grande
personagem do ponto de vista jornalístico. É um grande empresário com
conexões com o interesse público, gosta de se relacionar com o poder,
gosta de estatais e consegue exercer pressão sobre o governo, de onde
deve vir boa parte de seu poder”, avalia.
Sobre as relações de Daniel Dantas com o publicitário Marcos Valério,
apontado como operador do mensalão, Valente diz que o banqueiro o
procurou, inicialmente, para se retratar junto ao governo do então
presidente Lula por não ter feito doações a sua campanha eleitoral e
queria estabelecer relacionamento com o novo governo. “A agência de
publicidade de Valério tinha a conta do Opportunity, o que levou a
Polícia Federal a suspeitar se os recursos eram carreados para o
mensalão.
É possível que parte do valerioduto possa ter sido irrigado
por empresas ligadas ao Opportunity, mas nada foi esclarecido”, afirma o
jornalista.
A respeito da reação do banqueiro ao livro, Valente disse que ele
tentou por via extrajudicial impedir o lançamento e distribuição,
alegando que a obra é “ilícita e ilegal”. “Pesquisei a legislação
apontada por Dantas (leis 9.096/96 e 105/01) e nada se fala sobre
limites do jornalismo, mas sim sobre como o Estado deve cuidar do sigilo
de suas investigações”, explica Valente. “As duas leis evocadas por
Dantas na notificação não tocam no tema da liberdade de expressão. É
pura coação psicológica sobre a editora e o autor, ainda mais
considerando que o livro sequer havia sido publicado”, esclareceu.
Valente considera que a obra teve boa repercussão na imprensa, tanto
entre a mídia alternativa quanto na imprensa tradicional. “Tive grande
apoio da blogosfera, manifestações pelo Facebook, Twitter e também dos
jornais e revistas, como Carta Capital, Agência Globo e Folha de S.
Paulo”, comentou.
Ainda a respeito da imprensa, o autor lamenta sua obra
não ter podido analisar o papel dela em todo o processo. “Em alguns
momentos trato do comportamento dos meios de comunicação, mas como
coadjuvantes, porém, digo tranquilamente que o caso merece um trabalho
extenso sobre essa questão.”
.
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