14/09/2015
A Folha deveria lembrar-se do “Correio da Manhã” ao fazer editoriais
Por Fernando Brito
Em 1964, dois editoriais do Correio da Manhã – “Fora!” e “Basta!” – foram as clarinadas da mídia para o golpe militar que depôs João Goulart.
Como agora, o massacre dos jornais era incessante e generalizado – embora houvesse, então, a Última Hora dissonante deste coro.
O Correio, como a Folha, era o jornal da classe média e, como ela, o que tinha em suas páginas vários dos mais prestigiosos intelectuais – Carlos Drummond de Andrade. Carlos Heitor Cony, Otto Maria Carpeaux, entre outros.
Arrastado para o “conto do golpe democrático”, o jornal abriu fogo pesado contra o governo legítimo (legitimidade que fora confirmada um ano antes, no plebiscito que devolveu poderes presidenciais a Jango).
E parido o filho troncho do autoritarismo, não tardou a sentir que o menino não só usava a farda como, também, os dentes e as garras.
Perdeu o que seu “inimigo” não lhe negava – a publicidade governamental – e o aliado usou sem pejo, ameaçando, inclusive, os empresários privados que anunciavam por lá.
Sua dona, Niomar Muniz, viúva de Paulo Bittencourt, deixou o jornal ir para a oposição, com episódios que ficaram na história, como o que narra o fotógrafo Amicucci Gallo :
“[…] e tinha uma escola, o Castelo
Branco ia visitar a escola meio… inaugurar a escola. […]. Quando eu
passei numa sala, por onde ele tinha que entrar, tinha o quadro negro,
estava escrito assim, “animais úteis” […] letras garrafais, bem vistas. E
eu fiquei dentro da sala. O repórter, desesperado […] “anda, vai chegar
o presidente!”, e eu “Daqui eu não saio!”. Ele não entendeu nada,
porque eu não queria falar porque eu não saía dali. Até que ele entrou
na sala… e quando ele passou pelo quadro eu , eu pá-pá-pá [barulho da
máquina fotográfica]. No dia seguinte, quando ele abriu aquela foto
dele, “animais úteis”…
Que durou, ao menos, para que eu tenha o orgulho, mesmo assim, de ter na minha carteira profissional aquele nome que pertence tanto à História que nenhum arranjo pôde retirar sua mística.
A Folha, que na época se serviu do golpe para comprar a Última Hora paulista na bacia das almas, deveria se lembrar do que acabou acontecendo com este tipo de ultimato.
A praga, não é raro, tem a mania de voltar-se contra o praguejador.
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