quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Contraponto 10.055 - "Feliz Ano Novo: Lula reabre o calendário das ruas"

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20/12/2012

Feliz Ano Novo: Lula reabre o calendário das ruas

 

Lula reabre o calendário das ruas


Do Blog das Frases - às 05:56 Carta Maior


Saul Leblon
 

Recorrente, como um soluço no imaginário social, o milenarismo não contagia apenas mentes ingênuas e visões de mundo primitivas.

Autoridades e forças políticas muitas vezes se comportam também como peças de uma inexorável mecânica de desfecho irreversível.

Às vezes o fatalismo se torna literal, como agora. Interpretações apocalípticas, ou apenas oportunistas, anunciaram o fim do mundo neste dia 21 de dezembro de 2012, ao término do 13º giro de 393 anos cada, do calendário maia.

Na concepção religiosa original um círculo iniciado há milhares de anos se fecha. Reabre-se um novo.

Para o milenarismo ligeiro, é o marco zero, o apocalipse, a tragédia.Contra ela não há apelação.É esperar e sucumbir.

A concepção da história como um destino que caminha para o esgotamento, um fio de azeite sugado no miolo do pão, ressurge não raro quando massas de força de aparência incontrolável conduzem a humanidade a um horizonte engessado, como que desprovido de dialética.

A crise sistêmica do capitalismo, blindada desde 2008 pelo poder de persuasão do seu aparato ideológico, encerra certo incentivo milenarista.

A percepção do matadouro existe; seus contornos se estreitam. Alternativas são desautorizadas . O velho aparato interdita a busca de novos caminhos. Instituições são capturadas pela crise; a sociedade é destituída das suas salvaguardas. Governantes mugem como gado para o abate. No próximo ajuste. Ou nas urnas.

Seria preciso reformar as instituições democráticas para enfrentar a abrangência e a profundidade de uma crise como a atual?

O dispositivo midiático cuida de interditar esse debate.E toma a lição de casa a cada dia. No café da manhã, à tarde e na sabatina da noite.

Como discutir novos caminhos e repactuar consensos se o espaço da liberdade de expressão foi congestionado pelo monólogo da reiteração conservadora?

A pergunta argui o milenarismo de governos que aceitam as limitações institucionais com a mesma fatalidade dos que aguardam o apocalipse no fecho do círculo maia.

A economia brasileira é parte indissociável dessa paralisia mundial.

A travessia iniciada em 2008 avançou do arcabouço neoliberal para um modelo de desenvolvimento em que o comando do Estado subtraiu algum espaço à supremacia financeira asfixiante.

A redução de cinco pontos nas taxas de juros em 12 meses abalou o chão firme do dinheiro grosso. Hoje ele anda em círculos diante da encruzilhada: ou derruba o governo e sobe a Selic; ou comete a eutanásia do rentista e se transfigura em capital produtivo, como aconselhava Keynes, que não era um bolchevique.

A supremacia financeira uiva, ruge e manda recados, em idioma local e forâneao. Fica bem pedir a cabeça de Mantega em inglês. Ou elogiar o sultanato do judiciário incentivando prisões de petistas antes do Natal.

O fim de 2012 marca a intersecção dessas travessias e impasses.O calendário se esgota, as agendas não.

A redução imposta às taxas de juros dará ao Estado brasileiro uma folga da ordem de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões em 2013. Dinheiro subtraído ao rentismo à disposição do investimento público.

O governo poderá destiná-lo a desonerações fiscais e a investimentos em infraestrutura. Poderá beneficiar as condições e vida da população e a engrenagem da produção.

O governo Dilma só não pode desmoralizar a queda do juro com dinheiro parado no cofre.

A burocracia estatal tornou-se um obstáculo ao investimento público no Brasil. O dispositivo midiático conservador faz o resto ajustando a película de suspeição que acanha toda a cadeia da iniciativa no aparelho de Estado.

Os anos 90 criaram no Brasil um monumento neoliberal.

Um Estado feito para não funcionar.

Uma engrenagem desprovida de agilidade, sem quadros de ponta capaz de ativa-la, necrosada na capacidade de planejamento, corroída na gestão operacional; sem fundos públicos, carente de legitimidade política.

Muita coisa mudou para melhor em 10 anos de gestão petista --sobretudo na esfera das políticas sociais.

Mas a jóia do legado tucano não foi superada, está longe de sê-lo e se engana quem pretender que o seja apenas com o lubrificante da boa gestão --indispensável, mas insuficiente.

Criou-se neste país um Estado anti-estatal; um aparato esquizofrênico fatiado em normas labirínticas que exaurem o impulso do desenvolvimento em vez de alimenta-lo.

O que trava o passo seguinte da economia hoje no Brasil não é a falta de recurso, mas a falta de Estado.

O milenarismo economicista deduz daí que não há alternativa à restauração privatista.

Desobstruir o Estado --despi-lo dos torniquetes neoliberais-- seria encrespar ainda mais o embate de forças num calendário já congestionado pela largada eleitoral para 2014.

Pode ser, a essa altura pode ser. Mas a contabilidade dos interditos encolhe ainda mais o espaço já subtraído pelas operações conjuntas ---bem sucedidas-- das togas, da mídia e demais interesses contrariados nessa transição.

A areia escorre depressa na contagem regressiva para o escrutínio desses conflitos nas urnas. 2013 será um longo e efervescente ensaio de primero turno.

A história apertou o passo nos últimos meses e insistir na inércia fatalista é quase um contrato de suicídio à vista.

A opção à paralisia converge cada vez mais para quatro letras que romperam seu ostracismo no vocabulário do PT e de ministros próximos a Lula nos últimos dias: ruas.

Coube ao ex-presidente da República nesta quarta-feira --às vésperas do fatídico 21-12-2012-- dar a esse resgate vernacular a dimensão de um compromisso político que reabre e renova o calendário das ruas na história do país.

Em discurso no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, nesta quarta-feira, Lula anunciou um novo ciclo ciclo de mobilizações, cujo esgotamento havia sido perigosamente incorporado à visão fatalista da crise dentro e fora do governo.

De volta às ruas e à História, Lula disse adeus ao Ano Velho e saudou o Ano Novo:

"No ano que vem, para alegria de muitos e tristeza de poucos, voltarei a andar por este país. Vou andar pelo Brasil porque temos ainda muita coisa para fazer, temos de ajudar a presidenta Dilma e trabalhar com os setores progressistas da sociedade" (Lula, na posse da nova diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, nesta 4ªfeira, 19-12).

Feliz 2013.

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