29/06/2013
Manifestações, Governo, plebiscito e o tiro pela culatra
Blog Palavra Livre 29/06/2013
Por Davis Sena Filho
As
manifestações de junho movimentaram o tabuleiro político do Brasil e a rotina
de vida dos brasileiros. Os protestos foram compostos em sua maioria por grupos
de classe média, a exemplo de profissionais autônomos, pequenos e médios
empresários, grupos políticos conservadores, bem como os de extrema direita e
principalmente por estudantes, a grande maioria, filhos da classe média, além
de segmentos partidários da extrema esquerda, que fazem oposição ao Governo do
PT, da presidenta Dilma Rousseff e como sempre não enxergam o que está em jogo
a um palmo à frente de seus narizes.
As
manifestações deixaram claro que a classe média e também a população brasileira
em geral quer mais do que já conquistou nesses últimos onze anos de governos
trabalhistas, que, sem sombra dúvida, colocaram o Brasil em patamares de
influência política e econômica jamais experimentados em nossa história em
termos internacionais, bem como permitiu que o País americano fosse mais ouvido
nos fóruns internacionais, a eleger, em 2011, o agrônomo José Graziano para
diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO), além de eleger este ano o diplomata Roberto Azevêdo para o cargo de
diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), um dos órgãos
internacionais mais influentes e poderosos do mundo.
Os
dois dirigentes internacionais se elegeram no período dos governos trabalhistas
de Lula e Dilma, receberam apoio incondicional dos mandatários ao tempo em que
a imprensa alienígena e inimiga dos interesses do Brasil minimizava essas
importantes conquistas políticas e diplomáticas, além de escalar comentaristas,
colunistas e blogueiros para desmerecer a importância dessas vitórias ao ponto
de certos jornalistas desqualificarem, inclusive, pessoalmente os dois
mandatários brasileiros que conquistaram os postos mais importantes da FAO e da
OMC. Ponto.
Este
é o Brasil que as “elites” e a classe média se recusam a enxergar e a mostrar,
por questões meramente ideológicas e preconceituosas, porque vivem e,
consequentemente, efetivam a luta de classe. O gigante da América do Sul
que combate a crise internacional com o seu forte mercado interno e liderou a
criação do G-20, do Brics, além de fortalecer as relações sul-sul, ao invés de
apenas ficar à mercê das relações diplomáticas e comerciais com os Estados
Unidos e a União Europeia, ao fortalecer também o Mercosul e a Unasul e
enterrar de vez a Alca, bloco que tinha por finalidade expor o fortíssimo
mercado interno brasileiro aos produtos dos Estados Unidos, país useiro e
vezeiro em proteger o seu mercado interno ao conceder subsídios a inúmeros
produtos agrícolas e industrializados.
Os
manifestantes formaram grupos heterogêneos, sem pautas organizadas e, por algum
tempo, sem representantes para dialogar com o governo. Além disso, a sociedade
brasileira percebeu a ausência da grande massa de trabalhadores vinculados às
confederações e, consequentemente, aos milhares de sindicatos, urbanos e rurais
associados às federações existentes em todos os estados do Brasil. Por sua vez,
os avanços sociais e econômicos do povo brasileiro são inquestionáveis, basta
que pesquisemos e verifiquemos os números e os índices no Portal da
Transparência, nos portais de todos os ministérios e de instituições
respeitadas, a exemplo do Banco Central, do IBGE e da Fundação Getúlio Vargas.
Contudo,
os insatisfeitos foram às ruas e demonstraram ao Governo que os brasileiros
querem mais, o que é justo e que ajudou a acordar o Palácio do Planalto quanto
às reformas que estavam congeladas e à melhoria, por exemplo, da saúde e da
educação, setores que receberam muitos recursos federais nesses últimos onze
anos, apesar de em muitos estados e cidades a população não perceber os
avanços, afinal as verbas orçamentárias são repassadas para os governadores e
prefeitos, que têm o poder de direcioná-las para as áreas que eles consideram
prioritárias.
Sabemos,
por seu turno, que a crise brasileira do mês de junho não se traduz de forma
simples e muito menos simplória como tentaram fazer crer os jornalistas da
imprensa conservadora, e muito menos se aplica às crises europeias, japonesa e
norte-americana, que são crises de fundo econômico, financeiro, imobiliário,
que causaram amplo desemprego, queda dos índices das bolsas de valores,
endividamento público, que estrangulou as economias de Itália, Espanha,
Portugal, Grécia e Irlanda e atingiu países poderosos como a França e a
Inglaterra.
A
crise europeia que propiciou ainda eventos como fuga de capitais, escassez de
créditos, diminuição de investimentos públicos, baixíssimo crescimento do PIB,
além da intervenção do FMI, instituição que os brasileiros tão bem conhecem,
com as suas receitas econômicas neoliberais, que combatem a doença matando o
paciente, além de mexer com as estruturas sociais de inúmeros povos, que
transformaram os seus dias em protestos desde o ano de 2008, que atingiram e ainda
atingem em cheio a mais importante célula da sociedade, que é a família.
Entretanto,
as passeatas, os protestos, as manifestações em todo o Brasil se tornaram
violentas. Violência esta amenizada pelos grandes meios de comunicação,
adversários históricos dos governantes trabalhistas, que precisavam,
urgentemente, e há muitos anos, de uma pauta que ao menos questionasse e
fizesse o Governo Federal, administrado por políticos do campo da esquerda
sentirem pela primeira vez as insatisfações das ruas, mesmo a serem promovidas,
nitidamente e indelevelmente, por membros da classe média de perfis
evidentemente conservadores.
A
saída do Governo e da presidenta Dilma Rousseff foi a proposta de chamar
o povo brasileiro para decidir sobre questões brasileiras por intermédio de um
plebiscito, que vai aprofundar discussões importantes como, por exemplo, a
efetivação da reforma política, que vai mexer, sem sombra de dúvida, em
estruturas arcaicas, viciadas, tanto no campo eleitoral quanto no campo
partidário e que desde a República Velha e a ditadura militar mantém o País em
um processo político e eleitoral ultrapassado, que favorece a corrupção, já que a Constituição
de 1988 ainda tem artigos que ainda não foram regulamentados e por isto impedem
a modernização do nosso sistema eleitoral.
A
burguesia nacional, os barões da imprensa donos do sistema midiático privado e
de mercado e a direita partidária, representada pelo PSDB, DEM e PPS, e com
apoio de políticos de “esquerdistas” cegos do PSOL, já se mostraram contrários
ao plebiscito, vão fazer, sem sombra de dúvida, campanha contra o plebiscito,
porque a direita fala muito até um limite, pois quando percebem que o tiro saiu
pela culatra no caso da proposta do plebiscito, ela recua para resguardar os
seus interesses e os seus negócios, como sempre o fez através do tempo — dos
séculos. A direita é, ideologicamente e doutrinariamente, violenta, cínica e
hipócrita.
A
verdade é que esses grupos econômicos, propriedades de empresários
conservadores, e, portanto, de direita, não querem a reforma política, porque,
do contrário, teriam mais dificuldades para financiar os seus candidatos, como
os favorecem até hoje, em detrimento da maioria, com muito dinheiro. Os
candidatos da burguesia são os políticos que possam defendê-los de maneira
prática, além de servi-los como seus porta-vozes no Congresso, no Judiciário e
no Executivo. Os interesses do grande empresariado urbano e rural são
inconfessáveis e seus candidatos eleitos vestem os seus ternos como se
vestissem os macacões repletos de propaganda dos pilotos de fórmula um. Não é
necessário dizer mais nada, não é? Ponto.
O
tiro dos conservadores saiu pela culatra, porque o Governo trabalhista já
recebeu o apoio político dos partidos de sua base, além de receber recentemente
no Planalto a visita das lideranças de diferentes matizes, como os movimentos
sociais, as centrais sindicais, o LGBT, os movimentos urbanos, os movimentos de
Juventude, bem como o Movimento pelo Passe Livre (MPL), o grupo responsável
pelo o início das manifestações, com uma pauta de esquerda, que reivindicava
que as tarifas de ônibus não aumentassem de preço, o que foi conseguido —
conquistado.
A
pauta dos transportes que foi o estopim dos protestos, que, de forma
oportunista, manipulada e violenta, foi “abraçada” ou raptada pelos grupos
midiáticos de direita, pela classe média reacionária e pelos políticos de
partidos de oposição, a exemplo do PSDB, partido derrotado três vezes nas urnas
e fracassado politicamente por não ter programa de governo e projeto de País,
tentou se aproveitar das manifestações em proveito próprio, e, de forma
ridícula, fazer o papel de intérprete de um movimento social que os políticos
tucanos jamais vão interpretar de maneira séria, correta e pontual, porque se tem
uma coisa que o PSDB, os barões da imprensa venal e de mercado e a classe média
tradicional não conseguem compreender é exatamente o povo brasileiro.
As
manifestações, na verdade, fortaleceram o campo da esquerda, porque ele se
abriu ao debate, sem medo e com propostas concretas, pois além de baixar os
preços das passagens de ônibus, convidou os movimentos sociais para o diálogo e
dessa forma abrir a caixa preta do setor de transportes, como vão fazer, por
exemplo, os prefeitos das duas maiores capitais do País — as cidades do Rio de
Janeiro e de São Paulo, além de muitas outras, obviamente.
O
tempo vai se encarregar de mostrar os oportunistas e os trapaceiros da política
e das mídias corporativas. A esquerda pegou a oposição conservadora com as calças
nas mãos. Com o fortalecimento do debate e a proposta do plebiscito, a direita
vai ter de recuar, no que concerne ao referendo, que ela, de forma hipócrita,
propôs ao governo e à sociedade. A direita se esvaziou, porque com a proposta
do referendo ela mostrou mais uma vez, e de forma inequívoca, que não está
disposta a ouvir o povo e muito menos deixá-lo decidir sobre a reforma
política, que no fundo retira os privilégios financeiros dos candidatos da
direita, que sempre são os preferidos do grande empresariado nacional e
internacional. A reforma política acaba com o caixa dois.
O
povo pediu mudanças e a resposta governamental, volto a repetir, vem em forma
de reformas, e a primeira das reformas é a política, que, se pararmos para
pensar, foi um pé no peito da direita brasileira acostumada que está em
abastecer o caixa dois dos candidatos dos empresários urbanos e rurais. A
verdade é que o povo melhorou de vida nos últimos onze anos, e quer mais. E as
manifestações diziam exatamente isto: “queremos mais!” E o povo vai ter, porque
o Brasil efetiva um processo inexorável, que é a busca pelo seu desenvolvimento
social e econômico. Somos o sexto PIB do mundo, bem como respeitados no
exterior. O povo pede e exige, e vai ter a resposta em forma de mudanças e reformas.
Não
dá mais para o governo e a sociedade tergiversarem sobre os fatos e os
acontecimentos. A direita quis, com má-fé e ridiculamente, tomar para si a voz
das ruas, mas é o campo da esquerda que é orgânico, pois inserido e sedimentado
historicamente na sociedade organizada. Não duvide. Portanto, vai ser por este
caminho que as reformas vão seguir: o caminho proposto e debatido com um
governo de esquerda e trabalhista. Afinal, queremos ter um Brasil justo e
democrático para o povo viver. As reformas vão vir.
A
partir de agora veremos se a direita partidária e se os barões midiáticos de
negócios privados estão mesmo a favor de mudanças no Brasil. Os conservadores
tentaram atirar no que viram e acertaram no que não viram: o plebiscito e o
chamado do governo para a sociedade organizada e o povo decidirem sobre a
reforma política. A mudança, irrefragavelmente, vai ajudar o Brasil a andar nos
trilhos e aperfeiçoar o seu sistema político, partidário e eleitoral, e,
evidentemente, favorecer a eleição de políticos responsáveis e comprometidos.
É isso aí.
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