quinta-feira, 18 de maio de 2017

Nº 21.448 - "Renúncia seria um gesto bom demais para Temer"

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18/05/2017

Renúncia seria um gesto bom demais para Temer


Brasil 247 - 18 de Maio de 2017



Paulo Moreira Leite

Escrevendo sobre Donald Trump, o colunista Thomas L Friedman, do New York Times, analisou:

"O grupo moralmente corrupto que atualmente lidera o Partido Republicano consegue se safar não porque tem os melhores argumentos -- pesquisas mostram que a maioria discorda deles -- mas porque tem o poder e não tem medo de usá-lo, não importando as pesquisas."

Estou convencido de que a mesma análise se aplica ao núcleo político que assumiu o Planalto junto com Michel Temer e tentará conservar seus postos diante das gravações devastadoras de Joesley Batista. A realização de eleições diretas representa a alternativa coerente para o país retornar a democracia e deve ser perseguida por todos os meios, em todas as ocasiões.

Mas é preciso estar preparado para uma luta encarniçada e difícil, possivelmente mais prolongada do que se pode imaginar diante do caráter explosivo da denúncia. O principal benefício da denúncia, que é inutilizar um presidente que se converteu no principal instrumento para execução de uma agenda prejudicial ao futuro do país, pode ser reconhecido e festejado.

A discussão sobre Poder, mesmo quando se encontra esmigalhado, ocorre em outro patamar.

Reações benignas -- como uma renúncia voluntária  -- refletem um otimismo em relação a Temer que deve ser descartado. Essa visão pressupõe um compromisso básico com a Constituição incompatível com as atitudes e decisões que exibiu antes e depois de ser empossado. Não vamos esquecer. O esforço de auto-ilusão é imenso, também.

Nas horas que antecederam a divulgação das fitas, através do colunista Lauro Jardim, do Globo, o Planalto mantinha-se firme no empenho para criar um clima artificial de otimismo, com tanta ajuda da mídia amiga que muita gente podia fingir acreditar que era verdade. Estimulada por engravatados sorridentes do tele-jornalismo, ontem pela manhã a conversa era na linha "o pior já passou."

A experiência de um ano no Planalto mostrou um político calculista e frio como poucos, com reflexos e compromissos diferentes dos meus, dos seus, do seu vizinho e muito provavelmente de seu candidato em 2014 e da  maioria do concorrentes que se aprumam para 2018. Quantos países já assistiram à posse de um vice que traiu a titular e conspirou diretamente para assumir seu cargo, sem possuir um único voto?

Um político capaz de dizer que sentia orgulho de sua impopularidade não é do tipo que irá comover-se com discurso no Congresso, com editoriais escandalizados ou com passeatas de protesto no fim de semana. Só deixará o Palácio quando sua saída for a única forma de salvar a própria pele.

Basta lembrar a origem real do processo que levou Temer ao Planalto para entender a insistência exibida por sua grande fiadora -- a TV Globo -- para reforçar e ampliar as denúncias contra Lula na mesma noite em que as gravações de Joesley explodiram. O esforço era tentar lembrar a todos quem era o verdadeiro alvo.

Está claro: a sobrevivência -- ou eliminação política --  de Lula é a grande moeda de troca do atual momento político, uma batalha simultânea mas não paralela.

E é justamente para evitar o risco de um retorno do mais popular presidente de nossa história republicana que, no momento em que o sacrifício de Temer já se mostra inevitável, seus aliados trabalham de forma incansável para assegurar uma sucessão por via indireta. Como previsível, o jogo do momento é o mesmo de todas as crises: construir uma saída que deixe o povo de fora.

Versão competente das gravações caseiras que o ex-senador Sergio Machado produziu no início de 2016, as fitas de Joesley mostram o grau de divisão do patamar de cima da pirâmide brasileira, que inclui o grande empresariado e também a cúpula do aparato judicial.

Longe de colocar-se a serviço da Lava Jato, assumindo o papel de delator capaz de sorrir para fingir que não está sendo humilhado -- como Emílio Odebrecht -- o movimento de Joesley revela uma situação de descontentamento profundo, insustentável do ponto de vista jurídico, político e econômico. Neste ambiente de lances imprevisíveis, só uma eleição direta, livre e democrática poderá dar origem a um governo legítimo, capaz de falar em nome da maioria dos brasileiros.


PAULO MOREIRA LEITE. O jornalista e escritor Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília
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