segunda-feira, 22 de maio de 2017

Nº 21.473 - "Xadrez da última aposta da Globo"

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22/05/2017

Xadrez da última aposta da Globo


Jornal GGN - SEG, 22/05/2017 - 15:34




Luis Nassif

A crise política entra em um momento crítico, submetido as uma ampla entropia.
O único fio condutor da aliança – o antipetismo – esfumaçou-se. A facilidade de atribuir todos os males do país à Presidência volta-se contra o golpe. E o fato da Globo pular do barco Temer e tentar comandar o próximo barco tornam ela – e o MPF – daqui por diante, os únicos responsáveis por tudo de mal que acontecer no país.
Sem o fator de coesão, o golpe tornou-se um vale-tudo. De um lado, Temer mantem aliados comprados a peso de ouro – deputados, com cargos e emendas; imprensa, com verbas publicitárias. Mas esse jogo de interesses vale apenas até o momento em que cai a ficha de que o governo não tem mais futuro.
E se está muito perto desse momento.
Com essa investida sobre Temer, sem a blindagem do antipetismo, a Globo definitivamente virou o fio. Ela e o MPF se tornam – agora, aos olhos de todos – os grandes agentes de desestabilização do país.
Essa pode ser a grande contribuição dela, de se tornar o fator de aglutinação do que resta de bom senso no quadro político atual. E, tudo isso, poderá desembocar em eleições diretas-já.
Vamos entender um pouco melhor os desdobramentos do golpe.

Momento 1 – o avanço do estado policial

Por qualquer ângulo que se olhe, por qualquer capivara que se analise, a operação da Procuradoria Geral da República contra o presidente da República foi abusiva. Amplia-se de forma inédita o estado policial no país, com a delação e o grampo entrando por todos os poros da vida nacional, incutindo a desconfiança em todas as relações sociais e convertendo o país no paraíso dos criminosos delatores
Gravar um presidente da República – ainda que seja um desqualificado como Michel Temer –, e expô-lo ao julgamento de uma emissora de televisão é de uma gravidade extrema, típica de países doentes.
Essa conta será cobrada da Globo e do Ministério Público Federal, ao menor sinal de recomposição do poder político.
Mesmo assim, não se pode varrer para baixo do tapete o que foi levantado. Trata-se do presidente mais sem noção e mais inescrupuloso da história.

Momento 2 - dar baixa no governo Temer



A desfaçatez de Temer, de reunir-se às escondidas, em pleno Palácio do Jaburu, com seu maior financiador, é do mesmo nível da falta de limites de sua turma, Eliseu Padilha, Moreira Franco, Geddel Vieira Lima. A única coisa que os diferencia é o uso da mesóclise.
Agora, aliados antigos e eventuais, oportunistas de todas as espécies, pulam do barco: não há a menor probabilidade de sobrevivência do governo Temer.
É uma guerra inglória. Temer é uma das fichas mais sujas da República. Há um caminhão de episódios e evidências o envolvendo que, certamente, não estão restritos aos grampos praticados.
O que já se sabe sobre suas estripulias garantem um mês de cobertura diária da Globo.

A ficha conhecida de Temer



1. O coronel da reserva da PM, José Antunes Sobrinho, há muitos anos conhecido como receptador de caixa 2 para Temer e cujos arquivos foram recolhidos pela operação. Há tempos sua atuação era conhecida da Lava Jato do Paraná, que nada fez para aprofundar as investigações (https://goo.gl/h1xXbC).
2. Os esquemas com José Yunes e seu arquipélago de offshores, já levantados anteriormente (https://goo.gl/FlcCEE).
3. O longo histórico do deputado Rodrigo Rocha Loures, um dos principais operadores de Temer, que, mesmo assim, teve o atrevimento de levá-lo para dentro do governo.
4. Os negócios com o grupo Libra. Aliás, basta a PGR consultar a AGU (Advocacia Geral da União) sobre as pressões pessoais de Temer, para validar um acordo administrativo que livrasse a Libra de uma multa bilionária. Ou então as matérias mostrando as jogadas de Wagner Rossi (outro operador de Temer), quando presidente da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) com Temer (leis os comentários do post https://goo.gl/7txeZh). Em nenhum momento a Lava Jato se interessou em agregar esses inquéritos em suas investigações.

As provas da JBS



É ingenuidade supor que o PGR Rodrigo Janot e o Ministro Luiz Edson Fachin investiriam contra Aécio Neves e Temer baseados apenas nas delações. É evidente que estão ancorados em quilos de documentos.
Além disso, houve busca e apreensão de documentos e equipamentos em locais críticos para Temer, como os escritórios da Argeplan.

Momento 3 – a guerra da mídia

A perícia técnica na gravação



Nenhum jornalista minimamente experiente bancaria o laudo do tal perito-corretor de imóveis. É um documento tecnicamente vergonhoso.  Tem o mesmo valor do laudo de Francisco Molina sobre a bolinha de papel no cocoruto do José Serra. Um laudo imprestável em que o perito usa o programa Audacity, meramente indica pontos de defeito na gravação, e termina taxativo dizendo que a prova é inservível.
O Audacity é tão amador que até eu tenho no meu computador para digitalizar LPs.

O apoio volátil dos jornais


O apoio da Folha e do Estadão a Temer durará o tempo justo para que um próximo governo de coalizão garanta a manutenção do pacote publicitário montado pelo ínclito Eliseu Padilha.
Aliás, bastará um deputado ou senador requisitar à Secom, Petrobras e Caixa Econômica Federal os mapas de mídia e de patrocínio para minar o apoio.

O álibi da estabilidade econômica


Otávio Frias Filho, da Folha, abriu mão da prudência e saiu a campo defendendo Temer com um discurso sem nexo (https://goo.gl/UinykA): Temer seria um novo Campos Salles que estaria se sacrificando, preparando o terreno econômico para que o seu sucessor possa brilhar.
Um teto de despesas não-factível, reformas radicais enfiadas goela abaixo da população, com 90% de desaprovação, cortes radicais em programas sociais ao mesmo tempo em que amplia os limites das emendas parlamentares, aparelhamento geral do Estado, inclusive em áreas antes preservadas, como a Eletronuclear, comprometimento de 40% do orçamento com juros, tudo isso e uma expectativa de crescimento de menos de um ponto, depois de 8 pontos de queda, é uma preparação de terreno para o caos, não para o paraíso.
Além disso, se um dos elementos da estabilização é a previsibilidade, como pensar em estabilidade econômica, com um presidente que pode, a qualquer momento, ser denunciado, processado, condenado, apeado do poder e preso?
O único ganho da Folha foi trocar a coluna semanal de Aécio por Marcos Augusto Gonçalves, que nos brindou com um artigo-lava-alma (https://goo.gl/3M6TzO).
Mais prudente foi o Estadão, jogando na conta do repórter ] matérias como esta (https://goo.gl/IU8hHw), na qual o aquário manda o título e o lide e o pobre repórter é obrigado a correr atrás do recheio. Sai isso, só generalidades.

Movimento 4 – o estado policial da Globo e do MPF


Com a aposta na queda de Temer, a Globo e o MPF (agora, através do Procurador Geral da República) atravessam definitivamente o Rubicão. Para o seu público, não há mais o álibi do antipetismo e nem o falso salvacionismo econômico que embasou a campanha do impeachment de Dilma. Trata-se exclusivamente de uma disputa de poder, incompatível com qualquer quadro de normalidade democrática.
Ontem à noite, um evento juntou mais de 200 advogados de todas as linhas políticas – incluindo a OAB-SP – contra o arbítrio. Parte relevante integrava até outro dia o clube de aliados incondicionais da Globo e dos defensores do impeachment.
Enquanto isto, o programa Fantástico de ontem abusava do massacre. Transformou em escândalo até o fato de um funcionário do BNDES ser membro do Conselho Deliberativo da JBS (https://goo.gl/jna8Oc). Meu Deus! Qualquer repórter minimamente bem-intencionado e informado saberia que grandes acionistas de empresas – como é o caso do BNDES com a JBS – tem assentos no Conselho Deliberativo. Como criminalizar assim uma pessoa, para dezenas de milhões de espectadores, com base apenas nesse fato?
O maior exemplo da perda de rumo da Globo é o comportamento de seus jornalistas. Comportam-se como caubóis bêbados em saloons de filmes de faroeste, atirando a esmo, em qualquer vulto que se mova, típico de um exército obedecendo a ordens genéricas, sem uma estratégia sequer.

Movimento 5 – diretas-já


Diretas-já ainda é uma proposta em andamento. Não há elementos para afirmar que será vitoriosa. Dependerá de uma desarrumação ainda maior no jogo político do golpe.
Mas, de qualquer modo, há sinais de tentativas de, finalmente, discutir um pacto nacional. Até Fernando Henrique Cardoso, escorregadio como um bagre ensaboado, começa a se dar conta da loucura da campanha delenda PT.
O pacto político terá enormes desafios pela frente.

Desafio 1 – livrar o país da bancada da JBS e Odebrecht

Não é desafio trivial, mas é urgente. Teria que haver eleições gerais com mudanças na legislação eleitoral. Derrubado Temer, há o risco de Rodrigo Maia assumir.

Desafio 2 – coibir os superpoderes da Globo

Os episódios Dilma e Temer comprovam que é impossível a um país democrático conviver com o poder concentrado em uma organização jornalística como a Globo. É tarefa de todas as forças democráticas, assim que for eleito um novo presidente.

Desafio 3 – mudanças estruturais no MPF e no Judiciário

Graças aos seus penalistas, o MPF se tornou um poder ameaçador, em que pese a enorme contribuição ao país da parte dos direitos humanos e difusos. Os abusos de poder de procuradores e juízes de primeira instância arrostam princípios mínimos de direitos individuais.
O novo presidente terá que alterar as formas de escolha do Procurador Geral e de indicação do próprio Conselho Superior do Ministério Público. E empreender uma enorme discussão política, para trazer o Conselho Nacional de Justiça ao seu leito constitucional, de fiscal do Judiciário.
Há dois caminhos pela frente:
  1. A eleição indireta, visando preparar o país para as eleições de 2018.
Nesse caso, dos nomes aventados, o ex-Ministro Nelson Jobim é o favorito, por sua familiaridade com o PSDB e com o STF, com o militares e com Lula.
  1. Eleições diretas.
Haverá dos grupos em disputa: os lulistas e os antilulistas. A governabilidade só será assegurada se, antes, houver esse pacto para o fortalecimento do centro político.

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