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22/08/2013
Voto e consciência no STF, por Paulo Moreira Leite
Enviado por luisnassif, qui, 22/08/2013 - 19:00
Sugerido por Janah
Do site da ISTOÉ
Voto e consciência no STF
Confesso que saí atordoado do STF, ontem. Não foi a vitória de Joaquim Barbosa que causou surpresa.
Paulo Moreira Leite
Ouvi um ministro, Luís Roberto Barroso, dizer que concordava com o revisor Ricardo Lewandovski, mas que iria votar com Joaquim Barbosa porque estava acabando de chegar ao STF. Não se sentia no direito de questionar a primeira fase do julgamento, quando ainda não fazia parte do tribunal.
Ouvi um ministro, Luís Roberto Barroso, dizer que concordava com o revisor Ricardo Lewandovski, mas que iria votar com Joaquim Barbosa porque estava acabando de chegar ao STF. Não se sentia no direito de questionar a primeira fase do julgamento, quando ainda não fazia parte do tribunal.
Se estivesse no STF desde o início,
explicou Barroso, "muito provavelmente me inclinaria pela tese dele
[Lewandowski]. Mudaria a situação não só desse réu, mas de muitos
outros". O ministro afirmou ainda: "Fiz escolha difícil ao começar a
participar deste julgamento. Foi a de que eu serviria melhor à Justiça e
ao país se eu chegasse para não revirar um julgamento que consumira
mais de 50 sessões deste plenário. Se o tribunal se dispusesse a reabrir
o debate, participaria".
Barroso é um ministro de cultura
jurídica reconhecida. Demonstrou que é capaz de convicções firmes, a
ponto de ter sido um dos advogados do direito de permanência de Cesare
Battisti no país, num caso que abriu uma polêmica de alta temperatura,
com repercussão internacional, inclusive.
Até por esse motivo, sua
intervenção no julgamento causou espanto. Como é que um ministro do STF
pode achar que fez uma “escolha difícil?”
Escolheu entre o que e o quê?
Comentando o caso, mestre Jânio de
Freitas afirma, na Folha de hoje, que se Barroso concluiu que havia
mesmo um erro no julgamento, deveria lutar para refazer os trabalhos.
Janio explica, num parágrafo que vale a pena ler por inteiro:
“Para aprimorar os julgamentos é
que recebeu a cadeira ambicionada. Seu argumento adicional não foi
melhor: ‘teríamos que reabrir o processo. E Deixar uma sentença, seja de
condenação ou de absolvição, prevalecer apesar de lhe parecer errada,
contanto que não se reabra o processo, é mesmo próprio de magistrado?”
Retomando. Quando foi sabatinado no
Senado, responsável por sua indicação, Barroso disse que considerava o
julgamento do mensalão “um ponto fora da curva do STF.”
Queria dizer que as penas haviam sido muito duras e que o tribunal não havia atuado de acordo com a tradição, de Corte que não abre mão dos direitos e garantias do indivíduo frente ao Estado.
Queria dizer que as penas haviam sido muito duras e que o tribunal não havia atuado de acordo com a tradição, de Corte que não abre mão dos direitos e garantias do indivíduo frente ao Estado.
Na primeira oportunidade, num
julgamento que irá ter influencia sobre as instâncias inferiores do
judiciário e terá consequências terríveis para cidadãos que podem ter
sido vítimas de uma injustiça, Barroso alega que não iria “revirar um
julgamento que consumira mais de 50 sessões deste plenário.”
O voto decepcionou advogados e
mestres do Direito que, confiando nos pontos de vista que Barroso
defendeu publicamente ao longo de sua vida de jurista muito respeitado,
imaginavam que um ministro com sua liderança e sua independência seria
capaz de enfrentar um debate sabidamente difícil. As vozes minoritárias
do STF são chamadas de “mensaleiras”, hostilizadas nas ruas e alvo de
permanente vigilância por parte dos meios de comunicação.
Se o ministro tivesse votado com
Lewandovski, como admitiu que seria sua provável inclinação, a minoria
teria obtido 4 votos, e não 3, o que daria um novo quadro ao julgamento.
Mesmo vencidos, os réus teriam oportunidade de entrar com novos
recursos. O STF teria enviado um sinal político diferente em relação a
2012.
Data vênia, eu acho preocupante.
Barroso não disse que discordava dos ministros que queriam mudar a
situação de determinados réus, opinião que seria válida como qualquer
outra.
Barroso sugeriu que não se sentia à
vontade para um gesto dessa natureza, como se a condição de novato
fosse um entrave à plenitude de sua atuação. Admitiu, em resumo, que não
votaria conforme sua consciência de jurista.
Talvez eu esteja fazendo o papel de
idealista, inspirado pelo frescor absoluto de um grupo de adolescentes
de São Paulo que visitou o STF na tarde ontem, com sua curiosidade,
nenhum medo de fazer perguntas e a vontade pura de viver num mundo que
separa o certo do errado.
Mas eu acho – talvez em minha
ingenuidade -- que um ministro tem o dever de votar de acordo com seu
pensamento, por mais exótico que pareça, por mais incômodo que possa
causar aos colegas.
Se Joaquim Barbosa fez o que fez na
semana passada e nem se sentiu obrigado a pedir desculpas a Ricardo
Lewandovski na retomada dos trabalhos, limitando-se a afirmar que possui
uma visão “bastante peculiar da presidência do STF,” eu acho bom
recordar que estamos numa realidade dura e áspera, em que é urgente
saber onde se pisa e aonde se quer chegar. Ninguém está no STF a
passeio.
Advogados presentes no tribunal me
explicaram que a posição de Barroso tem mais pontos de sustentação do
que um ignorante como eu poderia perceber. É muito possível e muito
provável. Mas foi o ministro que fez o contrário do que disse que
pensava.
Para falar com clareza: ninguém planejava, ontem, refilmar O Homem que Matou o Facínora na Praça dos Três Poderes.
Não precisamos de heróis. Precisamos de juízes.
E já que estamos no STF, precisamos de juízes soberanos.
Estranhei quando o decano Celso de
Mello disse, para justificar um voto que acompanhava Joaquim Barbosa,
que o STF era obrigado a deliberar exclusivamente sobre aquilo que fora
denunciado pelo ministério público e que, por essa razão, não se poderia
aceitar alegações e provas que haviam sido descartadas pelo promotor
geral Roberto Gurgel.
Achei estranho porque, meses atrás,
extrapolando abertamente os próprios poderes, o Supremo popularizou a
visão errada de que “a Constituição é aquilo que o STF diz que ela é.”
Chegou a ponto de votar contra o
artigo 55 da carta de 1988, que estipula claramente que só o Congresso
tem poderes para definir a perda de mandato de senadores e deputados.
É evidente que não é obrigado a submeter-se ao procurador geral da República, certo?
Num tribunal que aprovou o regime
de cotas, definiu reservas indígenas e tomou tantas decisões favoráveis
aos chamados direitos de minorias, essa alegação é estranha demais,
formal demais.
Mas é engraçado registrar que, quando se queria cassar mandatos, valia atropelar um artigo da Constituição.
Quando não se quer rever uma condenação, alega-se que Roberto Gurgel tem a última palavra sobre os trabalhos em curso.
Este aspecto tem particular
importância aqui. Submetidos a um julgamento em fase única, sem direito a
um segundo exame de suas penas, os condenados do mensalão foram
colocados, contra toda jurisprudência – inclusive do mensalão mineiro,
do mensalão do DEM de Brasília – num foro privilegiado que se mostrou
uma armadilha a seus direitos.
Por decisão da acusação, alguns
réus foram investigados em segredo e serão julgados em separado, pela
justiça comum -- se é que isso vai acontecer, um dia. Documentos que
poderiam auxiliar a defesa não foram oferecidos a seus advogados,
durante o processo. Divulgado neste espaço em maio de 2012, o inquérito
do delegado Luiz Flavio Zampronha, da Polícia Federal, deixa claro que
não se encontrou o menor indício daquele esquema que Roberto Jefferson
definiu como mensalão. Ele também concluiu que os empréstimos do Banco
Rural, apontados como fraude, envolviam negociações efetivas entre o PT e
a instituição.
Diretores do Banco do Brasil com
responsabilidade até maior do que Henrique Pizzolatto na definição de
recursos que, segundo a acusação, estão na origem do mensalão, se
encontram nessa situação, realmente privilegiada. Empresários que foram
ouvidos no processo e que admitiram ter participação com $$$ grosso no
esquema de Delúbio Soares e Marcos Valério, em contratos superiores a
tudo o que se disse que saiu do Banco do Brasil, não se sentaram no
banco dos réus.
O julgamento ocorre num ambiente
político, alimentado por sucessivas demonstrações de força e é assim que
cada palavra, cada “mas”, cada “talvez”, cada “possível”, se explica.
O quadro foi bem desenhado pelos
repórteres Felipe Recondo e Debora Bergamasco, dias antes da retomada do
julgamento. Falando da condenação aprovada em clima de redenção
nacional no final de 2012 e da reflexão estimulada a partir dos embargos
e recursos, os dois escreveram no Estado de S. Paulo:
“Há ministros que se mostram
‘arrependidos de seus votos’ por admitirem que algumas falhas apontadas
pelos advogados de defesa fazem sentido. O problema (...) é que esses
mesmos ministros não veem nenhuma brecha para um recuo neste momento. O
dilema entre os que acham que foram duros demais nas sentenças é
encontrar um meio termo entre rever parte do voto sem correr o risco de
sofrer desgaste com a opinião pública.”
Este é o ponto.
E aqui chegamos ao debate de ontem.
Estava em pauta o destino do Bispo Rodrigues, ex-deputado pelo PL. Ele
foi condenado porque solicitou benefício em dinheiro para fazer parte da
base do PT. Também se considerou que, em troca de dinheiro, votou com o
governo em duas reformas importantes de 2003 e assim por diante. Ao
fazer a denúncia que colocou o bispo no banco dos réus, o
procurador-geral disse que era possível provar que ele havia negociado
apoio, organizado a votação da bancada e até recebido uma primeira
parcela da remuneração, R$ 250.000. Também se podia provar que ele havia
recebido uma segunda parcela, de R$ 150.000, paga em 2003. Em suas
alegações finais contra Rodrigues, o Ministério Público mudou a
acusação. Alegou que não possuía a maioria das provas anunciadas
anteriormente. Disse que só poderia provar o recebimento da última
parcela, de R$ 150.000. Não é um detalhe. Condenado pelas provas
anteriores, Rodrigues seria enquadrado na lei anterior de corrupção, que
prevê penas inferiores à lei atual. Se fosse condenado exclusivamente
pelos R$ 150.000, estaria condenado pela nova lei, que dobrou a pena
mínima e elevou também outras condenações.
Alinhado com Gurgel, Joaquim
Barbosa defendeu a pena mais dura, concordando com as alegações do
procurador-geral. Lewandovski, que na fase inicial havia votado com a
acusação, mudou de opinião e explicou por quê. Afirmou que os autos
mostravam o que nem todos haviam percebido: o Ministério Público
manipulou provas, escondendo aquelas que não convinham, mostrando
aquelas que interessavam. Lewandovski também lembrou que a situação
poderia ser comparada à do cidadão que suborna um guarda de trânsito ao
ser apanhado pela Lei Seca. Mesmo que tenha dividido o pagamento da
propina em duas prestações, estamos falando de um crime só.
Numa intervenção bem meditada,
Marco Aurélio Melo lembrou que a acusação contra o bispo Rodrigues
formava um conjunto, que incluía desde o acordo de campanha do PL –
partido do vice-presidente José Alencar –, passando por duas votações no
Congresso e o pagamento em dinheiro. Para sublinhar o absurdo de
ignorar as outras provas e condenar o ex-deputado pelo pagamento da
última prestação, Marco Aurélio fez a pergunta que não quer calar: “se
não tivesse havido o último pagamento, não teria havido corrupção?”
Ninguém estava discutindo a
absolvição do ex-deputado Rodrigues. Não se pretendia dizer que não era
culpado. O que seria era uma pena justa, de acordo com os autos e as
leis em vigor na época em que os fatos ocorreram.
A retomada dos trabalhos foi
acompanhada pelas conversas de que o julgamento está se prolongando
demais. Eu acho que tempo é um critério da política, que tem seus
calendários eleitorais, e também da TV, onde novelas duram entre três ou
quatro meses, conforme o Ibope. Considerando que 37 réus estavam sob
julgamento, e que muitos deles foram condenados a penas duríssimas, que
não se aplicam no Brasil nem em casos de tortura, sequestro seguido de
morte, parricídio ou infanticídio, temos menos de 2 sessões por cabeça. É
até pouco do ponto de vista da preservação dos direitos individuais,
vamos combinar.
Paulo Moreira Leite. Diretor
da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do
Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de
direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o Outro
General da Casa".
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PITACO DO ContrapontoPIG
Em cearensês matuto: Barroso peidou na rabichola!
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Digo mais. Barbosa quando falou, peidou. Quando votou, cagou
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