29/08/2013
Depois de Molina, Julian Assange
Da IstoÉIndependente - 28/08/8013
Numa prova de espírito democrático e grandeza política, seria bem oportuno sugerir às mesmas forças que aplaudem a fuga do senador boliviano que reforcem a pressão para que o fundador do Wikileaks possa deixar a Inglaterra
Paulo Moreira Leite
Imagine se um funcionário do governo do Equador organizasse a fuga de Julian Assange da embaixada de Londres para Quito. O governo de David Cameron já teria organizado uma frota para ameaçar o pequeno país sul-americano. O gesto seria considerado uma afronta e um insulto de caráter internacional. Já posso ver autoridades falando em boicote aos produtos do Equador.
Sempre em busca de argumentos para atacar Correa e todos os
governantes que podem ser considerados herdeiros de Hugo Chávez, não
faltariam colunistas conservadores, no Brasil, para exigir nossa ruptura
com aquele país. Ou pelo menos um gesto de agressividade sobre um país
de PIB menor do que o nosso -- como chamar o embaixador para
explicações.
Passando da imaginação para a realidade, foi mais ou menos isso que
aconteceu na Bolívia, quando o diplomata Eduardo Sabóia decidiu fugir,
clandestinamente, com um senador que se encontrava refugiado na
embaixada em La Paz há um ano e meio.
O governo brasileiro tem uma tradição de asilar perseguidos
políticos e, apesar de possuir mais de vinte condenações no currículo,
existem motivos razoáveis para incluir Roger Molina nessa categoria.
Na última negociação realizada, o governo de Evo Morales concordou
em liberar a saída do senador, sem lhe dar o salvo conduto, o que
tornaria a saída uma operação arriscada.
Olhando para o caso de uma certa distância, é possível admitir que
há prós e contras, em especial quando se encara o problema pelo ângulo
humanitário. Vivemos num país que já exilou ditadores de alta
periculosidade, como o paraguaio Stroessner.
E é justamente desse ângulo que volto à questão de Julian Assange.
Numa prova de espírito democrático e grandeza política, seria bem
oportuno sugerir às mesmas forças que aplaudem a fuga do senador
boliviano que reforcem a pressão para que o fundador do Wikileaks possa
deixar a Inglaterra para residir em liberdade no país que concordou em
lhe dar asilo.
Claro que a oposição faz isso num esforço óbvio para desgastar o governo. É do jogo.
Mas vamos combinar que há nobreza em Assange, uma causa que tem
ligação direta com a liberdade de expressão e o direito a informação,
tão preciosos em tempos de autoritarismo velado e espionagem.
Comparando um caso com o outro, cabe reparar que os direitos de
Assange têm inteiro respaldo pelas tradições internacionais. Sua chegada
ao Equador está autorizada pelo governo daquele país, ao contrário do
que aconteceu com Roger Molina, que entrou clandestinamente pela
fronteira.
Paulo Moreira Leite. Diretor da Sucursal da ISTOÉ em
Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente
em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época.
Também escreveu "A Mulher que Era o Outro General da Casa".
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