24/08/2013
Carta Maior; Sábado, 24/08/2013
Há 59 anos, naquele 24 de agosto de 1954, Getúlio Vargas cometeu o suicídio político mais inteligente da história. Consternado com a notícia que ecoava pelas rádios, o povo carioca perseguiu e escorraçou porta-vozes da oposição virulenta ao Presidente.
A experiência da tragédia abalou o cimento da resignação cotidiana e a multidão elegeu seu alvo: cercou e depredou a sede da rádio Globo que saiu do ar.
A escolha do desespero tinha alicerces na razão. O cacho de forças silenciadas na vitória esmagadora de Vargas em 1950 preservara intacta a sua sonoridade junto à opinião pública. À medida em que a incontinência dos decibéis superava o comedimento das formalidades e contaminava todo aparato conservador, o duelo tornava-se a cada dia mais desproporcional. Uma agenda latejante de suspeição,desafios e desrespeito ostensivo era apregoada diuturnamente. A pressão atingiria seu auge naqueles dias finais de agosto.
Cinquenta e nove anos depois do tiro que sacudiu o país e impôs o recuo do golpismo, o volume asfixiante do coro conservador ainda pode ser ouvido e aquilatado. Entre um agosto e outro, algumas peças do paiol midiático permanecem. Outras se juntaram à tradição. Os personagens se renovam, mas o método se repete. O jogral da condenação sumária sentencia a mesma intolerância em cada linha, título, nota, coluna, fotomontagens, capas, escaladas televisivas e radiofônicas. Troquem-se as letras que compõem o nome Vargas por ‘mensalão'. Ou Lula. Ou Dirceu.
O preconceito beligerante que cerca um equipara-se ao que esmagou o outro. O rastro comum remete ao arsenal udenista da suspeição e da condenação sumárias, das togas avessas às provas; e das sentenças indiferentes aos autos. O conjunto forma um fio de continuidade que atravessa a régua do tempo e conecta a luta progressista de 1954 a do Brasil de 2013. Hoje, mais uma vez, o país enfrenta uma transição de ciclo histórico.
Ela opõe, de um lado, a esperança no passo seguinte de um desenvolvimento calcado na emancipação social de sua gente. E de outro, as forças e interesses que consideram intolerável sincronizar esse passo com o anseio por equidade e justiça, mas, sobretudo, por uma efetiva redistribuição do poder.
(Leia também ‘A guerra das expectativas'.
AQUI)
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